domingo, 22 de maio de 2011

O Cale-se de Poliana


No amplo salão real o seleto grupo de estrelas se aglomerava em frente a porta fechada. Alguns andavam impacientes e preocupados com o difícil momento por que passavam. Pequenos grupos cochichavam nos cantos. Alguns pajens de Poliana choravam inconsoláveis em suas poltronas. Nunca haviam visto sua alteza assim tão enfurecida. A situação era realmente desesperadora, catastrófica até. Seria necessária muita lábia para acalmar a temperamental rainha. Nesse momento chega ao recinto, esbaforido, o mestre de cerimônias de Poliana, Líquen, o amorfo.
- Afinal, o que está havendo?
- Nossa majestade enlouqueceu! Trancou-se na sua bolha e disse que de lá não sai. Já tentamos de tudo, ela está irredutível. – relata angustiado um de seus pajens, enxugando os restos do café da manhã que a irascível rainha a pouco entornara sobre sua cabeça.
- Puro chilique, resmunga Basco, o raivoso. Por Lenin! Como se a gente não tivesse mais nada pra fazer do que ficar aqui aturando a TPM da rainha!
- Não é bem assim, Basco – intervém preocupado um dos companheiros de clã – Com a barulheira que ela tá fazendo, logo, logo, vai chamar a atenção de Imprensa Livre.
- É isso mesmo - reforça um membro do SINDIPelego – Com essa gritaria toda, e quebrando toda a louça do castelo, daqui a pouco até Oposição que é meio surda e debilóide vai se dar conta que algo esta acontecendo por aqui.
- Eu disse pra vocês não contrariarem a rainha! Vocês sabem como ela reage quando as coisas não saem como ela quer! O que aconteceu dessa vez? Foi o condicionador de cabelos? Não era de macadâmia e ceramidas?Ou vocês erraram a cor do traje real? Nas segundas ela sempre usa azul calcinha. Não vai me dizer que vocês esqueceram o adoçante de stévia novamente!
- Não, não foi nada disso. Acho que é mais sério dessa vez. É melhor você falar com ela.
Contrafeito, Líquen se aproxima da enorme porta, respira fundo, bate e pede com sua conhecida voz de comando: - Abre a porta Poliana! Já chega dessas bobagens. Temos muitos compromissos hoje. Você já está atrasada para inauguração de mais uma boca de lobo na periferia. Estão todos lá, ansiosos por sua presença - aguarda alguns segundos e não havendo resposta, continua um pouco mais rígido: - Abre essa porta Poliana!
Do interior do aposento veio o característico som de objeto colidindo com a porta, seguida da voz, um tanto esganiçada de sua majestade gritando: - Não abro! Não abro! Não abro! Já estou farta de vocês, seus inúteis!
Vendo que precisava mudar a tática, Líquen suavizou o tom da voz: - Mas o que houve Poliana? Nós somos todos seus companheiros de clã. Estamos aqui para lhe servir e para nos servir do que pudermos enquanto conseguirmos, não foi assim que combinamos?
- Vocês mentiram pra mim! Não fazem o que eu mando! São insubordinados!
- Pelo amor de Deus, não grita Poliana! Você vai chamar atenção de todo o reino! – implora um de seus bobos da corte antevendo um novo tsunami midiático. – Nós fazemos tudo que nossa grande rainha quiser! Qualquer coisa! Mas por favor, sem escândalos!
- Isso mesmo Poliana, você quer que eu lhe faça um pouco daquela ambrosia que você tanto gosta? – pergunta com meiguice o presidente do CUT (Companheiros Unidos no Trambique). Ou quem sabe o companheiro Basco pode lhe fazer uma massagem nos pés?
- Sem essa! - rosna Basco indignado.
- Em nome do clã e do ideal socialista vê se colabora Basco! – murmura Líquem, entre dentes. - O que você quer afinal Poliana?
Após infindáveis segundos de apreensão ouve-se a inconfundível voz a declarar: - Eu quero que vocês calem Imprensa Livre! Coloquem mordaças naquela velha decrépita. Devolvam a desgraçada pra masmorra de onde nunca devia ter saído! Só isso. Simples assim, mas nem isso vocês conseguem fazer!!! - berra novamente a indignada rainha.
Aturdidos, os sempre hábeis enroladores reais levaram muitos minutos para recuperarem a fala. Mesmo para eles, acostumados a pregar a democracia enquanto idolatravam o autoritarismo, era constrangedor pensar na forma prática de executar tal ação. Foi Líquen, cada vez mais amorfo, que assumiu a liderança nas negociações.
- Não é tão simples assim Poliana. Você tem que ter paciência? Há anos nosso clã vem tentando calar Imprensa Livre. Mas existe a tal da Democracia, que também vive e é jovem ainda. Não se pode simplesmente prender Imprensa Livre, por mais que se queira.
- Nós podemos comprá-la, ora bolas! Já compramos tantos outros. Vocês é que não se esforçam!
- Nem todos se vendem por dinheiro, Poliana. Por incrível que pareça tem gente que acredita naquelas balelas que se ensinava antigamente nas escolas, lembra? Aquelas bobagens de moral e ética? – esclarece um intelectualizado catedrático do clã. – Graças a nós, em poucos anos ninguém mais vai saber que essas coisas obsoletas um dia existiram. Estamos nos dedicando tanto, pra que isso ocorra.
- Se não querem dinheiro seus tontos, ofereçam outras coisas: carguinhos, pedras, pardais, impressoras, papel higiênico... qualquer coisa! - brada a soberana, cada vez mais absoluta em suas convicções.
Reunidos em um canto, em uma incomum assembléia, todos os membros do clã, entre sussurros confabulavam. Com suas impressionantes interpretações dos ensinamentos de Karl Marx, concluíram: Mais Valia as cuecas cheias de propinas, do que as consciências repletas de boas, mas pouco lucrativas intenções. Assim o satisfeito grupo, representado por Líquen, informa sua posição a sua digníssima representante.
- Está certo Poliana, nós vamos dar um jeitinho. Pode ficar tranqüila. Mas tenha um pouquinho mais de paciência. Não podemos fazer as coisas as claras. Temos que esperar escurecer. Na calada da noite, todos os ratos são o que são: apenas ratos. E todos são como nós, sujos. Assim poderemos resolver a situação sem que nos identifiquem pelo cheiro. Mas não podemos ser afoitos. Enquanto isso, você não quer nada para lhe entreter? Um cafuné, talvez?
A porta se abre lentamente, sob suspiros de alívio da platéia que esperava aflita do lado de fora, Poliana surge grandiosa e altiva, como sempre. – Tem mais uma coisinha sim.
- O que deseja nossa grandiosa majestade? – questiona Líquen, com uma reverência.
- Eu soube que zombaram de mim. Que riram e fizeram piadas a meu respeito dentro do MEU castelo! Caçoaram da rainha! De hoje em diante eu decreto que seja punido com a decapitação todo aquele que ousar rir de sua majestade!
- Não vai sobrar ninguém no reino – resmunga baixinho Basco, sendo cutucado por um ressabiado pajem real.
- E para aquele que semeou o riso e a piada sobre sua digna, inteligente, magnânima e ponderada soberana, eu quero apenas e tão somente que: Cortem a cabeça! Cortem a cabeça! – decide Poliana, a democrata ponderada.
Assim fora decretado. E dessa forma cabeças rolaram no fabuloso reino de Poliana. Quanto aos ratos? Esses, como sempre, andam na surdina, a se infiltrar nos esgotos e latrinas, em busca de uma brecha na decência onde possam penetrar e se proliferar, roendo lenta e imperceptivelmente os alicerces do reino.

2 comentários:

  1. É a vida real do governo polis&ana e quem paga é o povo. Mais um poco e vc será apontada como o anônimo jorge que manda e mail pro jornal boavista e todo o mundo sabe que é mais uma armadilha para tirar a atenção do que anda acontecendo no castelo municipal. Os ratos do esgoto tentam passar despercebidos

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  2. Hahahahah, vc e incrível, larga a medicina, escreve um livro e vais ficar famosa, talvez ate vire filme assistido por multidões. Há, da um credito a oposição ela e meio solitária, faz o que pode. De qualquer forma, vc e dez.

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