sábado, 28 de junho de 2014

FALA SÉRIO! Desabafo de torcedor


  Me perguntaram esses dias,  em tom de provocação com pitadas de tolas e distorcidas ideologias políticas, se eu torcia pelo Brasil. Respondi de pronto, sem pestanejar: sempre torci pelo Brasil. Mas a resposta, que para mim é clara e cristalina, ao meu interlocutor pareceu não ter caído com o devido grau de entendimento. Por isso, resolvi esmiuçar mais o assunto. Não me recordo, de um dia sequer em minha vida em que não tivesse torcido pelo Brasil. Lembro perfeitamente, de meu entusiasmo de criança, torcendo em frente a nossa novíssima televisão a cores, pela seleção de 1982, de Sócrates, Zico e Falcão. Com toda certeza meu primeiro momento de verdadeiro ufanismo. Seguido de decepção e frustração. Recordo o sentimento de injustiça por não termos alcançado o título, que em minha visão de criança era mais do que merecido. Hoje, adulta, consigo entender - com certo rancor infantil é verdade - que a arte e a beleza tenha perdido para técnica, a objetividade e a eficiência. A falta de objetividade, técnica e eficiência parecem ser pragas que corroem as entranhas de nosso país até os dias atuais. E já se vão muitas décadas desde então.
     Se torço pelo Brasil? Jamais deixei de torcer, desde aquela triste Copa do Mundo perdida. Torço pelo meu país quando me revolto e solto meus parcos gritos de desaforo contra os corruptos que se apropriam imoral e indevidamente do que é nosso. Torço pelo Brasil quando me indigno com a imoralidade e promiscuidade reinantes no meio político-partidário. Torço pelo Brasil quando faço eco a todas as vozes que denunciam as sórdidas tentativas de amordaçar a imprensa, aparelhar o Judiciário e manipular as massas. Torço pelo Brasil quando me revolto com o assassinato diário do ensino público, que tem jogado jovens na eterna condição de subserviência e servidão a um estado tutor que não pretende que seus filhos voem dos ninhos da submissão e sejam, enfim, cidadãos de fato e de direito, senhores de seus destinos e suas escolhas. Torço pelo Brasil quando luto por um sistema de saúde pública gratuito, integral e equânime, não apenas em artigos e parágrafos de leis de mais de 20 anos, mas na realidade diária de seus usuários e contribuintes. Torço por meu país quando esperneio por não ter disponível um exame diagnóstico básico e necessário no sistema público de saúde brasileiro. Torço pelo Brasil quando compro brigas que não são minhas, mas são brigas justas, éticas e dignas de serem lutadas. Torço pelo Brasil quando escuto políticos inconsequentes, cínicos e incompetentes, jogarem toda a culpa da falta de investimentos públicos no sistema de saúde, nas costas dos profissionais que ali labutam. E mesmo ao ouvir os idiotas bradarem infâmias e insolências, ainda assim - como tantos outros colegas - gritar, questionar, argumentar, me indignar, mas trabalhar – como trabalhamos tantos - em prol daqueles que não tem culpa dos idiotas, pilantras e inconsequentes que governam esse país. 
    Torço pelo Brasil, mesmo quando é mais fácil desistir. Pois é muito mais fácil desistir de um país que há muito parece ter desistido de seu povo. Um Brasil onde o povo é apenas slogans coloridos de campanhas eleitorais ou eleitoreiras ou um alegre jingle promocional da Copa do Mundo. Para torcer verdadeiramente pelo Brasil, há que se ter mais que patriotismo. Há que se ter cerne, honra e coragem. Há que se colocar, todo o dia, a cara tapa. É saber apanhar, mesmo sem merecer, e bater sem medo de errar. É aceitar as consequências de ser chamado de antipatriota, golpista, burguês ou elitista por questionar o que é inegavelmente imoral ou injusto. Torcer pelo Brasil não é para qualquer brasileiro. É qualidade apenas daqueles que valorizam e verdadeiramente amam seu país. Torcer pela seleção brasileira qualquer um pode torcer. Mas torcer realmente pelo Brasil, é para poucos. Poucos que têm e reconhecem os valores que não se aprendem em jingles ou campanhas promocionais. Quem ama realmente o Brasil não veste verde e amarelo apenas em dias de jogos da seleção brasileira. Mas veste-se de ira, questionamentos e indignação todos os dias de sua vida. Assim se faz uma Nação decente e justa. Uma torcida barulhenta talvez faça um time campeão. Toda uma Nação consciente, fará, com certeza, um país decente algum dia. Por acreditar nisso, ainda torço pelo Brasil  - como tantos que ainda torcem e acreditam. E por todos nós brasileiros. E, pelos próximos dias, torço por nossa seleção e seu futebol, também. Que sejamos todos nós campeões!

2 comentários:

  1. Coluna muito bem escrita. Crítica contundente, porém procedente, da forma de pensar de muitos brasileiros. A seu exemplo também torço pelo Brasil. Por um Brasil que acredita, que sonha, que sofre e que não entende como as decisões políticas são tomadas, algumas frontalmente contrárias ao que sempre pregaram os detentores do poder. Siga em frente, acredite, lute, não desanime. É possível sim a construção de uma sociedade mais consciente desde que cada cidadão seja responsável por seus atos e que o Estado deixe de tutelá-lo como se incapaz fosse. O nosso voto tem o poder da mudança. Ouse, lute, acredite, é possível. Como diria Simone: desesperar jamais.............................. desistir......................jamais.

    ResponderExcluir
  2. Poliana, vc atingiu o âmago de todos quantos amam este País. Junto-me a esse seu pensamento como milhões de brasileiros. Precisamos, mesmo que estejamos desiludidos (ás vezes) torcer pelo Brasil. Um dia chegaremos lá.

    ResponderExcluir

Havendo dificuldades na postagem dos comentários, o campo URL poderá ser deixado em branco.