quinta-feira, 30 de junho de 2011

Poliana, a Rainha das Jogatinas






Que divertido jogo inventara Poliana e seus amigos. Nada como ser a dona da bola e do campo, pensa a nobre rainha. Ter o poder de mudar as peças conforme sua conveniência ou capricho era realmente engrandecedor. Principalmente se para consertar os eventuais estragos pudesse contar com os inesgotáveis recursos de seus tolos e ignorantes súditos. Deve ser a isso que seu clã se referia quando falava em “vontade política”, reflete Poliana. E vontade parecia não faltar a sua alteza e seus adoráveis bobos da corte. Quanta ânsia em criar tumultos e confusões! O ideal de inclusão social alardeado por anos em Horário Eleitoral parece ter sido substituído pela idéia fixa de desconstruir o que estava se alicerçando e demolir de vez o que estivesse dando certo. Tudo para consolidar definitivamente o nome de sua majestade na história do reino. O importante era vender aos súditos a idéia de que esse magnífico reino só estava no mapa graças ao desprendimento e desempenho irretocável dessa ilustre e destemida rainha e sua fiel corte. Antes dela, a magnífica, apenas sombras e pestes assolavam o reino.
Pois Poliana adorava este jogo de poder, quanto divertimento. Em sua gincana de trapalhadas espalhara o lixo e a imundície pelas ruas. Semeara sujeira dentro e fora do palácio. Conseguira enojar até seus mais patéticos contribuintes. Feita a festa dos entulhos e dejetos montara o circo da participação popular para dar ao povo insatisfeito um pouco de ilusão e pirotecnia. Tudo muito bem articulado e elaborado para fazer o povo concluir o que já era público, visível e mal cheiroso: alguém eficiente devia recolher o lixo das ruas. Bravo! Como era importante a participação popular! Bem dita Poliana, a dadivosa, que inventara esse conceito. Terminado o espetáculo circense, a matilha de Poliana daria um jeitinho de arrumar, assim como nas vagas azuis, uma boa boca para seus amigos, talvez os mesmos que andavam esparramando o lixo pelo reino.
Depois, a jovem e espirituosa rainha, deleitara-se com seus bobos a brincar de carrinho. Abrindo e fechando ruas e avenidas. Jogando os desorientados transeuntes de um lado para outro, como brinquedos em um tabuleiro. Gerando confusão e colisões em nome de sua soberba de soberana. Se Poliana decidira, decidido estava, isso é o que se chama confronto de idéias e participação cidadã nesse democrático e inclusivo reino. Os incomodados que se lixem, declara Poliana a democrática rainha. Seus bobos, como sempre, batem palmas e concordam. Quem em sã consciência ousaria discordar de sua alteza? Afinal cabeças já rolaram por bem menos nessa corte de cortesãos e lacaios servis. Depois da divertida brincadeira, Poliana contrata uma eficiente e altamente especializada equipe para arrumar o desarranjo causado pela rainha e sua trupe. Tudo, como sempre é claro, pago e patrocinado pelos benevolentes súditos de Poliana. Que fonte infindável de dinheiro era esse seu amado povo. Que maravilhoso e solidário povo habita esse pequeno e próspero reino regozija-se Poliana. Em nenhum outro lugar no planeta encontraria súditos dispostos a patrocinar as intempéries megalomaníacas dessa corte despreparada e leviana. Somente nesse solo fértil o clã de Poliana conseguiria manter-se altivo e vivo depois de tantas trapalhadas e denúncias de imoralidade. Poliana dava graças aos céus por poder contar com um povo tão ingênuo e crédulo para financiar suas farrinhas. A nobre rainha só espera que Justiça não resolva se intrometer novamente nessa sua festinha particular regada a recursos públicos. Seus bobos lhe tranqüilizaram afirmando que Justiça já se movimentara demais nos últimos dias, por isso só deve aparecer novamente por essas bandas daqui a muitos meses, ou anos! Todos sabem da morosidade e lentidão da temível Justiça. Poliana se acalma e aguarda radiante a próxima partida de seu jogo preferido. Se seu reino ainda não era a bola da vez, todos sabiam quem era a dona da bola e do campo, pensa Poliana a rainha das jogatinas.

quinta-feira, 23 de junho de 2011

Justiça destemperada


Bem vinda chuva que cai sobre o reino de Poliana. Com o aguaceiro que desaba por essas bandas seus súditos permaneceriam em suas casas repousando. Ninguém procuraria por vagas. Poliana não agüentava mais ouvir falar nas tais vagas azuis. Pensava em criar um processo democrático de inclusão em áreas azuis, para acomodar os críticos descontentes de seu reino. Pois não é que Justiça resolveu meter os bedelhos novamente em suas magnânimas idéias.
Poliana estava cada vez mais desiludida com Mundo Real. Que gente mais confusa e contraditória habita esse lugar. Ninguém, mesmo ela que sempre fora tão esperta, conseguia compreender as regras do jogo nesse estranho universo. Está certo que as jogatinas armadas por seus asseclas eram bastante complexas e de difícil entendimento, mas agora até Justiça resolvera tumultuar os seus já desgastados neurônios. Justiça parecia ser tão temperamental e irracional quanto a magnífica rainha. A cada dia, essa velha surda, cega, muda, e cada vez mais esclerosada, resolve mudar de opinião. Coisas de mulher! Seres incompreensíveis. Será que não há ninguém com um pouco de racionalidade e lógica que mantenha essa idosa caduca e incoerente em rédeas firmes. Quem dita as regras do jogo para Justiça afinal? Primeiro, essa patética personagem, acusa a pobre e inocente Poliana sem nenhum fundamento. Joga o nobre nome de sua alteza na lama da imoralidade para em seguida avalizar suas relações indecorosas por tempo indeterminado. Se Justiça soubesse como era sofrido à pobre e esforçada Poliana, fazer com que seu exército de bobos se movimentassem para consertar seus deslizes, teria um pouco mais de paciência com seu reinado democrático e participativo. Pois em uma das poucas vezes que seus apalermados bobos conseguiram vencer a inércia natural de suas personalidades e tomar uma decisão com rapidez e desenvoltura, Justiça coloca todo o surpreendente esforço água abaixo. Era desmotivador tanta injustiça.
Poliana esquecia que as leis que movem Justiça foram escritas por pilantras incorrigíveis e reincidentes, os mesmos idealizadores de mensalões e seus similares. Como poderia a pobre Justiça mostrar um pouco de retidão e coerência quando as engrenagens que lhe impulsionam foram desenvolvidas e aperfeiçoadas pelos engenheiros da impunidade e da falta de decoro. Claro que tudo permanecerá obscuro e nebuloso. Cumprindo o ritmo e os ritos determinados por uma assembléia de imorais inimputáveis, Justiça mostra a Povo Honesto sua pior face: de descaso e conivência. Os poderes que comandam este o curioso reino do Gigante Adormecido, estão todos sob o mesmo cabresto de corrupção e negociatas. Apesar dos transtornos, é reconfortável para Poliana saber que Justiça, no fim das contas, estará sempre ao lado dos mais fortes e abastados. Trata-se é claro de uma inovadora forma de seleção natural, pensa Poliana, a defensora dos excluídos. Com nosso clã a imperar absoluto no Congresso de Vendilhões, e Justiça a agonizar, lenta e lamentavelmente em praça pública, resta apenas Imprensa Livre a causar transtornos a Poliana e seus companheiros. Mas, muito em breve, essa também haveria de se render aos ideais do grande clã.

sábado, 18 de junho de 2011

Santo Jorge, o showman de Poliana


É isso aí. Todo mundo no ritmo! Mão na cabeça, assim, assim. Rebolando, rebolando! Batendo palmas. Agora abaixando de vagarinho. Muito bem! No ritmo, cantando o refrão: o enrolation, o enganation, sem-vergonheition! - Atenção para a coreografia: todo mundo abanando os maços de dinheiro. Agora colocando nas cuecas... nas meias ... nos bolsos. Mexendo os quadris. Um passinho pro lado, pro outro...
-Chega! Isso tá ridículo! Vocês parecem uns patetas dançando! - Interrompe Poliana, farta com o espetáculo de seus bobos da corte. – Isso não vai dar certo Santo Jorge. Eles são uns molóides, não tem a menor ginga.
- Sem essa Poliana, a gente até que se sai bem na parte de esconder o dinheiro! – ofende-se um companheiro.
- Vocês estão há dias ensaiando e só conseguem fazer fiasco! Aliás, fiasco parece ser o carro chefe de nosso reinado. Não conseguimos ficar nem uma semana sem cometer algum. Nesse ritmo vocês vão arruinar minha imagem de soberana. – exaspera-se a rainha.
- Nós não temos culpa se não temos a formosura e o molejo de Santo Jorge, Poliana. Cada um tem suas aptidões, a nossa é enrolar não rebolar.
- É isso mesmo majestade! Nós somos bons na hora de cooptar otários e arrebanhar súditos ingênuos para nossa manada de inocentes úteis, mas essas macaquices que o Santo Jorge faz, nós não sabemos fazer. Não tem jeito.
- Por isso que Santo Jorge vale tanto! Vocês não valem nem um décimo das nossas propinas. Eu teria trocado todos vocês por ele, mas ninguém se interessou pelo negócio. – ironiza Poliana. - E depois tem outra, vocês hoje em dia já arrebanharam todos os trouxas disponíveis com aqueles discursos bolorentos de socialismo. Os tempos mudaram. Ninguém mais cai nesse conto do vigário.
- Por isso nos esforçamos tanto pra trazer pro reino a escola de Ensino Superior Poliana, será uma inesgotável fonte de crédulos inocentes para nossa doutrina de alienação e servidão inquestionável. – retruca um dos catedráticos companheiros do clã.
- Calma companheirada, sem brigas. Precisamos nos manter unidos e pensar com clareza. - discursa Líquen, apaziguador. - Nossa rainha tem razão, com sempre. Precisamos dos espetáculos de ilusionismo e pirotecnia de Santo Jorge para continuar adestrando as massas. Ele é nosso encantador de súditos. O melhor vendedor de ilusões de nosso time.
- E nós não valemos mais nada?! – indigna-se um dos velhos representantes do SindiPelego – Depois de tudo que já fizemos por nosso clã! Nós que inventamos a arte de iludir as massas com discursos poéticos! Fomos nós, que conquistamos multidões vendendo o sonho de uma sociedade justa, igualitária e inclusiva!
- Isso foi antes de nós sermos pegos incluindo os maços de dinheiro das massas nas cuecas! Antes de vendermos o sonho de justiça social pelas propinas que nos sustentam! Antes de deixarmos rabos para Oposição nos ridicularizar! – contrapõe Poliana, exasperada.
- Oposição não tem moral para nos criticar! – revolta-se Farofinha, o mais engomadinho dos companheiros presentes.
- Moral? Lá vem vocês com essa conversa de Horário Eleitoral. Isso não tem nada a ver com moral, mas com a arte de se locupletar no poder com o mínimo de discrição. Nós passamos tantos anos fazendo algazarra e estardalhaço que até na hora de cometermos nossos pequenos desvios éticos temos que chamar atenção. Damos a faca e o queijo pra Oposição se fartar!
- Oposição não tem moral para nos criticar. – repete Farofinha com sua cara de boneco de ventríloquo.
- A idéia de trocar Santo Jorge por panfletos e outdoors foi sua Poliana. Nós não temos nada com isso! – critica o companheiro dos Sem Vontade.
- Como soberana absoluta, tinha que tomar partido. Tava tudo certo, uma negociata perfeita entre companheiros de clã. Todos nós sairíamos ganhando. Nosso Santo continuaria fazendo milagres em nosso terreiro e a Vaca Pátria pagaria a conta. Não tenho culpa se a Vaca foi pro brejo e se atolou nessas bobagens que chamam de legalidade. Deve ter o dedo duro de Oposição!
- Oposição não tem moral para nos criticar! – insiste Farofinha, o boneco de cera, sem se despentear.
- O que passou, passou. Mais uns dias e todos vão esquecer esse pequeno deslize. Não temos que nos preocupar, afinal quem pagou a conta foi o contribuinte. E esse tá tão acostumado a sustentar parasitas, que nem vai se incomodar com mais um. E, no final da conta, nosso clã saiu no lucro. O único inconveniente foi o efeito rejuvenescedor desse fato sobre a apalermada Oposição. – afirma Líquen, sempre lúcido e ponderado.
- Oposição não tem moral pra...
- Cala a boca Farofinha! Você não está em plenário! Ninguém aqui agüenta essa tua cara de pau e essa conversinha de criança mimada que perdeu as bolitas pros adversários! – reclama um dos Companheiros Unidos no Trambique (CUT).
- Eu estou treinando minha capacidade de oratória e replica, ora bolas! – magoa-se Farofinha, com cara de namorado rejeitado da Barbie.
- Vamos ser práticos e objetivos - contemporiza Líquen, o maquiador oficial de Poliana – Temos que reverter a publicidade negativa. Nossa rainha tem se esforçado bastante. Tem sido incansável na maratona de sorrisos e abraços para fotos. Consegue desempenhar com maestria o papel de soberana séria e íntegra, mesmo quando lambuzada por excrementos ou atolada em denúncias de imoralidade. Temos que confiar em nossa capacidade coletiva de transformar nossas falcatruas públicas em pura intriga e difamação. E nisso, companheiros, todos somos mestres! Estamos muito a frente da amadora Oposição.
- Isso é verdade. Nós somos os caras!
- Vamos dividir o estrelato. Santo Jorge, o showman, vai continuar distraindo os tolos na periferia, com os espetáculos da Orquestra Partidária (OP). Esse povo é nosso foco. Luzes coloridas e ilusão de ótica.
- Pode deixar comigo! – exclama Santo Jorge, já iniciando uma de suas impagáveis danças, repletas de contorções e saracoteios.
- E vocês ilustres companheiros, vão se encarregar das operações estratégicas.
- Quais são essas operações?
- Ameaçar Imprensa Livre e fazer com que se cale. Repetir insistentemente, como faz Farofinha, nosso ilustre membro do parlamento, que quem inventou a corrupção foi Oposição e que nossa corrupção é para um bem maior, por isso é diferente, mais integra e menos fétida. Convencer os alienados que ainda acreditam em nossa moral de cuecas, de que tudo que Imprensa Livre divulga, não passa de um grande complô do Bicho Papão para destruir o ideal de justiça e cidadania que nós, e apenas nós, inventamos e lutamos tão arduamente para implantar nesse reino de miséria e desigualdade.
- Isso é fácil, fazemos há anos! – vangloriasse um representante dos movimentos sociais.
- E a mais importante e difícil das tarefas: conter nosso ímpeto de socializar o que é do povo. Refrear nossa ganância individual em prol do coletivo. Coletiva e discretamente conseguiremos arrecadar mais propinas para o grande clã e assim nos manteremos por mais tempo com as chaves do cofre. Com um pequeno gesto de abnegação de cada um de nós, conseguiremos anos, e anos de locupletação participativa e geração de renda.
- E isso aí galera! – agita Santo Jorge - Todo mundo junto no compasso: o enrolation, sem-vergonhetion, locupletetion, nós merecetion, o propinetion, e os contribueition só se ... Poliana acompanha descontraída sua turma na dança do descaramento, ritmo consagrado no reino dos oportunistas.

sábado, 11 de junho de 2011

Poliana, a Injustiçada


Enfim os holofotes! Poliana já sentia saudades das grandes manchetes. Afinal, havia semanas que não ocorria nenhum escândalo em seu límpido reinado digno da grande mídia. Poliana passara dias a assistir, com contido despeito, todas as luzes voltadas para o mascote preferido da rainha mãe, a Escolhida. Apesar de toda sua sincera devoção ao grande clã, não conseguia deixar de sentir certo prazer com a reincidente queda de uma estrela tão querida pela fina flor do movimento socialista. Poliana já estava farta de ver manchetes sobre a exuberante cobertura e o impressionante crescimento financeiro de seu respeitável companheiro. Não entendia porque tanto espanto e alarde com feitos tão corriqueiros. Comprar uma coberturazinha e multiplicar seu patrimônio era muito simples, até Poliana conseguira. E ninguém fizera propaganda do fato. Imprensa Livre era mesmo muito simplória, não tinha qualquer noção de investimentos. Deveriam participar do Curso de Formação de Pilantras que estava sendo ministrado essa semana por grandes caciques de seu clã. Estrelas de primeira grandeza, mestres do descaramento. Com eles Poliana aprendera noções básicas de como investir sem remorso nos recursos públicos. Aprimorara a infalível técnica de hipnotizar a massa com conceitos utópicos e ideologias vazias, enquanto abarrotavam suas cuecas com as merecidas propinas.
Agora o reino de Poliana voltara a ser notícia. Novamente por problemas de entendimento. Não bastasse a implicância crônica da tendenciosa Imprensa Livre, agora até a tal Justiça dera de se intrometer no reinado Poliana. Data vênia! Era mesmo o fim dos tempos. Poliana tinha que concordar com seu velho companheiro da boina verde, quantas saudades da democracia Cubana! Aquilo sim era lugar digno de se viver. Aqui, qualquer um se acha no direito de dar pitacos em suas desprendidas decisões. Quem Justiça achava que era pra questionar o infalível senso de direção de Poliana? Justo ela, que sempre soubera onde pretendia chegar. Sempre dirigia suas ações para acomodar confortavelmente seus amigos nas melhores vagas. Tudo regido pelo claro princípio da economicidade, pois seus companheiros economizavam bastante uma vez que o contribuinte pagava a conta. Tudo perfeitamente justo e ajustável aos sempre valorosos interesses de seu clã. E a Justiça (que além de cega, surda e muda, devia estar também esclerosada) tivera a audácia de questionar a multiplicação de vagas com redução de faturamentos aos cofres públicos. Que coisa mais mesquinha, só se pensa em dinheiro. Onde foram parar os ideais socialistas? Poliana inconformada pensa: “Quanta injustiça há nesse reino. Ainda bem que essa tal de Justiça aparece muito pouco por aqui. Costuma hibernar por anos, não é muito afeita ao trabalho, e se move como uma lesma. Não fosse assim, essa gigantesca Nação não seria esse fértil solo de descaramento e imoralidade que nos mantém.”
No grande reino do Gigante Adormecido, entre o lícito e o moral concorrem tolos e espertos. Vence sempre quem oferecer mais a nobre corte e ofertar menos a seus súditos. A Justiça, acomodada em seus confortáveis lençóis de seda, assiste a tudo inerte e omissa. Entre um cochilo e outro, se manifesta. Para sua inércia crônica, usa as mesmas desculpas de pilantras e falastrões. Perdeu há tempos a dignidade e credibilidade proclamada em juramentos e discursos. Com sua conivência, ineficiência e condescendência, aproximou-se lastimavelmente daqueles que devia combater. Abandonou o respeito por seu povo. Perdeu a confiança de seu povo que, crédulo como sempre, ainda espera que Justiça possa renascer das cinzas e se redimir por anos de impunidade.

sábado, 4 de junho de 2011

A Concentração do Time de Poliana


- Vamo lá companheirada! Chega de moleza! Assim não vai dar certo! – grita Líquen para o grupo que se arrastava exaurido no pequeno ginásio. Mais uma volta na quadra, vamos com isso! – ordena enquanto assopra insistentemente seu apito e passa, desolado a mão nos cabelos cada vez mais grisalhos de desgosto. Aproveitando o inusitado período sem escândalos no reino resolvera preparar seu seleto time para o festival quadrienal de jogatinas que ocorreria no próximo ano. Mas com a falta de vontade e preparo de seus companheiros para a labuta seria difícil que conseguissem sair do vestiário.
- Chega Líquem, não agüento mais! – ofega um militante do Movimento dos Sem Vontade.
- Isso mesmo, não dá mais. Estamos cansados!- concorda outro companheiro desabando no chão sendo solidariamente acompanhado pelos outros sudoréticos e esbaforidos membros do clã.
- Cansados! – esbraveja Líquen – Nós chegamos aqui há 15 minutos! Vocês fizeram 5 minutos de alongamentos, deram uma volta na quadra, fizeram vinte abdominais e vinte flexões e não agüentam mais!!! Até os grupos de terceira idade fazem mais exercícios que vocês!
- Eu disse que eles eram uns molóides. – diverte-se Poliana que acompanhava a distância o treinamento.
- É que nós estamos fora de forma. Não estamos acostumados com toda essa atividade Líquen. Tenha paciência. A única flexão que fazemos é pra levar o garfo a boca.
- E o dinheiro às cuecas, é claro. - intervém Poliana, irreverente como sempre.
- Mais o copo que o garfo, completa o representante do Movimento Só Tramóia e Trago (MSTT). – Por falar nisso, não dá pra fazer uma pausa pra uma cervejinha? – questiona, mas muda logo de idéia frente o olhar fulminante de Líquen.
- É isso mesmo treinador, só falta preparo. – acrescenta o atarracado presidente do Companheiros Unidos no Trambique (CUT). – A gente só caminha quando tem passeata e faz anos que não fazemos nenhuma. No mais, é só abanar bandeirinhas a cada dois anos, nada que exija tanto esforço.
- Se ao invés de “pegar emprestado”, vocês ao menos carregassem pedras, teriam um pouco mais de fôlego suas tartarugas! – tripudia ainda mais Poliana, se deliciando com o Bullying sofrido por aqueles que tantas vezes duvidaram de sua inteligência e capacidade.
- Mas pelo amor de Deus, vocês não fazem mais nada? Nenhuma atividade com um mínimo de esforço?
- Claro que sim! – responde a já inflamada estrela do CUT. – A gente faz reunião! Muita reunião! Pauta e ata. E depois a gente marca outra reunião! E organiza a ata da reunião anterior. E no outro dia, outra reunião pra planejar a pauta da reunião do dia seguinte! É um trabalho estafante, não é mesmo companheiros?
- Horrível! Muito, muito desgastante! – concordam os demais membros do time.
A beira de um ataque de nervos, Líquem ainda um pouco esperançoso, pergunta:
- E vocês representantes dos agricultores, devem estar acostumados com a lida do campo?
- Campo? De futebol?
- Não, com o trabalho na lavoura, o plantio, a terra...
- Ha, a terra! A gente vai de vez em quando lá enrolar os colonos, discursa bastante pra eles, mas não chegamos muito perto da terra, não. Sabe com é, o solo é muito argiloso, vermelho, estraga todo o sapato.
- Ai meu pai! Onde eu fui amarrar meu burro?! – escabela-se Líquen, menos amorfo e mais disforme de desânimo.
- Mas porque estamos nessa concentração em ritmo tão puxado tanto tempo antes das jogatinas? – pergunta um dos membros.
- É que vocês se embebedaram com o doce vinho dos recursos públicos, cruzaram embriagados de arrogância os furões da moralidade, apedrejaram descaradamente os valores de Povo Honesto e fizeram tanto barulho e estardalhaço que conseguiram acordar o monstro, seus mortos de fome! – grita Poliana, assumindo, soberana o controle da situação.
- Monstro!? Que monstro?
- Aquele que vocês me juraram que estava morto. Que jamais voltaria. Que estava velho e inútil. Que jamais viria assombrar meu reinado. Zangão, o sisudo!
- Mas ele parecia mesmo moribundo, que não levantaria mais seu ferrão.
- Só que a algazarra de vocês acordou até Zangão, que agora sobrevoa como uma praga o meu reino. E Zangão é como um Viagra para Oposição. Bastou meia hora de sua intimidadora presença e Oposição já estava de pé, firme e decidida. E o pior de tudo, de beijos e abraços, no maior romance! O que será de mim, com o temível Zangão a me assombrar?
Percebendo que Poliana já começava a apresentar sinais de destempero Líquem interfere.
- Você não precisa se preocupar com isso Poliana, nós temos tempo para reverter a situação. Precisamos que ter calma e não mostrar medo.
- Isso mesmo rainha. Olha só o time que Oposição lançou para disputar as preliminares do campeonato. O time da renovação. Renovação! O mais novinho deles vaiou o goleiro Barbosa na copa de cinqüenta.
- Há, há... É verdade! Estão em pior forma que vocês. Não devem agüentar nem abanar bandeirinhas.
- Claro que não! Eles não sabem fazer passeata, nem aglomeração. Só se juntam pra jogar bingo, e olhe lá. Vai ser preciso mais que Viagra pra levantar aquela velharia toda.
- E depois nós sabemos fazer marketing. Olha só quantas fotos já tiramos de nossa alteza essa semana visitando as obras no reino.
- Obras? Obra, obra mesmo, eu fui só em uma. Mas eu vi um bueiro, três lombadas que por perseguição midiática tivemos que refazer, coloquei umas pás de brita em vários buracos no asfalto, troquei uma lâmpada queimada por outra lâmpada queimada, conheci um monte de terrenos baldios onde a gente prometeu que vai construir algo que nunca vai sair do chão e...
- Isso é o que você fez Poliana. A questão é: o que nós vamos divulgar. Vamos fazer banners, outdoors, panfletos, cartazzes e matérias nos jornais mostrando tudo o que o povo gostaria de ver. Assim o povo vai achar que fazemos tudo o que mostramos nas lindas e coloridas imagens, como em Horário Eleitoral. E vai esquecer rapidamente a triste e deplorável imagem que causamos.
- Só se nossos companheiros conseguirem de hoje em diante, demonstrar a mesma vontade de se apropriar da coisa alheia que demonstram pra trabalhar. – ironiza Poliana.
- São coisas completamente diferentes Poliana. Trabalhar exige esforço, o resto é só recompensa por serviços prestados. – esclarece um dos bobos de Poliana, tentando demonstrar um pouco de indignação.
- Vamos fazer material impresso com todas aquelas fotos que tiram todos os dias de mim? – pergunta a rainha
- Claro! Não é maravilhoso! – exclama Líquem recobrando o otimismo.
- Nossa! Então vamos ter que comprar mais uma gráfica!
- Ótimo! Essa é a idéia: união. Esse é o nosso lema. Esse é o nosso jogo. Somos imbatíveis. – exulta o treinador levantando seu time.
E em um harmonioso circulo no cento do ginásio a constelação de ilustres representantes populares, com o peito inflado de orgulho, e a mente repleta de ideais de justiça social repetem em uníssono as palavras de ordem de seu time: “O que é bom pro povo? Nós! O que é do povo é nosso! O que é pra nós? Tudo! Tudo para o clã! Todos com o clã! Todos com o clã!”