Poliana sentia-se exilada. Quase
tanto quanto sentira-se no curto período em que, por perseguição de Justiça,
fora injustamente afastada do trono. Felizmente, Justiça, aquela velha
caquética, esquecera de Poliana e sua turma nos últimos tempos. Méritos da
monarca e sua corte, que aprenderam com os diversos puxões de orelha e já não
se atiravam feito porcos em lavagem em qualquer migalha de dinheiro público.
Passaram a ser discretos, ao menos. Afinal, nem todos os feitos de sua alteza
precisam chegar aos ouvidos de Imprensa Livre.
Desta vez o isolamento de Poliana
era de próprio arbítrio. A nova missão da rainha seria garantir a sucessão do
trono para os seus. Tarefa que parecia fácil, agora. A maior preocupação de
Poliana era que a companheirada não aceitasse o papel de estrelas de segunda
grandeza. Temor que, por obra de seus companheiros, não se justificava mais.
Atolado em escândalos de corrupção por toda vastidão de Gigante Adormecido, o
clã estrelado contentava-se com qualquer naquinho de poder que ainda
conseguisse manter. Para contentamento de Poliana, que inquietara-se com a
possibilidade de ter de bancar, novamente, Golesminha para o trono. O passado
de Golesminha como o conhecido radical da seita vermelha, Golesma Bonder, seria
uma pedra no sapato da monarca em época de nacionalismo e moralismo exacerbados.
Entupir fechaduras de empresas com supercola não era visto com bons olhos em
tempos de crise e desemprego. Para sorte de Poliana a retórica cansativa de
golpe não vingara por essas bandas, e a companheirada aceitara servil e
interesseiramente apoiar uma representante da Irmandade do Fogo na disputa em
Horário Eleitoral.
A exemplo do messias do grande
clã estrelado, o Ilusionista, duas vezes rei de Gigante Adormecido e que
conseguira a façanha de emplacar um poste como sucessora, Poliana também fizera
uma difícil escolha. Entre o maior ângulo entre duas retas concorrentes,
optara, como seus conhecimentos de matemática exigiam, por ela: Obtusa - a
virginal. Uma doce, meiga e carismática escolha, apesar de um tantinho limitada
de raciocínio – reflete Poliana, com um meio sorriso de satisfação. A
vaidade de Poliana não permitia que apoiasse alguém que pudesse lhe fazer
sombra algum dia. Desta forma, Obtusa era a escolha perfeita. E com a ajuda
inesperada de Oposição, que prometia dormir até o final da disputa, Poliana
pretendia fazer facilmente sua sucessora. Mais fácil que isso, só roubar doces
de crianças, ou arrecadar propinas de grandes empreiteiras, assim aprendera com
seus companheiros. E para promover sua escolhida, Poliana optara por ocupar o
plano de fundo. Todos os holofotes - e photoshop - estavam há meses focados em
sua, de Poliana, criatura. Por enquanto, a estratégia estava dando certo. A virginal
Obtusa posava muito bem para as fotos. Não tanto quanto a dinâmica e adorada Poliana,
é claro! – retrucava a, ainda rainha, empinando o orgulhoso nariz com despeito.
“Com photoshop até porongo tem conteúdo. Quero ver minha escolhida argumentando
e debatendo em Horário Eleitoral!” – irrita-se a, já um tantinho rancorosa e
enciumada, monarca. Tomara que a fala mansa e os discursos populistas e
fantasiosos; abraçar velhinhos e beijar crianças mijadas continuem sendo a
moeda preferida pelo povo. Pelo visto, ainda eram. Sorte de Poliana e de suas
acertadas escolhas. Sorte ainda maior a de Oposição, que teria sempre as
melhores justificativas para eternamente hibernar. A sorte cai sobre esse reino
mais do que chuva e granizo. Só alguns poucos não conseguem enxergar tamanha
ventura. Azar o deles, retruca Poliana - a rainha das boas e convenientes escolhas.
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