- Eu não sei por que tanto falatório e polêmica no reino por
causa do emprestimozinho que nós fizemos. – critica um companheiro revoltado.
- Essa colonada não gosta de se endividar. É um povinho meio
tosco, não tem nossa visão empreendedora. – completa um membro da
FarsaSindical.
- Tanto alarido por uma soma tão pequena. Essa gente não tem
qualquer noção de dinheiro. – reforça sua alteza, lixando calmamente as unhas. –
O que são 15 milhões, afinal? Uma ninharia dessas, eu guardo em casa. Detesto ter de ir ao banco. - completa com ar de enfado.
- E um pouco desse dinheiro nós vamos transferir para nosso
FARC (Fundo de Apoio e Remuneração da Companheirada), não é mesmo?
- Não vai ser fácil dessa vez. É dinheiro quente. Vem através
de transações bancárias. Fundo a fundo. Nada de fundilhos e meias na
intermediação do processo. – lamenta outro companheiro.
- Isso não é problema para nós, seu bobo. Não se esqueça que
eu, além de pós-graduada em ilusão de ética, sou perita em manipulação de
contas e transposição de fundos de garantia. Modéstia a parte, naturalmente. –
exibi-se Poliana, com o nariz empinadinho.
- Isso todo mundo sabe, rainha. Você é uma verdadeira lenda viva
no sistema financeiro e de financiamentos. – elogia um dos aliados.
- Mas em que nós vamos investir esse dinheiro do reino,
afinal? – questiona Poliana a sua seleta corte.
- Em um inovador e inédito projeto de revitalização da
pavimentação asfáltica e reformulação da malha viária que garantirá um
democrático e inclusivo programa de mobilidade urbana e trafegabilidade cidadã.
– esclarece, de um só fôlego, o bobo das obras de ficção da rainha.
- Credo! Se tem uma coisa que eu detesto é essa mania do
nosso clã de usar cinqüenta palavras para dizer o que apenas uma bastaria. Em
resumo: tapa-buracos! – conclui a sempre pragmática Poliana.
- Também não precisa sintetizar tanto, rainha! – queixa-se o
bobo, constrangido.
- Só para ver se entendi. Nós fizemos um empréstimo de 15
milhões, que o povo vai terminar de pagar em 24 anos, para tapar buracos no
asfalto, recapear algumas ruas e asfaltar outras poucas, é isso?
- Isso, mesmo.
- Tendo em vista que o tempo de vida útil do asfalto deve
girar em torno de cinco anos, quando terminarmos de pagar a conta e os juros, o
reino já vai ter voltado à era do chão batido, não é mesmo?
- Mais ou menos, alteza. – responde um dos bobos, já temendo
as duras críticas da rainha.
- Brilhante idéia! Não sei como eu não tinha pensado nisso
antes. Vocês estão de parabéns companheirada! – exclama Poliana, satisfeita.
- Você está falando sério, Poliana? – pergunta um dos
companheiros, desconfiado.
- Claro! – responde a rainha, consultando detidamente seu
tablet. – Eu só preciso saber se as Organizações Poliana e a Laranja
Empreendimentos, já possuem ramificações no ramo de asfalto também. Vocês
lembram se nosso clã tem algum rolo nessa área?
- Não estou lembrado, rainha. Nós temos vários no trânsito,
isso sim. Rodízio de dinheiro público nos estacionamentos, pardais, furões e
lombadas eletrônicas... Mas asfalto, eu acho que ainda não.
- Vamos consultar meus empreendimentos pessoais. – continua Poliana,
concentrada, correndo o dedo pela tela. – Gráficas e falsas impressões... automóveis...
construção civil... pães e sonhos... sexo e entretenimento...mercado imobiliário...
agronegócio... óleos e farelos... Papel higiênico e Pet shop?! Nem sabia desses
aqui. – espanta-se a rainha. – É, acho que as Organizações Poliana não
investiram, ainda, em asfalto e usinagem. É hora de diversificar meu ramo de
atuação. – afirma Poliana, decidida.
- E como você vai fazer isso, alteza? Vai pegar um empréstimo
bancário?
- Empréstimo?! Tá louco?! Com os juros do jeito que estão?! E
eu lá sou mulher de me endividar, seu estúpido. Eu pago tudo a vista. E em
dinheiro. Empréstimo eu sempre fiz com o dinheiro dos outros. Atualmente, com o
dinheiro do povo, é claro. – esclarece Poliana, erguendo-se decida. – Agora, se
vocês me dão licença eu preciso encontrar o Zé.
- O Zé?! Dirceu?!
- Não. Um Zé ninguém. Mais um novo sócio para a Laranja
Empreendimentos. O Zé Dirceu é só um Mané perto da ardilosa e empreendedora,
Poliana! – conclui a matreira rainha, piscando maliciosamente o olho para seus
companheiros de empréstimos e locupletações coletivas.
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