domingo, 3 de maio de 2015

O exército de operários da Rainha Mãe


 No Dia Mundial dos Trabalhadores, nossa Rainha Mãe abdicou dos tradicionais discursos em rede nacional para falar mais de perto com os trabalhadores. Bem longe dos olhos e das panelas da elite do reino, que obviamente não trabalha. Falaria só para eles, os legítimos proletários. Reunidos com sua alteza, uma imparcial categoria auxilia e prestigia a monarca em seu democrático tuitaço de primeiro de maio. Na plateia, os operários da rainha e seu clã: CUT (Companheiros Unidos no Trambique), MSTT (Movimento Só Tramoia e Trago), SindiPelego e os Black Bostas. Todos juntos não conseguiam somar 44 horas de trabalho em uma vida inteirinha. Mas esses eram os modelos de trabalhadores da Rainha Mãe e seu clã. Não estavam presentes, por triste circunstância e perseguição de Justiça, os operadores da máquina criminosa de desvios em estatais, é claro.
- Ué! Só vocês? - estranha a Rainha Mãe ao adentrar na sala e dar de cara com o pequeno grupo de companheiros. - Não vai vir ninguém que trabalhe, para posar ao meu lado nas fotos?
- Nós não conseguimos convencer ninguém rainha.- lastima um companheiro.
- Mas então, chamem uma serviçal do Palácio Real! Preciso de trabalhadores autênticos para aparecer ao meu lado, não um bando de mamadores das tetas públicas como vocês!
- Nós já tentamos os serviçais do palácio, alteza. Mas uma delas está como o olho roxo depois que a senhora lhe acertou com um cabide. Outra ainda não lhe perdoou por ter jogado os ovos mexidos do café da manhã na cabeça dela.- informa o assessor.
- São umas rancorosas, metidas a burguesas. Deviam agradecer a mim por terem chegado a classe média ganhando um salário mínimo, isso sim! - rosna a Rainha Mãe.
- E os outros preferem ver a senhora pelas costas, sabe-se lá por que cargas d'água.
- Uns ingratos, é o que são! Não sabem valorizar todos os ganhos que meu reinado propiciou a essa gente.
- Nós valorizamos, companheira! E muito! Nós sabemos agradecer todo apoio que nos foi dado nesses anos todos! - discursa efusivamente o líder do MSTT, com uma resplandecente medalha adornando o peito, ao lado da desbotada estampa de Che Guevara na camiseta.
- Bonita medalha, companheiro! De que propriedade invadida você afanou essa relíquia cívica?
- Essa medalha eu conquistei, rainha. Por meus próprios méritos e glórias!
- Méritos, é? Entrou para o Guinness Book como o desocupado que a mais tempo levanta a bandeira dos trabalhadores?
- Não, esse título é de seu antecessor, alteza, o Ilusionista. Eu ganhei essa medalha pelo meu importante papel na luta contra as famigeradas forças imperialistas que ameaçam nosso reino!
- A Coca-Cola?
- Não! Forças ainda mais malignas e mortíferas à agricultura sustentável desse reino! A coca, planta, eu acho muito ecológica e benéfica a nossa causa. Nossos parceiros das FARC concordam. Pretendemos, um dia, ver todo Gigante Adormecido coberto dessa planta tão latino-americana.
- Mas, que diabos de adversários você combateu para ganhar essa medalha, homem?!
- Mudas de eucalipto!
- Mudas, é? - pergunta a rainha, torcendo o nariz com pouco caso. - De que tamanho?
- Enormes! Quase vinte centímetros cada! E eram milhares!
- Impressionante... E elas resistiram?
- Não tiveram tempo para isso. Nosso exército chegou na calada da noite, com os rostos cobertos, e aniquilamos as malditas antes que se dessem conta do que estava ocorrendo. Sou ótimo estrategista!
- Nossa! Que enorme feito. Deve ter sido uma batalha sangrenta. - comenta a rainha, um tanto irônica. - E esses mascarados aí? Trabalham no quê? No teatro dos horrores?
- Nossa luta é a desconstrução do capitalismo e do acúmulo de bens de consumo! - responde um dos Black Bostas.
- Traduza isso em dialeto civilizado, seu maconheiro fedorento. - solicita a monarca, com sua tradicional objetividade e falta de melindre.
- Nós destruímos patrimônio público e privado. Somos o novo braço de seu clã, rainha, para momentos de cansativas manifestações pacíficas do proletariado golpista.
- Estou impressionada! Realmente temos evoluído na área da delinquência incentivada pela companheirada. E vocês do CUT? O que fazem aqui no dia do trabalhador?
- Abdicamos de nosso dia de folga para prestigiar sua alteza. - responde um companheiro com o peito estufado de orgulho e a barriga dilatada de ócio pago com dinheiro dos trabalhadores.
- Folga, é? Pra vocês, meus queridos, todo dia é dia de folga. Trabalhar, para os membros do CUT, significa subir em palanque e abanar bandeirinhas em época de campanha. Como é que vocês, meus assessores de marketing, acreditam que posso aparecer bem na foto como rainha dos trabalhadores, cercada apenas de desocupados, imprestáveis e baderneiros mascarados?! - irrita-se sua alteza.
- Não vai haver fotos, nem vídeos majestade! Essa é a nossa nova fórmula. Serão só palavras vazias nas redes sociais. Estamos na era virtual.
- Redes sociais, é? Sem plateia?
- Isso mesmo!
- Sem panelaço?
- Nada de panelas ou vaias.
- Nem aplausos?
- Trocamos os aplausos, que estão em desabastecimento crônico, por curtidas.
- Mas se vocês, os únicos energúmenos capazes de me curtir, estão aqui, seus imprestáveis! Quem está em frente aos computadores para curtir a Rainha Mãe dos trabalhadores?!
- Os robôs, rainha.
- Robôs?
- Sim, eles são os únicos programados para aguentar o seu gênio irascível, sua fala desprovida de sentido e seu discurso inconsistente.
- Gostei desses robôs! Vocês podiam contratar alguns para trabalhar no Palácio Real. As camareiras andam cada vez mais impertinentes! Já me faltam cabides para colocar na linha essa categoria.
- Mas não faltarão cabides públicos para nossa companheirada, nem para nossos aliados, os neodefensores do proletariado, não é alteza?
- Cabides de emprego para acomodar parasitas são nossa especialidade, companheiros. Nosso maior problema na atualidade, é apaziguar os verdadeiros trabalhadores do reino quando a crise chegar aos seus bolsos. Um levante do proletariado poderá tomar as ruas. - preocupa-se a monarca, abatida.
- Não se preocupe rainha! Nós resolveremos isso quando chegar a hora. Somos especialistas em manipular operários e nos infiltrar em movimentos legítimos. Semear a desordem é nosso verdadeiro ofício. Nosso lema socialista, adaptado de Guevara, é: Lutam melhor os que defendem uma boquinha. - conclui um companheiro do SindiPelego, especialista na articulação de badernas.


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