No centro do salão real, Poliana e seus bobos da corte
pulavam abraçados como um grande time que comemora a conquista do campeonato.
Alguns serviçais do reino paravam para admirar o festival de confetes e purpurina
que jorrava abundantemente sobre o seleto grupo. Poucos estavam entendendo o
motivo da comemoração. Teria Poliana finalmente vencido a famigerada Justiça?
Não devia ser este o caso. Não havia bandeiras. Só alvoroço, brilho e cortina
de fumaça. Deviam estar inaugurando algum banheiro público, concluíam os mais
maledicentes e invejosos críticos de sua alteza. No centro do grupo, a capitã
do time, Poliana, também não estava entendendo nada. Sua assessoria de
marketing e ilusionismo mandara que saltasse, sorrisse e exultasse, e ela,
quase uma pop star, obedecia. Concluídas as intermináveis sessões de fotos e
pose para Imprensa Livre, a rainha resolve se inteirar dos fatos.
- Será que agora, algum de vocês poderia me explicar o que
diabos estamos festejando afinal? – indaga a rainha aos seus bobos.
- Nós estivemos em comitiva na sede do poder central Poliana
e trouxemos milhões! Milhões! – informa um assessor satisfeito.
- Sério?! - surpreende-se sua alteza – Milhões?! – questiona
Poliana olhando discreta e constrangidamente para baixo e calculando
mentalmente o volume monetário. – E coube tudo nas cuecas? – continua,
assombrada.
- Não, magnânima! O dinheiro ainda não veio. – responde outro
companheiro rapidamente.
- Ah, bom. Mas de qualquer forma, vocês não acham um pouco de
exagero nós comemorarmos essas nossas transaçõezinhas na frente de todo reino.
Nós sempre fomos bastante ousados, mas isso eu acho demais até para o
distorcido código de ética de nosso clã. – continua a rainha olhando preocupada
para os lados.
- Você não entendeu Poliana. É dinheiro limpo. Para
investimentos no reino. – esclarece um dos bobos.
- Para o reino, é? – compreende sua alteza, sem esconder a
decepção. – Era bom demais para ser verdade. - suspira – Bem, pelo menos assim teremos
algo para colocar em nossos vistosos cartazzes.
- É uma maravilha, rainha! Chama-se alinhamento! Nunca antes
na história desse reino alguém conseguiu uma façanha dessas. Nós ganhamos 15
milhões da Rainha Mãe! Tudo graças, é claro, a nossa magnífica capacidade de
convencimento e ao imbatível e invejável alinhamento fisiológico. – exulta um
dos companheiros.
- Isso é mesmo inédito. – confirma a alteza – Nada como ser
alinhada com a Rainha Mãe. Só nosso clã consegue um feito desses. Tanto
dinheiro assim, a fundo perdido. Oposição vai se revirar no sarcófago de
inveja.
-Na verdade, magnânima, não é bem a fundo perdido. – começa a
explicar, um tanto ruborizado, o bobo das finanças. – Nós vamos ter de
devolver. Mas em suaves prestaçõezinhas a perder de vista. – apressa-se em
esclarecer.
- Devolver, é? Em prestações? – indaga Poliana, um tanto
confusa – Mas sem juros, não é?
- Com jurinhos modestos. – continua o bobo, cada vez mais
atrapalhado.
- Vamos recapitular, para ver se eu entendi. – começa Poliana
cruzando os braços, no estilo de Horário Eleitoral. - Nós ganhamos um dinheirão graças a enorme influência e inquestionável
alinhamento que temos com a sede do poder central. Só que o dinheiro que nós ganhamos, vamos ter que devolver. E com
juros. É isso?
- Isso mesmo, alteza. – reponde o grupo em uníssono.
- E isso se chama alinhamento? – continua Poliana, apertando
discretamente os adoráveis olhinhos de biscuit e suavizando o tom de voz, em um
prenúncio de crise.
- Isso mesmo, alteza. – responde novamente o grupo.
- Interessante. – reflete a rainha, batendo repetidamente o
salto do sapato no chão. – Sorte minha, e dos contribuintes, podermos contar
com vocês para cuidarem das finanças do reino, não é mesmo? – exclama a rainha
em evidente tom de ironia. – O que vocês, seus molóides, chamam de alinhamento,
qualquer dona de casa sem formação em economia chamaria de endividamento! – grita Poliana para, a agora, encolhida platéia. –
Vocês estão vendo esse lindo sapato que eu estou calçando? Eu também ganhei! Um
presentinho do Christian Dior. Vou terminar de pagar mês que vem. E no cartão
de crédito! Eu sempre fui muito alinhada com o cartão de crédito. E aquele
carro que você, seu bobo, tem na garagem, também foi um presente! Da
financeira, só para você. Exclusividade. Só tem que pagar até 2016! Em suaves
prestações. Uma verdadeira benção! Você e todos os endividados do Minha Caixa, Eterna Dívida, devem erguer
as mãos ao céu e agradecer toda a noite pelo privilégio de serem alinhados com
o sistema financeiro. – grita a indignada rainha.
- Você está sendo injusta, alteza. Nós consultamos um
experiente e graduado consultor estrangeiro indicado por nosso clã. Uma
sumidade no que se trata de entender todas as sutis artimanhas do capitalismo.
O homem garantiu que esse era um negocião. – vangloria-se um dos companheiros.
- Especialista estrangeiro? Artimanhas capitalistas? –
questiona Poliana desconfiada – De onde? De Harvard?
- Não, de Havana.
- Ah, não! – desespera-se a rainha, jogando-se teatralmente
no trono – Com vocês e um economista Cubano me assessorando, eu não vou me
surpreender se ao invés de dinheiro eu receber milhões de rolos de papel
higiênico e sabonetes do mercado negro da ilha! Vocês vão me pagar com juros o
fiasco que vão me fazer passar, seus incompetentes! Imprensa Livre vai
tripudiar de mim! – choraminga – Ainda bem, que tanto aqui, quanto no
democrático socialismo caribenho, quem paga a conta é o povo, não nós. Caso
contrário, eu ia alinhar vocês no paredão! Seus inúteis! Meus sais! Tragam os
meus sais! – berra a rainha para sua sempre atrapalhada corte de vassalos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Havendo dificuldades na postagem dos comentários, o campo URL poderá ser deixado em branco.