Poliana já estava desgastada de tanto ouvir reclamações. Não
bastassem as críticas infames de Imprensa Livre (atualmente bem mais adestrada
e domesticada), até seus bobos da corte davam de reclamar dos tais buracos no
asfalto, quase um slogan do democrático e participativo reinado de sua
alteza. A monarca encontrava-se
entediada com as mesmas cansativas queixas e lamúrias em quase cinco anos de
reinado. Será que a elite golpista do reino não daria tréguas a rainha?
Para contentar os golpistas e silenciar a já moribunda
Oposição, Poliana iria gastar um pouco dos recursos dos contribuintes para
cobrir algumas crateras no asfalto e calar de vez as bocas maledicentes dos
motoristas.
- Vamos colocar nos próximos dias mais um vultoso projeto de
revitalização inclusiva e cidadã da pavimentação asfáltica da malha viária da
região central do reino. – anuncia sua alteza, determinada.
- Graças a Deus, rainha! Não temos mais desculpas
esfarrapadas pra tirar da manga e justificar quase cinco anos de negligência
com o centro do reino. – suspira aliviado um representante dos movimentos
sociais.
- Que brilhante idéia Poliana! O povo clama há anos por
melhorias nas ruas do reino! – exulta outro bobo da corte.
- Ainda bem que você, Poliana, enfim conseguiu enxergar a
situação precária de nossas ruas e avenidas. Tem lugar onde os buracos estão brigando
um com o outro em busca de espaço! – opina um companheiro de clã.
- É a pura verdade rainha! Tem buraco engolindo buraco e
bueiro se escondendo de medo de ser aniquilado nessa guerra desleal! – desabafa
o bobo das obras no reino.
- Na minha rua já tem árvore crescendo nas crateras no meio
da rua e as lombadas parecem valetas elevadas, pois é um buraco ao lado do
outro. – acrescenta outro servo.
- Muito bem! Para acabar com tanta choradeira burguesa e
elitista, estarei nos próximos dias, iniciando a primeira etapa da reformulação
da pavimentação asfáltica para os burguesinhos desocupados e mimados do centro
do reino!
- Bem dita seja voz alteza! E por onde começaremos o
recapeamento?
- Pela avenida central, é claro! – declara Poliana, convicta
e decidida.
- A avenida central? Ela não está lá grande coisa, mas as
paralelas e perpendiculares estão em situação muito mais precária, rainha? –
questiona um dos pajens.
- É verdade Poliana, tem ruas do centro muito mais
necessitadas que a avenida central! – argumenta o bobo das obras públicas.
- As outras estão em estado deplorável! É uma buraqueira
danada. A empresa que ganhou a concorrência para fazer o serviço, nossa
parceira e amiga, teria de gastar muito asfalto para colocar aquele caos nos
eixos. Seria muito gasto e pouco lucro com o dinheiro público. Por isso
começaremos onde menos buracos existem. – replica a sempre coerente rainha.
- Mas Poliana, será essa uma boa estratégia?- questiona o preocupado
marqueteiro real.
- Claro que sim, seu estúpido! Daremos recapeamento aos que
menos precisam, mas onde a visibilidade é maior! Nossos amigos gastarão menos
asfalto e nós gastaremos fortunas em marketing e mídia. Para cada buraco mal
coberto espalharemos dezenas de banners e inserções em Imprensa Livre. Nossos
súditos, cooptados e iludidos com tanta propaganda e marketing, se sentirão felizes
e satisfeitos com um pouco de piche e pó de brita. E nós ganharemos
popularidade e notoriedade. Essa é a eterna lógica do populismo, hoje, ontem e
sempre. Como tão bem nos ensinou o eterno mestre Hugo! O povo, que paga a
conta, se alimenta de ilusões e farelo de asfalto, nós, enriquecemos com os
intermináveis recursos públicos e com os agradecidos votos de nossa eternamente
maleável massa amorfa de súditos trabalhadores, simplórios e eternamente
crédulos. – esclarece Poliana, soberana absoluta da neo democracia caudilhista.
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