quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Limpando a casa


Na calada da noite, a pouca luz de lanternas, o grupo se movia desengonçado pelo castelo. Alguns caminhavam encurvados pelo árduo trabalho das últimas horas. No comando da operação: ela! A incansável e inquestionavelmente audaciosa e descarada, Poliana.
- Fica quieto! Baixa mais essas calças! - ordena a rainha, impaciente.
- Ai, Poliana! Isso tá gelado!
- Coloca essas xícaras, aí dentro! E os pires também! Não vai quebrar nada, hein!
- Mas tá difícil de ajeitar tudo isso aí, alteza.
- Quem manda usar cueca tão justinha! Mete tudo nessa coisa. Vai ter que caber.
- Eu tô tentando. Tem paciência, rainha. - resmunga o assessor real, rebolando um pouco para acomodar o desconfortável volume.
- E você aí, companheiro, enrola aquele tapete ali. – continua sua majestade, como sempre no comando da situação.
- É pra tirar as cortinas da sala real também, Poliana? – pergunta um dos pajens.
- Claro! Vamos levar tudo que conseguirmos. Encham os bolsos, meias e cuecas. O que não couber engulam! Depois arrumamos uma forma de recuperar.
- Mas Poliana, não precisamos nos apressar tanto assim. Ainda temos muito tempo pela frente. - argumenta um dos bobos da corte.
- Eu não vou arriscar! Vai que aquela mocoronga recalcada da Justiça resolve me expulsar daqui? Vamos pegar tudo que der. Não deixe pra amanhã o que você pode levar hoje. Esse é nosso lema, esse é meu jeito de governar. Vamos adiante! Temos muita coisa pra carregar! Embrulhem aquela foto área do reino. E não esqueçam os lustres do salão real.
- Mas esses lustres são muito pesados, alteza. - choraminga um dos bobos, como de praxe, não muito afeito ao trabalho.
- Não interessa, se virem! Rápido e sem barulho. Temos de sair logo daqui e sem chamar atenção. Já temos muitos holofotes sob nossos pecados. Cuidado para descer as escadas. Não quero nada quebrado. E não esqueçam o trono também.  Esse é meu!
Enquanto o seleto grupo de bobos e pajens da rainha, companheiros inseparáveis das locupletações reais, acomodava todo o material coletado as pressas em seus veículos, Poliana olhava desiludida para fora. O olhar tristonho e resignado de sua alteza trouxe uma áura de solidariedade e comoção aos sempre alegre e confiantes seguidores. Algumas lágrimas sentidas umedeciam os adoráveis e cândidos olhinhos de biscuit.
- Não chore rainha. As coisas não vão ficar assim, você vai ver. Nós vamos conseguir contornar essa situação e você vai poder continuar no seu castelo de ilusão e logro por muito tempo ainda. – consola um fiel companheiro, emocionado.
- Eu sei. - afirma Poliana, com voz embargada. - O que mais me dói no peito é ter de deixar para trás minha bandeira.
- Mas você não precisa abandonar a grandiosa bandeira de nosso clã, rainha! Essa magnífica bandeira escarlate já nos proporcionou tantos anos de mordomias e vida fácil e ainda tem muito a nos presentear. Nós continuaremos alinhados aos nossos ídolos mensaleiros. Não deixe que uma Justiça moralista acabe com seu ideal de enriquecimento fácil, Poliana. – suplica o companheiro preocupado.
Olhando firmemente para seu assessor, pensando por um minuto em como é que conseguira cercar-se por tanto tempo por gente tão estúpida, Poliana responde com seu conhecido timbre esganiçado: - Que porcaria de bandeira vermelha, que nada! Desse tipo eu tenho centenas na minha casa, seu molóide! Nem sei onde vou enfiar tanta taquara! - reclama, baixando a voz para não chamar atenção - Eu estou chorando por aquela bandeira enorme da praça em frente ao castelo. É muito grande, seu inútil. Não vai dar para levar! Eu planejava forrar minhas almofadas com ela. Agora não vai dar tempo de pegá-la. - conclui a rainha, fazendo beicinho.
- Ah, bom. - suspira um dos presentes - Aquela coisa verde e amarela, cafona e inútil. Eu particularmente acho que não vale nada, Poliana, mas se você quer... Não se preocupe. Depois que nós engambelarmos Justiça por mais alguns meses, você vai poder pôr a mão na bandeira também. Vai poder levar até o mastro, que é bem maior que suas taquaras. Nada é grande de mais para nós. - afirma outro companheiro conduzindo discretamente sua majestade para fora.
- Vocês prometem? - indaga a rainha, novamente assanhadinha.
- Claro! Vai ser fácil, fácil. Como lavar dinheiro ou favorecer os aliados. - acrescenta maroto e convicto outro membro da corte.
- E eu vou poder pegar o chafariz, também? E aqueles semáforos novos? - pergunta a rainha eufórica. -  Eu sempre quis aquele casebre caindo aos pedaços do outro lado da praça. Aquela porcaria vai dar muita lenha pras churrascadas de nosso clã. - empolga-se Poliana, como criança gulosa e afoita.
- Sem problemas, Poliana! Pode deixar com sua companheirada. Nós decepcionamos o povão, mas jamais faríamos isso com você, rainha. Em pouco tempo você vai poder levar desse reino, tudo quiser. Vamos fazer uma limpa. Palavra de companheiro! Só precisamos de algumas semaninhas... E você aí parceiro! Ajeita essa cueca e vamos adiante!
O seleto grupo, escolhido a dedo por Poliana, seguia seu rumo, alegre e festivo como sempre. Nada intimidava a Poliana e sua trupe. Essas ilustres estrelas prometiam pairar reluzentes e robustas, acima das leis e da honra. Ninguém, nesse reino tão pequeno, seria capaz de por fim a ânsia avassaladora por poder e enriquecimento desse grupo tão coeso e obstinado. No caminho de Poliana só havia duas pedras: o povo e a Justiça. Poliana, astuta e ardilosa, confiava cegamente na capacidade ímpar de seus companheiros em iludir e ludibriar a esses dois insignificantes atores.

Um comentário:

  1. Locupletar-se com o erário já é muito vergonhoso e covarde, coisa de gente desmoralizada, escandalos publicamente vindos ao conhecimento público através da mídia, colacaram a nossa cidade de Erechim como terra de "gente sem vergonha na cara", palavras de Um Gaúcho nascido em Erechim e resisdente em Mato Grosso, em outros Estados Gaúchos acompanham estarrecidos. Outro gaucho comentou: e depois "....." que é terra de jagunço e curral eleitoral... Por aqui (lá no norte do Brasil) as eleições estão muito mais civilizadas... Vergonha geral, a "cagada" destas autoridades???? (s/autoridade, s/moral, s/ética, etc. ...), já ultrapassou as fronteiras. Será que o povo Erechinense é tão "inocente" para eleger por mais quatro anos esses vergonhosos vermelhinhos. Ou muitos são inocentes úteis (cabrestiados) ou culpados ...

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