domingo, 16 de fevereiro de 2014




O Blog da Poliana estará de recesso por uns dias. 

Voltaremos em breve com novas aventuras de nossa monarca e sua trupe.

Aguardem!

domingo, 9 de fevereiro de 2014

As inconsequências ambientais do clã de Poliana


Poliana estava irritadíssima. Há meses seus bobos não presenciavam suas conhecidas crises de histeria e pirraça. Andava de um lado a outro do salão real gesticulando e derrubando o que via pela frente. Seus gritos esganiçados podiam ser ouvidos do lado de fora do palácio. Até Imprensa Livre já tivera a oportunidade de escutar seus ataques. O motivo do destempero da monarca? Mais uma interrupção histórica nas obras de acesso a Escola de Ensino Superior. Escola essa, que a rainha parecia acreditar fazer parte do quintal de seu castelo. Estranhamente, agia e falava como se pertencesse a Poliana. E por assim pensar, como de costume no seu reinado, tinha mais bobo sem formação palpitando no local do que operário trabalhando. O resultado, como quase sempre, era mais uma trapalhada, dessa vez ambiental, financiada com recursos públicos.
- Eu não posso acreditar! Quem essa fulana pensa que é para impedir o avanço das obras no meu trevo?! Tudo por causa de um banhadinho lamacento e três ou quatro nascentezinhas de rio sem qualquer serventia? Será que ela não consegue enxergar a importância histórica da minha obra? Só quer aparecer, com Imprensa Livre a sua volta, bruaca invejosa!
- Acalme-se alteza? Tome aqui um chá de cidreira. Tanta irritação não fará bem para seu delicado estômago de majestade. - intervém Espelho Mágico, tentando apaziguar os ânimos reais.
- Não é possível um disparate desses. - continua Poliana, tomando alguns goles da bebida calmante. - Nós já tínhamos conseguido enrolar até Justiça. Era questão de poucos dias e teríamos conseguido aterrar todo aquele banhado inútil. Mandei até nosso bobo das obras para acompanhar de perto o projeto. Ele me garantiu que estava tudo dentro dos conformes.
- Com todo respeito, alteza, mas o bobo das obras não sabe a diferença entre um rio e um esgoto a céu aberto. - constata o Espelho Mágico.
- É verdade. Mas essazinha sabe o que do assunto? Uma metida, isso sim!
- Na verdade Poliana, ela tem formação e é especialista na área ambiental. E a tal região é área de preservação permanente.
- Ah tá! Até você Espelho?! Agora todo mundo vem com esse papinho enjoado e politicamente correto de preservação ambiental! Se a gente causar algum dano, depois consertamos. É só plantarmos meia dúzia de eucaliptos e ciprestes em volta da rótula e está resolvido, ora bolas.
- O problema, pelo que entendi, tem a ver com a questão da água. As obras vão prejudicar a alimentação de um dos rios que abastece o reino, rainha. Em caso de estiagem poderemos ficar sem água.
- Estiagem, estiagem! Quase nem temos isso por aqui. Não sei o porquê de se preocupar com isso logo agora. Eu já decretei que não faltará mais água no meu reino. Estamos transpondo milhares de recursos públicos e publicidade para isso.
- Mas se secarmos o rio transposto, vamos transpor é lama para os contribuintes. Não parece um bom negócio. - pondera o outro.
- Bom negócio eu vou fazer depois de concluída a rótula. - acrescenta a rainha, pensando alto, já mais calma pelo efeito da cidreira - E esse pessoal do meio ambiente chegou a sugerir que mudássemos a rótula de local. Que absurdo! Não são engenheiros de trânsito! Quem são eles para dar pitacos no local da obra. Nós nos preocupamos com a segurança dos estudantes e motoristas quando escolhemos criteriosamente o local.
- Nós quem, alteza? Quem participou do estudo para tomar essa decisão? - questiona o Espelho Mágico, preocupado.
- Eu e alguns companheiros, é claro. - reponde a rainha.
- Quantos eram engenheiros ou conheciam o assunto? - continua o Espelho, já antevendo a resposta.
- Nenhum, é obvio! Você sabe como conseguem ser chatos e criteriosos esse pessoal da engenharia. Se fossemos perguntar a eles ficaríamos semanas estudando as possibilidades e provavelmente não colocariam a rótula onde é preciso. É um caso especial de interesse coletivo. Por isso eu e a companheirada tomamos a frente no processo. - esclarece a monarca, já um tanto sonolenta.
- Sei... Tudo apenas pelo interesse coletivo, não é mesmo alteza? - continua o outro com ironia.
- Você sabe bem como são essas coisinhas Espelho Mágico. Interesses coletivos regados a recursos públicos, sempre podem ser nascentes que alimentam um caudaloso rio de interesses privados. Não podemos deixar essa fonte secar, não é mesmo? Seria um desastre para nosso Polianoduto. - conclui Poliana, recostando-se nas almofadas para um cochilo, com a consciência ambiental sempre tranquila.

domingo, 2 de fevereiro de 2014

Conversa de botequim


Com o calor escaldante que assolava o reino nos últimos dias, nada melhor que uma cervejinha no final de um árduo dia de trabalho. Árduo dia de trabalho da rainha e sua corte? Nada disso. Para esses, o expediente terminara logo no início da tarde e o calor era amainado pelo ar condicionado e mergulhos na piscina. Mas para o resto da plebe de súditos que sustentavam as mordomias reais, o fim de um dia de labuta ocorria bem mais tarde e era mais acalorado. Assim como as tradicionais discussões de mesinhas de bares e botequins.
    - Vocês assistiram a entrevista do bobo das obras na TV explicando o porquê de terem iniciado a repavimentação justo pelas ruas em melhores condições asfálticas do reino?
    - Eu vi! Que coisa mais sem pé nem cabeça. O legítimo papo de bêbado pra delegado.
    - Eles devem achar que o povo todo é burro. Ora! Dizer que o maior fluxo de carros nas avenidas iria danificar muito o asfalto e com isso sairia mais caro para consertar. Vê se tem cabimento!
    - Vai ver eles pagam a empresa por buraco coberto, ora bolas.
    - De onde será que ele tirou uma desculpa esfarrapada dessas?
    - Ouvi dizer, que Poliana queria começar o asfaltamento por onde desse mais visibilidade. Só que logo que os súditos começaram a criticar a decisão, a rainha se reuniu com seus bobos da corte e levaram uma tarde inteirinha para arrumar essa explicação esdrúxula que estão alardeando na mídia. Pode escutar, eles dão todos sempre a mesma resposta estapafúrdia.
    - Mas será que não tem ninguém estudado na corte que possa evitar que eles falem tanta baboseira? Chega a dar vergonha até na gente que é meio burrão.
    - Mais estudados que eles?! Impossível! Vocês não prestaram atenção? Eles estão sempre estudando alguma coisa. Estudando um projeto de mobilidade urbana. Estudando um anel viário. Estudando onde colocar um semáforo ou uma lombada. Estudando uma forma de estacionamento que beneficie algum de seus companheiros... O tempo que levam pra estudar dava para fazer uma faculdade!
    - O pior é quando eles contratam, com nosso dinheiro, técnicos especializados para fazerem o estudo e depois passam anos estudando o estudo comprado! Pode isso?! Como se aquele monte de bobos da corte tivessem capacidade para fazer coisa melhor.
    - Eles devem é ficar estudando uma forma de piorar o projeto apresentado, isso sim.
    - E depois de estudar por tantos anos, eles pretendem apresentar a ideia para a população em audiências. E se o povo não gostar e criticar?
    - Eles vão estudar um jeitinho de enrolar por mais uns aninhos.
    - Como fizeram com a questão da segurança, lembram? Venderam pra nós a ideia de que iam colocar uma espécie de SWAT nas ruas. Segurança era a bola da vez!
    - É. E a bola murchou logo no primeiro tempo de jogo e ninguém mais fala no assunto.
    - E a saúde então? Prometeram um serviço vinte e quatro horas de self service de consultas. Era só chegar e se servir de atendimentos e remédios. Os curandeiros iam jorrar em fontes para nos atender. Até hoje não saiu do chão.
    - Do chão já saiu. Tem até telhado. Só não saiu do papel. Parece que estão estudando uma forma de fazer milagre.
    - Ou estudando um plano para empurrar com a barriga, só mais um tempinho.
    - Enquanto eles concluem seus mestrados e doutorados, os arigós aqui, tem é que estudar como pagar os impostos salgadamente reajustados pela vasta corte real.
    - Não seja pessimista, amigo. Poliana é bem tolerante com quem não paga. Não viu os responsáveis pelo estacionamento? Ficaram seis meses sem repassar o devido aos cofres públicos, e ela nem deu muita importância.
    - Nesse negócio do aumento de impostos eles nem lembraram de fazer consulta popular, né?
    - O povo, cumpadre, eles só consultam quando precisam de uma desculpa para não fazer algo. “Não fizemos aquele esgoto, pois a comunidade preferiu uma academia ao ar livre. Não asfaltamos as ruas do centro, porque os moradores da região optaram por um banheiro público.” Como se quem mora no centro fosse deixar de mijar em casa para mijar num banheiro público. Quanta prioridade fajuta e manipulada!
    - É para isso que serve a tal participação popular. Para justificar a incompetência da rainha e jogar nas nossas costas a responsabilidade pelo que não foi feito. Nós pagamos pra ela e sua corte fazerem. Pagamos a conta do mal feito ou bem desviado. E ainda pagamos o pato pelo que não vingou!
    - Tudo muito democrático e participativo para a meia duzia de companheiros que frequentam as tais reuniões.
    - Sorte da rainha e seus companheiros que a maioria de nós, contribuintes, temos que trabalhar o dia inteiro, faça chuva, frio ou esse calorão infernal, e não temos tempo nem saco de frequentarmos essas assembleias festivas. Caso contrário, o reinado de Poliana se veria em maus lençóis.
    - Nossa! A rainha acabava com essas reuniõezinhas na mesma hora. Eles adoram confronto de ideias e participação só nos discursos. O dia que virar prática, Poliana e a companheirada se mudam de vez para Gâmbia, onde segundo divulgou Imprensa Livre, quem critica ou reivindica é perseguido.
    - Nós podíamos sair daqui e ir em uma dessa assembleias reivindicar a extradição de Poliana e seus bobos para Gâmbia! Que tal?
    - Boa ideia! Mas o sofrido povo de Gâmbia já tem peste que chegue, não precisam de mais algumas. Além do mais, com esse calorão, nem os mais manipuláveis marionetes do clã de Poliana estão disponíveis para essas reuniões. E a temporada de ilusões participativas está de recesso. Então, vamos abrir mais uma gelada, e esperar o calorão diminuir! Quem sabe o vento não muda qualquer dia desses? - concluí um dos súditos ingratos da rainha, voltando a atenção para o jogo de futebol que se iniciava. Futebol que, em breve, seria mais uma conhecida jogada de manipulação das massas. Assim como as consultas populares. Ilusão para o povo. Puro deleite para a torcida organizada.