Poliana estava injuriada. Era um absurdo que ela, justo ela, uma
rainha tão preocupada com os gastos públicos, fosse alvo de tamanha
maledicência nas redes sociais. E de Oposição! Essa desgraçada
criada por Democracia. Em tempos de crise mundial, precisava cortar
gastos. Uma máxima dos neoliberais adotada pelos socialistas em
momentos de tragédia anunciada. Pois, vejam só, foi só sua alteza
resolver economizar um pouco do suado recurso dos contribuintes, que
todos, até a plebe, resolveram criticar a rainha. Gente sem coração,
ou noção de gestão pública. O que esse povinho esperava de sua
carismática monarca? Que fizesse economia cortando uma centena dos
seus bajuladores reais sem serventia? Ou que reduzisse os mais de
três milhões gastos em propaganda oficial para vender ao povo um
reino fantasioso e colorido, onde tudo, até a administração dos
impostos, era uma obra de ficção? Não! Poliana era uma rainha
criteriosa. Sabia como poucos administrar o dinheiro do povo. Cortava
os gastos na raiz. Era intransigente com o desperdício de dinheiro
público. Para corrigir extravagâncias e colocar na linha os
esbanjadores, começara adotando uma medida drástica, mas
moralizadora. Reduzira significativamente o número de fotocópias
nas escolas. Era um absurdo o número de fotocópias gastas com as
crianças nas escolas. Quanto papel desperdiçado! Onde foi parar a
consciência ecológica desses fedelhos? Escola é para formar
cidadãos adestrados para o mundo, e não pequenos delinquentes dos
cofres públicos, indigna-se a monarca. Nessa páscoa, nada de
criancinhas de pré-escola colorindo coelhinhos, pagos com os
impostos do povo. Nada disso! Cada um desses aprendizes da
imoralidade teriam direito a no máximo oito cópias no mês. E que
os professores dessem um jeito de encaixar vinte ovinhos de páscoa
em uma só página, e com paciência e critério, recortassem um para
cada aluno. Poliana não aceitaria mais descalabros com o dinheiro
público. Alguém precisava moralizar esse reino e começar a cortar
o inútil e o supérfluo. E nossa magnânima era a pessoa certa para
esse papel, seguindo a mesma lógica da Rainha Mãe do grande reino
de Gigante Adormecido, apostava na Pátria Educadora minguando ainda
mais os recursos.
Mas Oposição, que não entendia nada de economia, criticava até
as compras da rainha. Sua alteza comprara, para benefício de seus
súditos, uma patrola que abriria estradas e faria a economia do
reino girar. E até isso Oposição questionava, a infame. Sem
qualquer fundamento lógico ou de mercado. Só por ser uma máquina
seminova, comprada em leilão, de um reinado vizinho e
ideologicamente alinhado. Que seminova, que nada! - indigna-se a
rainha. Era quase nova! Um verdadeiro achado! Nem procurando bem se
conseguiria uma relíquia dessas. Artigo de colecionador. Só vinte
anos de uso! Uma jovem máquina, na flor da idade. E, pasmem todos,
mais barata que uma máquina nova. Isso sim é economia! Negocião da
China, digna de Cuba. E quem avaliza o negócio é o contribuinte.
Nossa rainha, Poliana, não entendia o porquê de tanta gente ainda
preferir se endividar, mas comprar veículos novos ou com poucos anos
de uso, já que qualquer Fusca de duas décadas sai muitíssimo
mais barato. Uma pechincha! Um povinho assim, tão ignorante em
economia, nunca sairia do chão. Precisariam aprender e estudar muito
mais. Melhor reduzir mais um pouco as fotocópias das escolas. -
reflete Poliana, preocupada. E cabrestear melhor os professores.
Afinal, em tempos de mídia digital, toda ação desprovida de senso
crítico e moralidade, gera uma imediata reação golpista nas
malditas redes sociais. Redes sociais! Uma desgraça dessas ainda
derrubaria rainhas. Melhor para Poliana não dormir de touca. Essa
nova onda, quase um tsunami, de indignação das massas, prometia
chegar bem perto da torre da rainha. Tomara que essa moda de Justiça
enquadrar corruptos não passe de uma marolinha. Para a polícia, e
para o povo, sem vergonha é sem vergonha. E a cara dos sem vergonha,
quando pegos, aparece em preto e branco, em jornais. Não se gasta
nenhum centavo de recurso público para reproduzir, em xerox. E
nenhum pai, ou mãe, permitiria que seu filho perdesse tempo tentando
colorir essas asquerosas figuras. Para o povo desse reino, é
preferível ver seus tributos gastos em fotocópias para crianças
colorirem o Shrek, o Diabo da Tasmânia, o Papai Noel e o Coelhinho
da Páscoa, do que ter de sustentar centenas de parasitas inúteis e
sucatas com prazo de validade vencido. Só Poliana ainda não
conseguira entender essa lógica. Mas entenderia, prometiam as redes
sociais. Com gritos, berros e manifestações de rua, até os muito
alienados sentiriam o aperto da mão do povo na garganta. Nem mesmo
nossa carismática monarca, Poliana, sairia impune. Mesmo com os
milhões que abundam em marketing e faltam nas escolas de nossas
crianças. Nem mesmo assim, os imorais deixariam de ser coloridos com
a pecha da indignidade. Por nós, ou por nossas crianças, futuro
desse reino.
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