domingo, 27 de novembro de 2011

As Falsas Impressões de Poliana


Os companheiros da rainha estavam ainda ressabiados e exauridos com a última crise de estrelismo da megalomaníaca Poliana. Seus corpos doloridos tinham dificuldades em se acomodar nas duras cadeiras do castelo. Como sempre ocorria, depois de um fiasco da realeza e sua corte, uma interminável reunião para as costumeiras mijadas e puxões de orelhas dos bobos de Poliana. Alguns bobos, que guardavam ainda certo resquício de cérebro e bom senso, questionavam-se até quando sua alteza continuaria a fechar seus adoráveis olhinhos de biscuit para o que era óbvio e gritante: as impressões que Poliana tinha de seu reinado eram tão falsas quanto eram falsas as impressões de seus amigos. Poliana e seus amigos só enxergavam aquilo o que lhes era conveniente enxergar. Qualquer mudança de padrão, textura, cor, peso ou medida, que não fosse oportuno ao fiel e unido grupo seria sempre oportuna e estrategicamente ignorado. Tudo, é claro, em nome do clã e do ideal socialista. Vieram ao mundo, Poliana e seus asseclas, para dar um novo colorido as falsas impressões desse reinado. Chamava-se a isso, oportunistamente, de reinado de oportunidades. E eram tantas as oportunidades de se fechar os olhos para o que estava a sua frente ou se franzir o nariz para a podridão que lhe cercava que Poliana preferia o conforto de sua redoma e a companhia agradável e ilusória de seus alienados companheiros e fantoches reais.
- Não podemos continuar permitindo que esse tipo de notícia acabe nos ouvidos de imprensa Livre companheiros. Precisamos reverter essas manchetes. – discorria Líquen motivador.
- A questão principal é como iremos mostrar aos súditos que a popularidade da rainha e seu reinado é maior do que a tal pesquisa diz que é.
- Como foi que vocês permitiram que Imprensa Livre saísse às ruas para indagar a população sobre a popularidade da rainha? Não havíamos combinado que manteríamos essa linguaruda intrometida bem longe da opinião pública? – pergunta Poliana, como sempre irritadiça. – E quem foram essas pessoas entrevistadas que ousaram discordar desse primoroso reinado e de sua espetacular rainha? Quem deixou essa gentalha falar?
- É muita gente Poliana! Tenha paciência. Não dá pra gente sair por aí ameaçando todo mundo. Esse negocinho de email e telefonema anônimo parece que não funciona com Imprensa Livre. E com a tal intimidação corpo a corpo nós temos que convir que causamos mais riso do que medo.
- É, eu ouvi falar sobre essa última fracassada tentativa de amendrontar Oposição. É a piadinha do reino. - lastima-se Poliana - Por falar nisso onde é que estão nossos companheiros, os irmãos Grafite?
- Estão em casa, com indigestão. Excesso de café e falta de bolachas, dizem as más línguas.
- Parece que estão se cagando... quero dizer, deve ser algum andaço daqueles.
- Você sabe como são os irmão Grafite, Poliana. Adoram um foguinho quando tem os fósforos na mão, mas se borram de medo de enfrentar as conseqüências. Por isso tem sempre alguém em quem possam jogar a culpa no final.
- Muito boa estratégia! Exatamente como eu faço com vocês meus bobos. E por falar nos Grafite, fiquei pensando se não foi a economia de tinta em meus adoráveis cartazzes o motivo dos súditos não enxergarem o quando é maravilhoso e colorido meu reinado.
- Talvez seja isso rainha. Nossos companheiros, os temidos irmãos Grafite, em sua ânsia por crescer e aparecer, talvez tenham economizado ainda mais nas tintas e com isso deixado nosso reinado mais apagado e deprimente do que é.
- Só pode ser isso. Não pode haver outra explicação plausível para o povo não reconhecer tudo aquilo que não fizemos. Na democrática pesquisa de opinião feita aqui mesmo na corte eu obtive altos índices de popularidade.
-O que falta Poliana, é colocar mais cor nos outdoors que mostram nossos feitos, assim o povo vai conseguir ver o mundo tão fantasioso e colorido como nós vemos.
- Ordenarei aos Grafite que parem de economizar na tinta e na qualidade do papel. Precisamos melhorar nossa aparência.
- Mas e os recursos Poliana, você sabe... dinheiro.
- Dinheiro não é problema. Como sempre dissemos em nossos proféticos discursos: é tudo questão de vontade política e prioridades. Vamos tirar dinheiro da educação que ninguém percebe; saúde que é um saco sem fundo e saneamento que ninguém sabe o que é. Assim tudo será colorido e ilusório como os desejos da plebe e acabaremos de vez com as falsas impressões de nosso reinado. – decreta Poliana sempre superfaturada de idéias, mas pobre em execuções.

domingo, 20 de novembro de 2011

A Crise de Popularidade de Poliana


O pequeno grupo de bobos reais se amontoava num canto da sala em atitude suspeita. Disputavam, como crianças curiosas, algumas folhas de jornal. Falavam baixinho tentando não chamar a atenção da rainha que descansava em sua redoma de vidro fumê.
- Deixa eu ver também. Passa logo essa folha, companheiro!
- Olha só isso. É pior do que nós pensávamos. A rainha leva uma surra até na periferia.
- Que povinho mais ingrato e traiçoeiro. Nós gastamos boa parte do nosso tempo e dos recursos públicos entretendo essa gente com fantasias, pirotecnia, shows e pão com lingüiça e é isso que recebemos! Uma bola nas costas da pobre Poliana. – choraminga uma decepcionada integrante da Orquestra Partidária (OP).
- É mesmo. Devíamos ter construído menos canchas de bocha e mais escolas, talvez assim nos livrássemos dessas boladas traiçoeiras.
- Não ia adiantar nadinha. Pelo que diz nessa tal pesquisa a nossa idolatrada rainha é ainda mais rejeitada entre os mais estudados. E, por estudados, entendam aqueles que sabem somar dois e dois.
- Coitadinha da rainha, com todo o sacrifício que ela faz por seus súditos não conseguir largar na frente no concurso de popularidade real. É muita injustiça.
- Não tem nada de injustiça. Isso é tudo perseguição midiática orquestrada por uma elite dominante que não aceita o reinado democrático, popular, inclusivo e...
- Cala a boca Boina Verde! Só estamos nós aqui, então nos poupe desse discurso enfadonho. Essa ladainha a gente guarda pra impressionar os otários mais tarde. – exaspera-se um dirigente do CUT (Companheiros Unidos no Trambique), já entediado com a mesma desculpa esfarrapada de sempre.
- Não dá pra acreditar numa coisa dessas. A rainha vai surtar quando ver isso.
- Nem fale nisso! Não podemos deixar ela ver essa maldita pesquisa de popularidade. Já pensou quando ela descobrir que não é tão adorada e popular quanto nós fizemos ela acreditar que era?! Vai ficar mais histérica do que nunca. Nem uma tonelada de bombons de amarula vai acalmá-la dessa vez. – alarma-se o companheiro da FarsaSindical.
- Isso sem contar quando ela souber que ficou atrás logo dele: Zangão, o sisudo! Vai ser o fim.
- Como é que pode uma coisa dessas? Largar atrás quando se tem a coroa e com toda a ostensiva propaganda que nó fazemos, já é um fiasco daqueles. Agora, perder em popularidade pro Zangão! É inacreditável!
- É verdade. Nem Oposição acreditou, deve estar ainda mais abobada que nós dessa vez.
- Isso é uma catástrofe sem precedentes, pensem bem companheirada. O Zangão é sisudo, ranzinza, rabugento, velho e barrigudo. Não sorri nem pra tirar foto. Detesta beijar velhinhas e pegar criança mijada. Adora usar aqueles coletezinhos cafonas. Não consegue ser simpático nem com photoshop e toda edição de Horário Eleitoral. E, mesmo assim, abateu nossa meiga, simpática e carismática Poliana nas prévias de popularidade real! É inacreditável!
- Não dá pra entender o povo, mesmo. Não sei o que é que tínhamos na cabeça quando disseminamos essa idéia de que o povo devia ter direito a voz e voto. Se era pra dizer bobagens que ficassem de boca fechada, como em toda democracia socialista que se preze. – lastima-se uma antiga estrela dos movimentos sociais e representante fiel das minorias excluídas.
- Com tudo o que a doce e cândida Poliana, com seus olhinhos de biscuit, se esforça para agradar a plebe. Tantos sorrisos e trejeitos. Tantos espetos de linguiçinha para servir. Quanta criança ranhenta para beijar e melecar sua roupa. As intermináveis partidinhas de futebol, bocha e dominó que teve de disputar. E sempre com o eterno sorriso nos lábios. Tudo isso para conquistar o troféu popularidade, e mesmo assim o povo ingrato não reconhece. O que mais a pobre rainha deveria fazer para agradar essa gente?
- Não sei, mas quem sabe se ela posasse menos de perua simplória e mais de soberana do reino? Talvez o povo queira uma rainha e não uma bonequinha de historinhas infantis. Prefira a cara azeda do Zangão, com jeito de quem sabe fazer, do que a cara insosa de Poliana que parece não saber o que fazer e querer o que não sabe onde está. Se é que vocês me entendem?
- Não, não entendemos. Você anda muito filosófico pro nosso gosto, deve ter se vendido para Oposição. – indigna-se um dos bobos cegos da rainha.
- Eu estou só dando minha opinião, mas vocês não escutam ninguém. – queixa-se o compamheiro do clã, mesmo frente a carranca fechada do alienado grupo.
- Nós escutaríamos, se você dissesse o que queremos ouvir. – responde convicta outra democrática figura da corte real.
- Falem baixo ou vão acordar a rainha! Vamos parar de brigar e pensar no que fazer para reverter essa catástrofe. Precisamos nos mexer antes que Oposição fique assanhadinha demais. – intervém Líquen, apaziguador oficial da rainha.- Temos que investir ainda mais em propaganda e marketing. Colocar mais dezenas de banners e cartazzes pelo reino. Criar um projeto de inclusão dos subúrbios em nossas propagandas enganosas, estilo Fidel e a gloriosa democracia Cubana. Vamos soterrar a plebe de outdoors e folders, vendendo um reino encantado como em Horário Eleitoral.
- Mas e a tal elite? Como vamos ludibriá-los?
- Esses são os mais fáceis de iludir. É só mostrar para eles alguns filmezinhos chorosos com o povão lutando democraticamente por cada trave de gol e churrasqueira na periferia, que eles se mijam de emoção. Essa gente adora esses contos da carochinha pra intelectual dormir. Juram que são franceses, os coitados.

- E temos que caprichar mais nas churrascadas da OP também. Mais carne e menos pão e repolho pro povão! – sugere um dos bobos eufórico.
- Podíamos cercar os subúrbios com outdoors e cartazzes coloridos, como a redoma de Poliana! Assim eles não conseguiriam ver o lixo, a sujeira, a falta de infra-estrutura e os buracos no asfalto. Com isso, talvez não sintam saudades do insuportável e carrancudo Zangão.
- Ótima idéia companheiro! – estimula Líquen, motivador - É disso que precisamos, iniciativa para iludir por mais alguns meses os súditos e... nossa rainha também. Precisaremos trabalhar como nunca para impedir que sua alteza tenha acesso a esta maldita pesquisa. Ninguém estranho pode entrar na redoma da rainha.
- Já estamos controlando tudo companheiro.
- Ótimo. Nada de rádio, TV, jornais, revistas, internet...
- Internet também? – pergunta um dos pajens, já vermelho como pimentão.
- Claro! Principalmente a internet. Esse é, atualmente, o principal espaço para reacionários desocupados e subversivos espalharem maledicências. Por quê?
- É que eu não cortei a internet da redoma. A rainha adora navegar. Ela passa horas tentando entender as charadas e piadinhas sem graça de um tal Blog da Poliana...
- Ah, não! Ela ainda tem acesso a internet?! Então, a qualquer momento ela vai ver a pesquisa e vai ser... – tarde de mais para conjecturas, os fieis bobos reais ouvem o som que antecede, para eles, o inferno terreno.
- O que é isso! Quem deixou que Imprensa Livre divulgasse essas mentiras! – o esganiçado e apavorante berro da rainha deixa os bobos momentaneamente imobilizados de pavor. – É mentira! Mentira! – mais gritos, sucedidos pelo som de objetos colidindo com as paredes. – Onde está meu espelho mágico?! – novos objetos quebrando dentro da redoma – O book de fotos dos meus feitos reais, onde está? – urra Poliana, encolerizada, atirando ainda mais coisas nas paredes. – Onde se esconderam os meus bobos? Quando eu pegar vocês, vou arrancar os carguinhos e as mordomias de cada um com as unhas, seus inúteis! – Meus sais! Tragam os meus sais! – o grito histérico de Poliana faz com que os apatetados bobos comecem a correr desatinados, prontos, como sempre, a atender a todas as tolices e frescuras da menos popular, mas sempre intempestiva rainha. - E os bombons de amarula! Tragam já as caixas de bombons de amarula, seu molóides!

domingo, 13 de novembro de 2011

O Império Contra Ataca


Poliana tentava enxergar através do espesso vidro de sua redoma o trabalho de decoração para as festividades natalinas que se aproximavam. Poliana adorava os preparativos para as festas. Seu povo parecia mais sonhador e crédulo que no resto do ano. Tudo ficava mais colorido e fantasioso, tão parecido com Horário Eleitoral! Poliana já andava farta de Mundo Real. Por aqui só havia queixas, intrigas, chuva, calor e, é claro, buracos no asfalto. Além da odiosa Imprensa Livre que por pura falta de sorte dela, Poliana, ainda não se sufocara com sua própria língua ou veneno. Até mesmo seus súditos pareciam mais alegres e bonitos em Horário Eleitoral. Aqui em Mundo Real o cheiro é diferente e não há photoshop. O pior de tudo é que nesse maldito lugar as pessoas podem dizer o que pensam e ela Poliana, a soberana absoluta do reino, dona de todas as certezas, tinha que ouvir as críticas calada. Calada! Como se aceitasse tudo com grande dignidade e fazendo cara de quem peidou no elevador lotado. Mas Poliana contava com seu exército de fiéis seguidores para vingar sua honra difamada por críticos desumanos e cruéis.
- Agora sim, ela vai se borrar de medo! – anuncia efusiva a presidente do SindiPelego
- Dessa vez nós conseguimos assustar a criatura asquerosa, companheiros. – brinda erguendo o copo de chopp um membro do MSTT (Movimento Só Tramóia e Trago).
- Será que não fomos longe demais? Vai que a coisa ruim tem um infarto com o susto? – questiona, em tom professoral, uma militante do clã.
- Não podemos ter piedade do inimigo camarada! Temos que nos focar em nossos ideais. Os fins sempre justificam os meios. Não importa o quanto nos sujemos pelo caminho, nosso objetivo será sempre mais transparente e limpo que nós.
- Posso até ver a cara d’aquele ogro. Deve estar escondida embaixo da cama, sem coragem de sair, apavorada! Dessa vez vai aprender a não se meter com quem tem o monopólio da decência e a propriedade das certezas.
- É isso mesmo! Agora ela vai aprender a lição! – comemoram os companheiros as gargalhadas
- O que vocês estão comemorando meus adoráveis bobos? – pergunta Poliana
- Nossa vitória sobre aquela criatura flatulenta e agourenta que lança suas palavras ácidas sobre nosso maravilhoso reinado: Bruxa Má, a invejosa. Dessa vez acho que conseguimos desestabilizá-la. Deixá-la desatinada, sem rumo. Mais tola e ridícula do que já é normalmente.
- Isso mesmo, alteza. Nós fizemos investigações detalhadas do passado dela e descobrimos coisas comprometedoras que estamos usando para ameaçá-la. Agora temos certeza que a velha peçonhenta deve estar se borrando de medo!
- E o que foi que vocês descobriram meus bobos?
Os bobos, ansiosos para agradar sua majestade, fazem o breve silêncio que antecede as grandes revelações:
- Ela tem medo da Cuca! E do Boitatá! – contam os companheiros com o orgulho das crianças ao defecar pela primeira vez no peniquinho.
- Ela o que?! – pergunta Poliana meio incrédula.
- É isso mesmo rainha! Nós fomos longe em nossas investigações. Vasculhamos a vida dela todinha. Até a vila onde passou a infância. E ficamos sabendo de fonte segura: ela se borra de medo da Cuca e do Boitatá!
- É mesmo? - questiona a rainha com certo desapontamento - Além disso, vocês conseguiram alguma coisa ainda mais comprometedora?
- Tem mais coisa sim! Parece que era uma peste, aprontava pra irmã mais nova, foi expulsa de uma aula, passou cola numa prova da faculdade e.... Parece que por muito tempo andava carregando uma bandeira estrelada e pregando umas idéias de justiça social, liberdade de expressão, decência e ética na política. Umas coisas esquisitas, que nós não entendemos direito, então deixamos de lado. Mas, o importante mesmo é: ela tem medo da Cuca e do Boitatá!
- Com base nessas formidáveis descobertas é que estamos acuando essa cobra! Colocando mensagens aterradoras nos espaços de feitiços virtuais da bruxa: “Cuidado com a Cuca, que a Cuca te pega!”- riem os bobos com contagiante prazer.
- Chega dessas bobagens. Assim não tem quem consiga trabalhar. – exalta-se, para surpresa do grupo, o patriarca do clã, Berne, o enrustido. – Será que vocês não se cansam de falar tanta bobagem!
- Credo Berne! Não fala assim com as crianças! São nossos bobos, ora bolas. Nossos companheiros! – Poliana, defende seus adoráveis pupilos.
- Pelo amor de Deus! Só vocês não vêem que estão fazendo papel de idiotas com essas ameaçazinhas e comentários ridículos! Bruxa Má deve dar risada de vocês. – continua Berne muito centrado para uma platéia tão canhota.
- Não são ridículos, não! São bem consistentes. Você Berne, é que nunca foi verdadeiramente da raiz de nosso clã, por isso não consegue nos entender! Seu bobalhão! – choraminga um companheiro fazendo beicinho.
- É isso, mesmo Berne. Você caiu no clã de pára-quedas, agora vem querer nos dar lição de moral.
- Será que vocês não enxergam que não conseguem meter medo em ninguém com essas bobagens?! – continua Berne com a dignidade dos grandes patriarcas - Vocês só conseguem é dar mais motivos pras pessoas falarem. E ao invés de acovardar a Bruxa estão é atiçando-a mais ainda seus burros! Vocês já tentaram isso com Imprensa Livre e se deram mal, como sempre. Esse tipo de artimanha só funciona com gente como vocês que não tem cérebro nem convicções! Que se vendem por ninharia ou são tão alienados a ponto de temer o Bicho Papão só porque o Fidel, o Che e o Chico disseram que ele existe e é muito mau!
- Isso não é verdade Berne! E eu não gosto quando você fala desse jeito com as crianças! Nossos bobos não são burros nem estúpidos! Muito menos alienados! Eles enxergam muito bem, e tem uma visão muito abrangente de nosso reinado e de nossa ideologia. Quem dera todos os nossos súditos tivessem um décimo dessa capacidade de enxergar as coisas que nossos companheiros têm.
- Se você diz Poliana, quem sou eu para discutir. – desiste Berne, voltando a seus jornais e seu notebook.
- É melhor nós voltarmos a esse assunto outra hora. Ficamos tanto tempo aqui discutindo que já anoiteceu. – espreguiça-se Poliana, satisfeita por conseguir contornar mais uma costumeira batalha de egos entre os membros de seu clã. – Berne querido, você pode fechar as janelas da minha bolha por favor?
- Mas com esse calorão Poliana? Por que não deixá-las abertas?
- Credo Berne! Será que você não vê? – irrita-se um dos bobos
- Vê o que? – pergunta o patriarca ainda apalermado.
- Ora bolas Berne! É noite de lua cheia, tem que cuidar com o Lobisomem! – Responde Poliana, injuriada com tamanha ignorância e estupidez.

sábado, 5 de novembro de 2011

A reforma gramatical no reino de Poliana


Na espaçosa sala todos os bobos do reinado estavam reunidos para uma aula básica de articulação. As trapalhadas constantes na hora de lidar com conflitos e problemas simples do cotidiano do poder, obrigaram Poliana a tomar medidas para sincronizar sua desafinada orquestra. No comando do evento estava Líquen, articulador oficial do reinado, que de pé sobre o tablado, discursava à atenta platéia.
– O objetivo dessa aula é afinar nosso discurso, sintonizar nossos interesses e ações. É fundamental que passemos para os súditos a idéia de que somos um grupo coeso, que sabe o que quer e onde quer chegar. Para isso, precisamos revisar alguns conceitos básicos: DISCUSSÃO – escreve na lousa – do democrático verbo discutir, que usaremos, por exemplo, com nossos subversivos e revoltados servos reais. Discutir com os servos e súditos é o mesmo que...?
- Enrolar! – responde prontamente, Poliana.
- Não, Poliana! De onde você tirou essa idéia?
- De nosso reinado é claro! E de Horário Eleitoral! Discutir nada mais é que uma forma de enrolar os otários quando não sabemos o que dizer, ou não temos a menor intenção de fazer o que prometemos que faríamos. – responde convicta, a rainha, para desconforto do professor e demais presentes.
- Está certo alteza, mas vamos nos ater as questões gramaticais nesse momento.
- Voltando ao pertinente tema da revolta dos serviçais, precisamos falar em NEGOCIAÇÃO. Negociar é sinônimo de...?
- Propinas! Propinas! Essa é fácil, muito fácil professor! – grita eufórica a participativa rainha, deixando Líquen de saia justa.
- Não! Negociar, Poliana, é conversar, dialogar...
- Isso é enrolar! O mesmo que discussão! Nós discutimos, enrolamos, ludibriamos o povo como meio de atingir nosso fim: o poder! E queremos o poder para negociar as propinas!
- Assim não é possível! Ela vai acabar de vez com o pouco que ainda resta de nossa ilusão de ética. – indigna-se uma catedrática representante do clã.
- É melhor mudarmos o tema professor. Esse é muito complexo. – sugere o pessoal da FarsaSindical.
- Vamos falar da voz e do sujeito, então. Na frase – escreve na lousa – Na grandiosa e participativa reunião da Orquestra Partidária (OP) foram votadas democraticamente as principais necessidades do bairro de Maria e João. Onde está o sujeito ativo?
- Tá em casa, descansando, é obvio. – responde a rainha deixando a platéia curiosa. – Quem é ativo, trabalha o dia inteiro e não tem tempo pra perder com essas reuniões pirotécnicas e cansativas que nós inventamos para fazer de conta que o povo decide alguma coisa no reino. Qualquer sujeito com um mínimo de senso crítico sabe que da meia dúzia de gatos pingados que vai nesses espetáculos de ilusionismo, metade é da nossa folha de pagamentos. A outra metade é manipulada para votar aquilo que nós entendemos ser a prioridade para a vida deles. E João e Maria devem ser membros do CUT (Companheiros Unidos no Trambique).
- Isso não é justo Poliana! – revolta-se Santo Jorge, o showman da OP, entre trejeitos e rebolados.- Eu me esforço muito para arrebanhar novos seguidores para sua alteza.
- Desculpe Santo Jorge. Outra parte vai a essas festividades só para apreciar o molejo e a ginga do nosso Michael Jackson socialista.
- Vamos debater os conceitos que são as marcas desse nosso grandioso reinado: INCLUSÃO, SOCIALIZAR e PARTICIPAÇÃO. O que podemos dizer ao povo que já fizemos, de fato, com base nesses pilares.
- Essa é minha! Eu respondo! – exulta a polêmica Poliana - Nós incluímos muitos maços de recursos públicos nos bolsos de nossos companheiros. Socializamos carguinhos e serviços entre nossos pares, e participamos de cada maracutaia que conseguimos, mesmo as que a odiosa Imprensa Livre tentou atrapalhar. Tudo com muita coesão e concordância.
- Voltando a análise de textos – continua o professor - que interpretações podemos tirar da seguinte manchete hipotética de um jornal do reino: “Chefe dos bobos da rainha é flagrado, na calada da noite, transportando centenas de rolos de papel higiênico em veículo oficial”.
- Meu Deus! Já estamos roubando até papel higiênico! Depois do negócio das pedras não tínhamos combinados que só íamos pegar o que coubesse nos bolsos? – escandaliza-se uma velha matriarca do clã, sudorética e ruborizada, abanando-se com as saias.
-Não! Isso é só um exemplo! Não pegamos papel higiênico nenhum. Não que eu saiba, pelo menos. - esclarece Líquen continuando a aula - Que interpretações podemos vender ao povo?
- Em primeiro lugar, esse jornaleco sensacionalista e reacionário logicamente está a serviço do imperialismo e da elite inconformada com nosso reinado inclusivo e democrático. É perseguição midiática! – discursa eloqüentemente, o companheiro boina verde, sob aplausos efusivos da imparcial platéia. – Em segundo lugar, é lógico que essa situação só pode ter sido alguma armação asquerosa da invejosa Oposição. Em terceiro lugar, devíamos mandar fechar esse tablóide ou retirar todos os anúncios reais que tivermos publicado nesse lixo subversivo!
- Muito bem! É isso aí! – grita a audiência em delírio. O professor quase em prantos, por uma interpretação tão didática e precisa, reluta em ceder a palavra à rainha que erguia com insistência a mão, pedindo a vez.
- Sem essa gente! Vamos parar de mentir pra nós mesmos. Eu conheço todos vocês, os bobos e suas trapalhadas. Com certeza, nesse caso, nós devemos ter feito mais uma das nossas gigantescas cagadas e o chefe dos bobos foi o escolhido para limpar toda a sujeira antes que o cheiro acordasse Oposição. Como sempre, nós não sabemos fazer nada, nem cagadas, sem chamar atenção de Imprensa Livre. Temos sempre que tirar uma fotinho para um banner ou outdoor. O bobo levou junto nosso assessor de marketing, que filmou e fotografou seu ato ilícito e depois, só para se gabar, publicou as fotos no mural de uma rede social. Daí foi mais um fiasco socialista. Nesse ritmo Fidel vai acabar nos processando por danos morais. – tripudia Poliana, deixando seus companheiros desanimados.
- Para concluirmos essa aula – continua Líquen,cada vez mais amorfo, tentando manter o controle da turma – vamos trabalhar com os tempos verbais. Na frase: Nós lutamos por um reino inclusivo onde todo cidadão tem direito a voz e a liberdade de expressão. Qual o tempo verbal da oração?
- Passado, é lógico! - Responde a rainha, já entediada - Esse papo todo faz parte do nosso passado, todo mundo sabe. Hoje que estamos sentados no trono, queremos que o povinho fale e questione o mínimo possível. Que só enxergue aquilo que nós mostrarmos a eles. Participação só acontece entre cordeirinhos que pensam exatamente como nós, senão é alguma espécie de complô. Só não acabamos de vez com essa maldita liberdade de expressão, por que tem a tal Democracia a nos assombrar. E odiamos qualquer um que tenha uma voz que destoe da nossa. E chega dessa aula chata! Onde estão meus bombons de amarula seus moloides?! – grita Poliana, pondo seus bobos em ação para evitar mais um ataque de TPM da temperamental rainha, doutora em sintaxe e semântica pela nova escola marxista pós- reinado.