No
grande reino do Gigante Adormecido, eram feitos os últimos
preparativos para mais uma majestosa turnê a Horário Eleitoral. Em
poucos dias, o povo adentraria novamente nesse festivo e fantasioso
mundo, onde sonhos e ilusões alimentariam a toda gente.
Para
enfrentar mais essa difícil maratona, a companheirada preparava a
Rainha Mãe para as, cada vez mais temíveis, sabatinas e debates ao
vivo. Na impossibilidade de usar seu novo método de fabricar pizzas
- ter acesso prévio as perguntas e ao gabarito - só restava a
Rainha Mãe estudar e ensaiar. E, tendo em vista as conhecidas
dificuldades de nossa monarca suprema em discursos de improviso e
entrevistas, seria necessário muito, muito estudo.
- Majestade!
É fundamental que a senhora não se mostre, jamais, exaltada com o
entrevistador. - aconselha, calmamente o marqueteiro oficial.
- Exaltada?!
Ora, meu querido! Eu vou te falar uma coisa... tem um negócio que
é importante... e importante, é preciso que se diga, é uma coisa
que tem importância... - começa a Rainha Mãe, com sua
característica fala professoral – Eu nunca... jamais... e em
nenhum momento, me exalto! - conclui, com um rosnado.
- Sim,
é claro magnânima. - contorna o outro, para escapulir da mordida
- Mas, apenas para ilustrar, a senhora pode chamar seu interlocutor
de “querido” sem lhe mostrar os dentes caninos. Prosseguindo,
seria aconselhável, com base no histórico de seus discursos, que
sua alteza evitasse as explanações sobre geografia.
- Você
está dizendo isso por causa daquele pequeno deslize que cometi num
discursinho bobo e sem importância para a Comunidade
Internacional, não é? Eu sei que errei ao dizer que a Zona Franca
de Manaus era a capital da Amazônia. É claro que eu, como Rainha
Mãe, sei perfeitamente que a capital da Amazônia é Tocantins! -
pausa para reflexão - Quero dizer... é o Pantanal! O
Pantanal não... como é mesmo o nome? .... Vocês me entenderam,
companheirada! Amazônia, Pantanal, são todos estados repletos de
crocodilos Australianos!
- Nós
entendemos Magnânima! - adula um dos companheiros, para
interromper o raciocínio trensloucado.
- E
é importante que se diga – continua a Rainha Mãe - do
comprometimento de meu reinado com a questão ambiental. E a
questão ambiental abrange o ambiente como um todo, e não somente
o meio ambiente. Eu não me preocupo com só metade do ambiente,
não! Eu me preocupo com o desmatamento dos crocodilos australianos
do nosso Pantanal, mas também com o desmatamento das árvores das
matas! Árvores plantadas pela natureza. Essa é uma consciência
que eu tenho. E consciência é uma coisa que se cultiva, como as
cebolas da floresta Amazônia.
- Certo.
- continua, abobalhado, o adestrador de animais exóticos – Uma
questão que deve se repetir nessa turnê, é a respeito dos 150
mil, em dinheiro, que a senhora guarda em casa.
- Olha!
Eu vou te falar uma coisa... Eu guardo dinheiro embaixo do colchão
sim! Quem, nesse reino, não tem 150 mil guardado debaixo do
colchão? Eu te respondo: todo mundo tem! Todo mundo tem esse
dinheirinho guardado pra dar prum filho tomar um sorvete, comprar
um BigMac ou fazer uma viagenzinha. Nos tempos de hoje, não é
seguro aplicar dinheiro na poupança. Não com essa política
econômica que está em vigor. - pausa para reflexão –
Quero dizer, nossa política econômica é segura e confiável, os
bancos é que não são confiáveis. E tem também a inflação,
que é importante destacar, é uma grande conquista de nosso
reinado. Vocês me entenderam, né?
- Perfeitamente,
alteza. - desvia-se o marqueteiro, mais perdido que o ministro da
economia. - O próximo tema polêmico, e que deve fazer Oposição
deitar e rolar, é a questão que envolve nossos companheiros e
aliados na formulação de perguntas e gabarito de respostas na
investigação dos rolos em nossa empresa pública de petróleo.
- Esse
tema é muito relevante. E eu te digo que é relevante porque
envolve a confluência de múltiplas, várias e inúmeras questões.
Veja bem... Nossos companheiros...aliados...compadres, todo mundo
sabe, não têm capacidade pra abastecer seus próprios carros. Não
sabem sequer estacionar. A menos que fosse para estacionar em uma
gorda teta pública, porque nisso são especialistas. Mas, voltando
ao meu raciocínio, quem é que vai acreditar que esses meus
energúmenos seriam capazes de formular uma só pergunta, de duas
frases, sobre petróleo? É um absurdo! Ninguém! Repito e garanto:
ninguém, em meu reinado entende bosta nenhuma de petróleo! Se
entendêssemos de petróleo não teríamos afundado, em tão curto
tempo, nossa maior empresa do ramo! - esclarece, enfática, nossa
Rainha Mãe.
- Vamos
mudar de tema. - anuncia o marqueteiro, a essas horas descabelado -
E na questão religião... A senhora é uma pessoa que crê?
- Claro!
Eu creio! Eu creio muito, sabe? Todas as noites eu leio
a....a...aquele livro... aquele livro grosso que fala para quem
crê...Como é mesmo o nome? Não é O Capital. Esse é
outro bom livro. Eu creio muito nesse livro, também. Mas eu leio
aquele outro... O Diário de Um Mago!... Não!..Bíblia! É,
a Bíblia! Sim! Esse é o título do livro que leio toda noite. Só
tinha me dado um branco agora, e esqueci o nome do tal livro. -
esclarece a devotada e crédula rainha – Eu sempre respeitei e
segui as leis e lições da Bíblia e de Deus. Quando eu, ainda
jovem, fazia parte de um grupo terrorista, eu rezava muito. Toda
noite, enquanto limpava minha arma e preparava os assaltos e
sequestros do próximo dia, eu rezava. - emociona-se a Rainha Mãe,
nostálgica – Eu pedia a Che, a Fidel, e até a Deus que nos
protegesse. Eu sempre segui tudo que ditava a doutrina e a fé
comunista...Quero dizer, a doutrina cristã! Eu sou cristã há
muito, muito tempo, sabe? Quase quatro anos. E nesses quatro anos
eu até falei com o Papa! E, quero te dizer, que o Papa é uma
pessoa bem normal. Apesar de usar vestido, né? Mas cê
sabe, que eu sempre defendi o direito dos homens de usarem
vestidos. Somos defensores das liberdades e das minorias. Mas esse
cara, o Papa, fala um portunhol igualzinho ao nosso. Até os
Argentinos conseguem entender sem problemas! E esse negócio da
globalização do nosso portunhol, só aconteceu graças a nossa
política de expansão dos cabos de fibra ótica submarinos. Então,
com isso, é possível concluir, que a fibra ótica tem um papel
importante na divulgação do cristianismo, não é mesmo?
- Acho
melhor darmos uma pausa para descanso. - declara o marqueteiro,
confuso e exaurido.
- Eu
só quero terminar esse assunto, para não perder minha linha de
raciocínio.- interrompe, em seu conhecido estilo imperativo, a
Rainha Mãe. - Para vocês terem uma ideia, os cabos de fibra
ótico, que ligam nosso reino a Europa, são tão resistentes, que
nem mesmo aquele negócio que aconteceu no Japão... Como é mesmo
o nome? Aquilo que aconteceu em Fufugima? ... O Katrina! ...
Não! O tsunami! Pois bem, nem o tsunami Katrina, que aconteceu no
Japão, mais especificamente na fronteira com a Ucrânia, conseguiu
romper nossa comunicação com a Europa. - pausa para reflexão
– Claro, que eu sei que o Japão não fica mais na Europa. Ele
passou a pertencer à Asia depois da Segunda Guerra, né? O mundo
todo sabe disso. Mas o que está em debate nesse momento é nossa
importância estratégica na resolução da crise no Oriente
Médio... - prossegue nossa articulada rainha, em uma profusão de
palavras desconexas e desprovidas de sentido, para uma plateia que,
mesmo composta por seus assessores, companheiros e asseclas, não
conseguia conter a estupefação e o tédio. Ao que parecia, essa
turnê a Horário Eleitoral, prometia muito mais que os
tradicionais shows pirotécnicos. Seria quase uma tragicômica peça
de teatro. Sorte do povo, poder se divertir com essa gente que
devia estar construindo o futuro desse reino e desse povo.