O reino de Poliana era mesmo um lugar deveras pitoresco. Repleto de
obras que, se não eram faraônicas na magnitude, ganhavam ares e
pompa de grandes realizações nas propagandas oficiais. É bem verdade que
atualmente até a vasta e cara assessoria de marketing de sua alteza
já andava cansada de anunciar há anos os mesmos e mofados feitos,
eternamente não concluídos. O mote do reinado de nossa rainha
parecia ser o seguinte: não concluir para sempre ter o que divulgar.
E assim o tempo corria e o tapume que cercava o pequeno castelo
histórico já virara monumento oficial e se incorporara a imagem e
ao dia dia do reino, como os buracos no asfalto. Ambos, é claro, não
apareciam nos novos banners ou antigos cartazzes.
O cercamento do velho mato, então, demonstrara ser uma obra de
complexidade descomunal. Pelo ritmo que andava, prometia demorar mais
que a construção da pirâmide de Queóps. Para desgraça da equipe
de mídia e pirotecnia, que precisava se esforçar para conseguir
ângulos diferentes do único lado do muro com alguns metros
conclusos e em lento andamento há mais de um ano. Mas estava ficando
uma belezura, vangloriava-se Poliana, com seu inseparável óculos
cor de rosa.
E se, por um lado, as chuvas desesperavam Poliana pelo surgimento
desordenado dos malfadados buracos no asfalto, por outro, eram uma
dádiva dos céus, pois faziam seu povo esquecer outra de suas
propaladas obras megalomaníacas, a transposição picareta. Tomara,
rezava nossa monarca, que as chuvas não a abandonassem nos próximos
meses. A estiagem faria seu povo lembrar daquele enjambre ridículo
que Poliana e sua corte venderam com muito estardalhaço e confete anos atrás. Uma
gambiarra tão grotesca que seria cômica, não fosse vergonhosa.
Mas não para Poliana, a rainha do descaramento pago com dinheiro
público, e para quem tudo é permitido desde que saia bonito na
foto.
E se circular pelas ruas do reino era uma prova digna das estradas
do rally, estacionar era o mais perfeito exercício de paciência e
perseverança. Mas tudo estaria plenamente resolvido com mais uma
anunciadíssima mega produção de nossa alteza: o anel viário. Não
havia uma só alma de contribuinte, comerciante e motorista
desesperado que não tivesse ouvido uma centena de vezes o anúncio
do tal miraculoso anel, capaz de solucionar todos os problemas de
trafegabilidade e estacionamento do reino. Os súditos da rainha, um
tanto incultos, não entendiam bem do que se tratava. Os bobos de sua
alteza, ao que parecia, também não. O povão ignorante já
acreditava que o tal anel seria algum projeto extraterrestre que
abduziria os veículos na hora do rush, tal a propaganda dos milagres
da tão demorada obra. Talvez fosse por isso que da noite para o dia
cada vez surgiam mais e mais riscos brancos no asfalto do reino,
pensava o povo. Alguma utilidade deveriam ter aquelas porcarias, além
de reduzirem ainda mais as escassas vagas de estacionamento, acredita
o contribuinte. Deviam ser sinais para os alienígenas, conclui o
povão, cada vez mais confiante de que a solução para seu reino só
poderia mesmo vir de outro planeta, pois da rainha e dos bobos dessa
terrinha, só se colhe promessas, propaganda enganosa e anos e anos de espera.