sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

O Fim dos Tempos no Velho Reino de Poliana


E um novo reinado se iniciava. O tempo dos tropeços e trapalhadas chegara ao fim. Novos ciclos estavam começando. De a gora em diante tudo seria diferente, profetizavam os oráculos do grande clã de Poliana. E alguns tolos, como sempre, acreditavam.
Se o rei agora era outro, a corte e seus atrapalhados bobos continuavam os mesmos. Alguns súditos com dificuldades em aritmética e lógica, não conseguiam entender como é que se pretendia mudar o curso dos escândalos mantendo-se a mesma máquina torpe e viciada. Coisas de gente sem visão, diria a saudosa Poliana. Para dar certo ar de inovação e dinamismo adotava-se a velha dança das cadeiras, inventada pela sempre criativa Poliana, a rainha caída. Até mesmo os chacoalhões de Justiça seguiam o velho rumo e apontavam a alguns adoráveis bobos o caminho de casa. Tudo estava exatamente onde sempre estivera. Tudo, mas nem todos. Poliana seguia enclausurada em sua torre. Enclausurada sim, mas solitária jamais. Nesse dia, um cortejo de seus antigos bobos rodeava Poliana, quase tão bajuladores quanto nos seus tempos de majestade. Muitos a contragosto, era verdade. A maioria esperava não ter mais de suportar o humor irascível e a arrogância da antiga rainha. Mas a gravidade da situação obrigava a todos a aturar mais um pouco a sempre megalomaníaca Poliana.
Deitada em seu divã cor de rosa, Poliana olhava o grupo com o narizinho cada vez mais arrebitado e o mesmo olhar altivo de quando usava a coroa.
- Tenho de admitir que dessa vez vocês conseguiram se superar meus queridos. – começa com a voz doce. – Nem eu, que conheço e acobertei todas as trapalhadas de vocês nesses últimos anos, acreditei que vocês conseguiriam fazer o que fizeram. Vocês merecem os parabéns!
- Você acha mesmo Polianinha?! Que bom! Você sabe que a última coisa que eu gostaria na vida era desagradar você companheira. – apressa-se o companheiro Golesminha, dando voltas em torno do divã com sua franjinha esvoaçante, todo prestativo e servil, como um Yorkshire que recebeu um agrado.
- Claro companheiro Golesminha. Vocês são, sem dúvida, insuperáveis. – continua Poliana com um timbre irônico – Eu devo agradecer a vocês por provarem a magnífica rainha que eu fui e sempre serei, e que vocês, seus molóides, são uns imprestáveis incapazes de fazer nada sem meu privilegiado cérebro no comando.
- Também não precisa exagerar, nós estamos nos esforçando, só que..
- Idiotas! Estúpidos! Eu fico menos de dez dias longe do trono e vocês conseguiram o impossível. Não só acordaram do coma a moribunda e desarranjada Oposição, como fizeram com que a velha decrépita juntasse todos os membros dormentes e inativos há anos. Tinha membro que não levantava mais nem com Viagra! Agora tá tudo lá, de pé e pronto pra luta! Seus incompetentes! E para arruinar ainda mais esse trágico enredo, vocês conseguiram, não sei como, desarranjar a sempre sólida e coesa Situação! Como é que isso foi acontecer em tão pouco tempo?! Expliquem-se!
- Nós não sabemos bem ao certo o que aconteceu, Polianinha. – começa Golesminha, torcendo as mãos, com o suor escorrendo pela larga testa que a franja tentava esconder – É tudo um esquema armado por Oposição para perseguir esse nosso novo modelo democrático e participativo de reinado e impedir que nós nos mantenhamos no poder por ...
- Chega Golesminha! Guarda essa conversa mole para os palanques. E trate de erguer a cabeça e falar com voz de homem se você pretende ser meu sucessor no trono. Desse jeito você parece mais afeminado que eu. – corta Poliana, sem perder o ar aristocrático e a oportunidade de alfinetar o companheiro de clã e antigo desafeto - Vocês só tinham que negociar carguinhos! Simples assim. Uma boquinha pra um, outra pra outro, até que todo mundo da Situação ficasse contente. O que não dava pra dar agora, prometia para mais tarde. Mais tarde dava um pé na bunda. Esse é o jogo do poder. Mais velho que a mais velha raposa de nosso clã e de todos os clãs desse reino. Mas nem isso vocês conseguiram, seus molóides! E a incompetência e falta de traquejo de vocês jogaram nossos aliados no colo de Oposição. E agora qual é o plano de vocês para consertar esse estrago todo?
- É por isso que nós estamos aqui companheira Poliana. – intercede Líquen, o amorfo, tentando contemporizar a situação e adoçar o ânimo melindrado da rainha deposta. – Todos nós sabemos e admitimos que nosso clã não é nada sem você, nossa eterna rainha. – continua adulador, causando desconforto em algumas velhas estrelas do recinto – Precisamos de sua ajuda Poliana. Sem você, será o fim de nossa jornada, de nossos carguinhos e mordomias.
- É isso mesmo companheira Poliana! Sem sua ajuda nós vamos ter de trabalhar. Vai ser nosso fim! – choraminga o representante do Companheiros Unidos no Trambique (CUT)
- Eu não sou mais rainha, não posso mais manter as mordomias de vocês. Não tenho mais nada com isso. – acrescenta Poliana, com ar de indiferença.
- Mas com seu apoio e dedicação, nós podemos eleger o novo rei para o trono e com isso manter nosso fiel e seleto grupo no poder. Só você pode nos ajudar Poliana. Ninguém, em todo reino tem seu carisma, sua popularidade, sua simpatia e desenvoltura. Ninguém ilude o povo como você. Com você ao nosso lado, nas ruas, nós venceremos Oposição e manteremos o trono, a coroa e os carguinhos.
- Como novo rei, meu sucessor, você quer dizer... o Golesminha?!
- Isso, isso! – entusiasma-se Golesminha batendo palminhas de contentamento.
- Ele é o nome escolhido por nosso clã para disputar a coroa, Poliana. Por isso, é que nós estamos pedindo que você nos ajude.
- Vocês não querem minha ajuda. Vocês querem um milagre! O homem não é consenso nem entre a facção dele no nosso clã. Não tem postura de rei. Fala como uma donzela arrependida. Puxa o saco até dos adversários. Até bem pouco tempo atrás fazia arruaça em porta de empresa, atrapalhava o trânsito e ofendia quem contribuía para o reino crescer. Depois adotou a postura paz e amor. Não defende nem diz nada. O que diz na frente, desmente nas costas.  É esse o rei que vocês querem que eu ajude a chegar ao trono?! – indaga a antiga monarca
- Sim. É esse o rei que nós queremos Poliana. – admite Líquen, um tanto constrangido com a dureza dos argumentos ouvidos.
Após poucos segundos de reflexão Poliana ergue-se do divã e anuncia decida: - Eu acho a escolha perfeita! Ninguém teria o biotipo melhor para sintetizar a atual fase de nosso clã. Depois da gloriosa e magnifica Poliana, o invertebrado e pegajoso companheiro Golesminha! E para conseguir o milagre de eleger essa caricatura, só mesma a sempre ardilosa e maquiavélica Poliana. E vamos adiante! – comanda Poliana, a eterna rainha da contradição.

Um comentário:

  1. Melhor do que isso só colocando umas cerejas por cima!Parabens!

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