O dia era para
ser de festa, mas foi só uma quarta-feira de cinzas como tantas. O aniversário
do grande clã estrelado foi o mais cinzento de sua história. Talvez o primeiro
de muitos. Nada de festa, bandeiras, comemoração e discursos acalorados e
raivosos. Apenas acanhadas postagens em redes sociais. O grande guru da
companheirada aparecia, apagado e abatido, parabenizando os seus. Uma réstia
deprimente do líder carismático que fora. Sem uma estrela no peito ou uma pincelada
de vermelho para trazer um pouco de cor e calor ao vídeo. Nenhuma emoção. Nem
amor, nem raiva. Até mesmo as tradicionais acusações conspiratórias e de
vitimização saíam quase suspiradas, como se os últimos respiros fossem. Cinzas
de promessas e ideologias de uma agremiação que se desintegrava dia após dia.
Sua sempre
fiel militância já dava mostras de sentir-se traída. Por uma década toleraram
os escândalos de corrupção que atingiam o grande clã. Os fins justificavam seus
erros. E os fins eram revestidos de poesia e romance: justiça social e amor ao
povo. Por anos bradavam, estimulados por seu líder maior, contra a elite mesquinha
que odiava pobres e trabalhadores. Que por desprezar minorias difamavam e
perseguiam aquelas almas abnegadas que lutavam pelos desfavorecidos (os descamisados
de tempos mais colloridos). Quando se rouba por uma justa causa, o roubo se
veste de honra. Quem usufrui de riquezas onde o povo carece de saneamento,
saúde e dignidade, é a elite asquerosa. A elite fatura milhões, indiferente às
mazelas de seu povo, assim acreditam os doutrinados da seita vermelha.
Enquanto o
messias da companheirada recebia milhões para proferir palestras e seus prodigiosos
filhos tornaram-se milionários em espetacular ascensão, a militância estrelada
gritava contra as elites. Feito soldadinhos, marchavam no ritmo de suas
contradições. Como marionetes, não se davam ao luxo de usar o cérebro e a razão.
A militância questionadora de tempos longínquos tornara-se, a exemplo de seu
clã, uma massa amorfa e putrefata de mentiras e falsidades. E não se envergonhavam,
pois lhes restava “a causa”. Só que “a causa”, descobriam aos poucos, a conta-gotas,
há muito fora vendida. Ou emprestada, em troca de sítios e apartamentos de
veraneio, pequenos luxos dignos da elite. Até os militongos começavam a enxergar que os fins já não eram os mesmos
que romanticamente acreditavam ser. Já os meios, ah os meios, eram bons meios
para enriquecer os espertos.
E a
companheirada ainda irá às ruas defender seu grande líder. Usarão os velhos e bolorentos
chavões. Negarão os fatos e as contradições, como de hábito. Como náufragos,
agonizantes, se agarrarão em todo e qualquer estilhaço flutuante de uma
ideologia carcomida por mentiras. Ainda sonhavam com os fins. E o fim está cada
vez mais próximo. Somente cinzas restarão. E o lúgubre enterro dos ossos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Havendo dificuldades na postagem dos comentários, o campo URL poderá ser deixado em branco.