domingo, 27 de outubro de 2013

O surpreendente leilão da rainha

Poliana estava enciumada. Não agüentava mais ver tantas notícias e adulações ao mega leilão promovido pela Rainha Mãe. Sua alteza odiava ver outra rainha, mesmo a escolhida de seu clã, mais em evidência que a doce e carismática Poliana. Até os protestos e quebra-quebra serviram para dar mais visibilidade a outra. Era preciso colocar sua coroada cabeça para funcionar e produzir algum mirabolante projeto capaz de ofuscar o leilãozinho megalomaníaco da Rainha Mãe.
- Eu convoquei vocês todos hoje, em reunião extraordinária, meus bobos, para um importante anúncio. – começa a altiva monarca do alto de seu trono.
- Vai decretar mais um feriadão para nós alteza?! – vibra um companheiro.
- Nada disso. Trata-se de um projeto grandioso para o futuro do reino e que trará fortunas aos cofres públicos.
- Vai render dinheiro para nosso Fundo de Apoio a Companheirada, rainha? – entusiasma-se outro.
- Lógico. De que vale os recursos públicos sem nossos desvios privados. -responde Poliana.
- E que projetinho é esse, alteza? – questiona um dos bobos da corte.
- Vamos fazer um leilão!
-Leilão?! Mas vamos leiloar o que?
- Os buracos no asfalto! – anuncia a magnânima Poliana, com o queixinho erguido de orgulho.
- Ah! Vamos fazer mais um tapa-buracos, é isso? – indaga o bobo um tanto decepcionado.
- Nada disso, seu molóide! É um projeto inovador e ousado. Vamos abrir concorrência para que consórcios do mundo inteiro possam explorar nossos buracos no asfalto! Ganharemos bilhões!
- Mas vão explorar o que, Poliana? Está certo que alguns são bem profundos, mas ainda não atingem o pré-sal. – constata o bobo das obras.
- Eu concordo com o companheiro, rainha. Já tem gente explorando alguns buracos com pesque-pague, mas não acho que grandes empresas possam se interessar em pesca esportiva.
- Vocês são mesmo desinformados. Eu consultei um famoso especialista e descobri que nossos buracos no asfalto são uma riquíssima fonte de xisto!
- Cheetos? Aquele salgadinho? – pergunta um assessor parlamentar, lambendo os beiços, empolgado.
- Não seu idiota! – irrita-se a monarca – Xisto! Aquelas rochas que são a fonte de energia mais comentada do momento.
- Ah! Aquele negócio que promete ser o substituto do petróleo e que pode fazer nosso pré-sal ser uma palhaçada maior do que já é?
- Esse mesmo! O futuro das energias não renováveis está em nossas mãos! Ganharemos fortunas!
- Você tem mesmo certeza disso, Poliana?
- Absoluta! Consultei o especialista, comparamos as imagens, e não há dúvidas. Nossos buracos são repletos de xisto!
- Que maravilha, rainha! Vou postar agora mesmo no facebook! E anunciar imediatamente em todas as rádios locais. – alegra-se o bobo do marketing e mídia, colocando-se em movimento.
- E nós precisamos organizar nossos companheiros para lucrar nesse consórcio! Serão bilhões! Trilhões! – ergue-se rapidamente outro companheiro já falando ao celular.
Em poucos minutos a sala já era uma balburdia. Bobos e pajens entusiasmados discutiam entre si e falavam ao telefone. Uma satisfeita Poliana, lixava as unhas comodamente sentada em seu trono, já sonhando com os recursos que cairiam em suas contas.
Algum tempo depois, o bobo do marketing, retorna a sala para informar a rainha.
- O anúncio já esta em todas as redes sociais. Um enorme banner acabou de ser colocado na entrada do reino. O pessoal de Imprensa Livre quer uma coletiva, em poucos minutos, com você Poliana. Preciso saber o nome do geólogo que constatou as reservas de xisto em nossos buracos no asfalto, alteza?
- Google.
- Como? – pergunta o outro, já sentindo o suor frio escorrer pela espinha.

- Eu pesquisei no Google. Vi as fotos que apareceram. Umas rochas cinzentas e descamativas, iguaizinhas as que se vê nos buracos do asfalto. Quem precisa de geólogo em plena era da informática! – conclui a altiva e decidida Poliana, deixando o recinto e sua apavorada corte de bobos.

domingo, 20 de outubro de 2013

Fazendo hora no verão

No salão real, o grupo tentava convencer Poliana do polêmico projeto. Sentada no trono, sua alteza ouvia atentamente os argumentos.
- Todos os profundos estudos realizados por nossa equipe demonstram claramente alteza, que é possível economizar uma fabulosa quantia de recursos públicos se reduzirmos em duas horas o horário de trabalho da corte.
- Seguindo essa lógica, já devemos ter economizado milhões nesses anos com tantos bobos e pajens pagos pra não fazer nada. – retruca Poliana, irredutível.
- Se as repartições fecharem mais cedo, rainha, gastaremos menos. – continua o economista, ignorando a ironia real - Isso está perfeitamente provado.
- Se isso é verdade, então por que a Coca-cola e a Ford não adotaram ainda essa fantástica estratégia de gestão? – questiona, cruelmente, Poliana.
- É que a economia só vale quando a coisa é pública e o dinheiro é do contribuinte lesado. O dinheiro privado tem valor diferente nesse odioso mercado capitalista. – responde um dos companheiros.
- Sei... Na iniciativa privada não se joga dinheiro na latrina. – continua a monarca - E no que exatamente economizaremos o suado dinheiro dos súditos, meus bobos?
- Em luz! – salta rapidamente um dos novos entendidos em economia do reino. – Energia elétrica. Com as repartições abertas menos tempo, gastaremos menos eletricidade. E você sabe Poliana, como a luz anda pelos olhos da cara!
- Se é para economizar em energia elétrica e luz, devíamos adotar esse turno especial no inverno! Das nove às quinze horas. Aproveitaríamos melhor a incidência do sol, coisa que, por sinal, abunda no verão. Gastaríamos menos com aquecedores e estufas também. – retruca sua alteza, batendo o pezinho o chão.
- Boa idéia rainha! Podíamos adotar essa tática o ano todo. No inverno dormiríamos até mais tarde e no verão aproveitaríamos a piscina! – vibra outro companheiro.
- Eu fiz uma ironia, seu estúpido! – ralha Poliana – E em que mais economizamos nesse turno especial de verão?
- Em água. O consumo de água aumenta muito no calor.
- Água! Vocês pretendem que eu enrole Imprensa Livre e os contribuintes argumentando que economizaremos milhares diminuindo o consumo de água?! Para gerar uma economia substancial aos cofres públicos cada um de nossos serviçais precisaria tomar, por dia, uns 10 litros e puxar a descarga umas 100 vezes! Façam-me o favor. Mostrem-me argumentos mais sólidos e menos insípidos! – irrita-se Poliana.
- Os contribuintes serão beneficiados, pois poderão usufruir dos serviços públicos no horário do almoço! – argumenta outro assessor.
- Essa sim, é boa. Os contribuintes vão adorar a idéia de deixar de almoçar para usarem um serviço que sempre usaram em horário comercial. Posso até vê-los famintos pelo meu pescoço de monarca. – acrescenta a rainha com escárnio.
- Nós gastaremos menos em papel higiênico também. – continua outro, ansioso para convencer a soberana.
- Era só que faltava. Os servos cagam mais no verão, é isso? Ou talvez, vocês, meus adoráveis e atrapalhados bobos, tenham menos tempo de fazer suas tradicionais cagadas, o que para mim seria uma economia de problemas. – conclui Poliana - Já chega de ouvir tantas asneiras. – ergue-se a rainha do trono, dando a reunião como encerrada.
- Mas, majestade, você não pode ser contra essa idéia! Você sabe o quanto ela  é importante para sua boa imagem e popularidade com os serviçais! – desespera-se um companheiro.
- Eu não sou contra. Acho a idéia excelente. As desculpas esfarrapadas é que não são. Vou enrolar o povão e Imprensa Livre com coisas mais criativas. Estaremos implantando um novo projeto de valorização dos serviçais e melhoria da qualidade do atendimento ao público. Direi que pesquisas recentes, desenvolvidas em países do mediterrâneo, mostram que os profissionais aumentam em muito sua produtividade se dormirem duas horas depois do almoço! Por isso, decretarei nos próximos dias o direito à sesta remunerada. – anuncia a monarca.
- Brilhante rainha! Não sei como não pensamos nisso antes. – vibra o representante da Farsasindical.
-Eu, modéstia a parte, sou mesmo uma exímia estrategista. Especialista em gerenciamento e MBA em gestão de absurdos financiados com recursos públicos. Agora me deixem em paz seus molóides! Tenho muito para fazer em poucos dias. Preciso de várias sessões de bronzeamento artificial. O horário especial já está aí, e não posso estrear meu biquíni verde-água com a pele branca desse jeito. Seria péssimo para minha irretocável imagem de soberana.






domingo, 13 de outubro de 2013

A assombrada Poliana

Uma descansada Poliana encontrava-se atirada em seu divã cor de rosa, saboreando dezenas de seus adoráveis bombons de amarula. Paz era o que sua alteza precisava. Um feriado longe, bem longe, de seu séquito de pajens, sempre a lhe bajular. E principalmente, algumas horas distante dos discursos cansativos e inconsistentes de seus companheiros de clã. Poliana não agüentava mais a companheirada. Quanta coisa tinha de engolir para se manter no poder. Horas e horas de reuniões improdutivas. Meia dúzia de frases feitas, repetidas cansativamente, e feitas para não levar a nada.
Mas hoje, Poliana estava sozinha, entorpecida de bombons, e podia esquecer toda a estupidez que cercava a sofrida monarca.
- Tu, mujer, não devia ser tão dura com seus guerrilheiros, companheira Poliana. Não perca a ternura jamais! – uma voz vinda do centro da redoma, assusta a rainha.
- Che?! – constata a monarca ao reconhecer a surrada boina, ícone da juventude idealista e objeto de consumo capitalista em camisetas vendidas pelo mundo a fora. – Não é possível! Toda vez que quero me embriagar sozinha, aparece algum fantasma para me assombrar. Pode voltar de onde veio! Hoje eu quero sossego!
- Sentir as injustiças cometidas contra qualquer pessoa, em qualquer parte do mundo, é a mais bela qualidade de um revolucionário. E yo sigo siendo un revulocinario! – acrescenta Che.
- Ah tá! Então vai assombrar os Castro, lá na ilha, cada vez que eles perseguem e mandam para o paredón os coitados que se revoltam contra a ditadura que tu ajudou a implantar, e me deixa em paz, por favor! Volta pra tua cova.
- A farda, alteza, ou o manto real, modela o corpo e atrofia mente! – afirma o homem.
- O poder ajusta os interesses, destrói as ideologias e modela as conveniências! E a farda só cobre e encobre tudo isso. – retruca Poliana.
- Prefiro morrer de pé, a viver sempre ajoelhado! – ergue-se a ilustre figura, imponente.
- Você preferia isso sim, viver eternamente. Como teu companheiro Fidel, ao que parece. E viver muito bem sentado e servido, com seu povo ajoelhado, calado e submisso aos seus pés.
- O importante não é justificar o erro, mas impedir que ele se repita! – irrita-se o revolucionário.
- O importante é errar em nome de nossa causa, e impedir que o povo reconheça o erro e se revolte contra ele. - replica a impertinente Poliana.
- Lutam melhor os que têm belos sonhos. – acrescenta Che, acendendo um charuto.
- Sonham melhor aqueles que não têm nada para fazer, e lutam melhor os que têm maioria no parlamento. – constata a monarca, desembrulhando mais um bobom.
- A verdadeira capacidade de um revolucionário se mede por sua habilidade de encontrar táticas revolucionárias adequadas a cada mudança de situação! – afirma, batendo as cinzas no chão.
- A verdadeira revolução que implantamos é medida pela capacidade de comprar aliados, calar os oposicionistas, iludir as massas, e não deixarmos jamais de ser situação. – continua Poliana, lambendo os dedos.
- Se o presente é de luta, o futuro nos pertence! – brada o revolucionário.
- Se o presente é de nossas farrinhas com o dinheiro público, o futuro é trágico para quem nos sustenta. Problema deles, os otários contribuintes. – continua a rainha, languidamente.
- Nós, socialistas, somos mais livres porque somos mais completos e somos mais completos porque somos mais livres! – continua Che, batendo orgulhoso no peito.
- São uma completa fraude, isso sim! É só chegar ao poder e experimentar todas as vantagens que o odioso dinheiro capitalista proporciona que vocês esquecem todo ideal de liberdade e fazem tudo para manter o povo cativo aos interesses de vocês, os sócio-imperialistas! É preciso endurecer para não perder o poder jamais! – tripudia sua alteza.
- As amizades que se fundam a partir do interesse, por interesse se terminam!
- Toda a aliança se faz pelos interesses, e em prol dos interesses se perpetuam.
- Basta! Não vou mais ficar aqui discutindo com você! Mulherzinha irritante! – enerva-se o outro, ajustando a boina na cabeça, e marchando firme para a saída. - Não me esperem para a colheita, estarei sempre a semear. Adiós! – despede-se antes de desaparecer na fumaça.
- Vai semear uma ervinha, sujeitinho arrogante! – grita Poliana, já enrolando a língua, enfiando outro bombom na boca e se afundando ainda mais nas almofadas de seu divã. – Numa coisa é preciso ser justa, pensa a embriagada rainha, o homem é ótimo nos slogans. Imagine se ele tivesse todo o marketing e mídia a seu dispor ha 50 anos!  O mundo todo seria uma ilha castrista! – surpreende-se Poliana – Melhor ficarem mesmo, só nas camisetas dos jovens e dos velhos hippies saudosistas. - conclui a sempre pragmática, e nada idealista rainha, antes de adormecer no divã.





sábado, 5 de outubro de 2013

A grave crise de governabilidade da realeza

A vasta corte da rainha corria alvoroçada pelo castelo. Pajens baratinados fechavam as janelas para evitar que os gritos histéricos da monarca pudessem ser ouvidos pelos súditos do lado de fora. Se sua alteza continuasse a quebrar toda a louça real e a berrar como uma desvairada, até a eternamente hibernante Oposição era capaz de levantar da tumba.
- O que aconteceu dessa vez? – pergunta um assessor – Não vão me dizer que vocês esqueceram de dar o anticoncepcional à rainha e isso é mais uma das suas conhecidas crises de TPM?!
- Nada disso! Eu mesmo dou as pílulas para sua majestade todo dia. Mais de uma até, só para garantir. - responde um dos pajens, enquanto limpava os restos de mingau da aveia que lhe fora arremessado pela rainha logo no café da manhã.
- Mas se não é TPM, alguma coisa grave vocês fizeram para enfurecer desse jeito Poliana! – acusa um dos bobos – Aposto como trocaram a cor do esmalte. Vocês sabem bem que em outubro ela só usa o rosa.
- Não foi isso.
- Deixaram faltar os bombons de amarula?
- Não.
- Foi o hidratante para o corpo e os pezinhos reais? Na primavera ela troca o creme de avelã e cereja por aromas cítricos, tangerina e limoncello. Será que foi isso que deixou a rainha ainda mais azeda? – questiona outro pajem.
- Não.
- Pelas barbas de Fidel! – alarma-se cada vez mais um companheiro ao ouvir um novo surto de impropérios vindo da redoma e o estrondo de objetos colidindo com as paredes – O que de mais grave pode ter acontecido para desestabilizar assim os frágeis humores reais?  Nós acabamos de renovar todo guarda-roupa dela, motivos florais, como ela exigiu. Só os sapatos davam para calçar o reino inteirinho!
- Pode ter sido a temperatura do banho! – exclama outro bobo – Como daquela vez em que a água estava muito quente e ressecou sua delicada pele, lembram? Ela quase afogou o pobre do pajem na banheira.
- Eu lembro! Coitado! Ficou com fobia de água desde aquele dia. Agora tem até que sentar para mijar. – lastima um companheiro, balançando a cabeça em pesar.
- Não foi o banho. Ela ficou assim na hora do café da manhã. – começa a esclarecer outro companheiro – Enquanto lia os jornais do dia.
- Jornais?! Não podem ter noticiado mais um de nossos deslizes. A rainha não reagiria tão raivosamente com assuntos assim tão corriqueiros e sem importância. – reflete um dos bobos da corte, sendo bruscamente interrompido pelo barulho da grande porta da redoma ao ser escancarada para a entrada triunfante da magnífica e descabelada Poliana no recinto.
- Vocês! – grita a descomposta rainha para sua apavorada corte de bobos e pajens - Seus energúmenos! Não valem um décimo dos recursos públicos que pagam seus salários! Incompetentes! Inúteis! – esganiça a monarca derrubando tudo que via pela frente.
- Que nós não valemos nada, todos sabem Poliana. Mas o que foi que fizemos de errado dessa vez para deixar você, magnânima, tão amoadinha? – pergunta um dos companheiros de clã.
- Escolheram outra rainha! Outra! – berra a irascível monarca – Eu gasto uma fortuna dos contribuintes em uma assessoria de marketing, mídia e ilusão de ótica, e o que vejo estampado nos jornais?! A cara de outra fulana como rainha! Traidores! – grita Poliana jogando os periódicos em sua sempre apalermada corte.
- Mas alteza... – começa a contemporizar o marqueteiro oficial do reino – essa é só a rainha escolhida para a feira empresarial da região!
- Não importa quem seja essa baranga horrorosa! Ela teve mais espaço na mídia do que eu! Eu! Soberana única e absoluta desse reino! – continua Poliana, já fazendo beicinho. – E ela nem é fotogênica! – completa a rainha, cruzando os braços emburrada em sinal de pirraça e despeito. – Isso não pode ficar assim! Ordeno que vocês gastem cada centavo de dinheiro público que for preciso para inundar a imprensa local com imagens minhas. Minhas! O povo não pode ter dúvidas de quem é a rainha desse fantasioso reino. Mexam-se seus molóides! – ordena Poliana, fazendo seus, quase sempre lerdos e despreocupados bobos, correrem assustados em busca de um pouco de trabalho.
Nada como um fato grave e ameaçador a soberania no reino para fazer com que tantos glúteos inertes fossem postos em movimento, pensa a destemperada Poliana, enquanto se acalmava saboreando seus adorados bombos de amarula.