- Por toda a propina que nos sustenta! Pelas centenas de
carguinhos que nos mantém! Por todos os rolos e enrolos com Justiça que ainda
conseguimos acobertar! – grita Poliana com o rosto ruborizado e esganiçando o
tom de voz - Nunca mais deixem o Golesminha dar entrevista ao vivo na
televisão! – berra ainda mais transloucada, nos seus conhecidos ataques de
destempero.
- Relaxa Poliana. Você anda muito estressadinha ultimamente.
Toma aqui uma caixa de bombons de amarula. – oferece um membro do MSTT
(Movimento Só Tramóia e Trago), sem dar nenhuma importância a TPM da antiga
monarca. – Eu particularmente prefiro minha caipira. – acrescenta, sorvendo um
longo gole da sua bebida.
- Caipira! Caipira parecia o Golesminha na TV! O que foi
aquilo afinal? Vocês se venderam para Oposição?
- Eu achei que ele foi bem. – retruca o outro, sempre fiel a
cartilha de seu clã.
- Claro que achou. A entrevista foi depois do almoço. Você já
devia ter tomado cinco taças de vinho a essas alturas! O homem foi uma
desgraça! Como foi que vocês transportaram ele até o estúdio? Dentro duma
britadeira? – pergunta Poliana.
- Claro que não, né Poliana. De carro. Em comitiva, cercado
de militantes e bandeiras, como manda a tradição.
- Então devem ter andado por todo o centro do reino. Trepidando
em todas aquelas ruas esburacadas. Só pode ter sido isso! O homem não parava de
se chacoalhar na frente da câmera! Parecia aquelas birutas de posto de
gasolina. – relata Poliana, imitando os movimentos desordenados de seu
companheiro Golesminha.
- Credo Poliana. Nem foi assim. – defende um dos amigos
tentando segurar o riso. – Mas pensando
nisso, nós podíamos mandar fazer umas birutas com a forma do Golesminha. Ia
ficar engraçadinho na campanha.
- Não tem graça nenhuma! Nós temos de encagaçar Oposição, não
matá-la de rir! – irrita-se ainda mais a monarca deposta – E o que vocês
passaram na boca dele?
- Nada, ora bolas. O pessoal da maquiagem usou brilho labial
e um pouco de pó, eu acho, misturado com óleo de peroba, é claro. A maquiagem
básica, a mesma que nosso adversário também usou.
- Mas devem ter feito alguma coisa com a língua do homem. Ele
ficava se lambendo todo, que nem um boi Zebu. Aquela língua pra cima e pra
baixo. Um horror!
- Tava mais pra lagartixa. Uma lagartixa branca. – acrescenta
outro militante, tirando sarro.
- E vocês embriagaram o coitado?! Ele já não diz coisa com
coisa sóbrio, que dirá bêbado. Vocês deram cachaça pra ele antes da entrevista,
seus inúteis incompetentes! - acusa Poliana.
- Claro que não! Você acha que nós somos burros?! Com toda
essa Balada Segura pelo reino, ele era o único não tinha tomado nada no almoço,
então foi dirigindo.
- Alguma coisa vocês devem ter dado pra ele tomar. O homem
tava enrolando a língua no fim da entrevista. Parecia um pau d’agua como vocês do
MSTT!
- Ah! Deve ter sido o tiner. – lembra-se um companheiro,
despreocupado.
- Tiner! Vocês deram tiner para ele cheirar! – grita Poliana
e se atira desesperada no divã – Chaparam o plasta do Golesminha! Justo quando
ele ia aparecer num programa de grande audiência da TV. Ao vivo para todo o
reino. Onde é que vocês estão com a cabeça, seus estúpidos!
- Nada disso, Poliana. Nós usamos tiner na boca dele. Era
preciso para ele conseguir falar, lembra?
- Como? – questiona Poliana, devorando nervosamente seus
adorados bombons de amarula.
- Nós tínhamos colado a boca do companheiro Golesminha com
Super Bonder para ele parar de pregar a palavra de Marx e não espantar os
eleitores. Ele só ficava andando nas ruas com roupa de padre e ao lado dele um
carro de som enorme com a sua voz Poliana.
Está lembrada agora?
- Claro que sim. Vocês estão tentando fazer com que o
Golesminha pareça um clone meu. Como se fosse possível um absurdo desses! Eu
tão arrumadinha e altiva e ele todo desarranjado. Uma infâmia, isso sim. –
desdenha Poliana – Pegaram tudo que era meu e estão colando no Golesminha.
Copiaram todas as minhas propostas! Todos os meus discursos! Os mesmos jargões!
As mesmíssimas frases feitas e slogans. Até os escorregões nos erres são
idênticos!
- Claro Poliana. O que você esperava? Se colou uma vez, pode
ser que cole de novo! E depois, ia ser difícil inventar tanta lorota nova em
tão pouco tempo.
- Mas vocês estão usando até as minhas fotos! Isso é um
ultraje a minha imagem de monarca perseguida pela desumana e intransigente
Justiça.
- É essa a ideia Poliana. Como o Golesminha é um mosca-morta
que ninguém conhece e quem conhece quer manter distância, nós usamos a sua
carismática e popular figura de rainha para enrolar o povão. Como a maioria do povo
nem está sabendo direito o que está acontecendo no reino, vão pensar que tem
que votar novamente em Poliana. Dessa vez para Garota Verão. Pura estratégia de
marketing.
- Eu sempre quis ser Garota Verão. – acrescenta Poliana
sonhadora, mas retornando ao foco da discussão com rapidez. – Chega de conversa
fiada. Vocês ainda não esclareceram o negócio do tiner e da chapação do
Golesma!
- Antes da entrevista tivemos de descolar a boca dele. E a
tal da super cola não sai sem muito tiner. Por isso que ele estava com a língua
meio pastosa. Acho que exageramos na dose.
- Vamos ter de repensar essa estratégia. Não podemos correr o
risco de outro fiasco desses ao vivo. – reflete Poliana.
- Vamos parar de colar a boca dele e correr o risco de
espantar nossa chance de retomar o trono?!
- Claro que não. Não vamos mais deixar ele dar entrevistas, é
lógico. Nada mais de TV para o Golesminha em Mundo Real. Onde já se viu esse
negócio de entrevista ao vivo, sem edição, montagem ou photoshop. Quem foi o idiota que inventou essa baboseira de
confronto de ideias, opiniões e debates? Coisa de gente reacionária e
desocupada. Só pode ter sido invenção de Oposição. – afirma Poliana entediada.
- Coisa de Imprensa Livre, é claro! Deve estar armando alguma
arapuca, a arruaceira.
- Com certeza algum golpe midiático. Mas não podemos nos
deixar arrastar para o temerário e perigoso campo das ideias. Precisamos nos
manter no campo das ilusões de ética. Esse é o nosso campinho. Nele somos
imbatíveis. – declara a antiga monarca erguendo-se e parando em frente ao
espelho da sala - Então está decidido. Nada mais de entrevistas. Muito menos
debates. Ainda mais mediados por essa Imprensa Livre golpista. Entrevista só em
canal fechado que o povão não assiste mesmo, e se for na hora da novela. Ou
para veículos democráticos e descomprometidos, como a Carta Capital.
- Então está resolvido. – concordam todos, voltando para suas
caipirinhas
Enquanto isso, Poliana demorava-se em frente ao grande
espelho. Mirava-se de todos os ângulos possíveis fazendo caras e bocas.
Decorridos vários minutos vira-se decida para o seleto grupo no recinto e
pergunta com um sorrisinho coquete.
- Será que essa decisão arbitrária de Justiça de me manter
oito anos em isolamento, sem disputar o trono ou ganhar um carguinho público,
também me impede de disputar o Garota Verão?
- Ah, não! – suspiram seus companheiros
- Ela exagerou de novo nos bombons de amarula! Alguém aí, faz
um café bem forte, antes que ela nos faça pagar outro mico.
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