Nos
bastidores das filmagens o clima era de já ganhou. A vasta corte real cercava a
esplendorosa rainha. Poliana treinava compenetradamente as caras e bocas que
deveria apresentar, logo mais, em frente as câmeras. A rainha olhava
descontente para o traje escolhido por sua assessoria de marketing e
ilusionismo. Que roupas mais sem graça ou glamour! Poliana não entendia como
poderia fazer boa figura usando avental de florzinhas e saias tão cumpridas e
deselegantes. E chinelos de dedos! Eu detesto chinelos! – pensa a soberana,
observando injuriada seus pezinhos miúdos naquelas coisas grotescas. Os
marqueteiros da corte garantiram a sua alteza que era preciso passar a seus
crédulos e ingênuos súditos um ar doméstico e de simplicidade. Seu povo humilde
se comoveria com o ar brejeiro da altiva, mas despojada, Poliana.
-
Precisamos montar o pano de fundo para a entrevista. Tragam as crianças
ranhentas para compor o cenário de família unida e simplória... quero dizer,
simples . - ordena um dos assessores de ilusionismo da rainha.
- Pega lá a
bicharada, companheiro, e coloca os gatos e cachorros em volta do fogão a
lenha! Vamos dar uma idéia de preocupação com a causa dos animais. – orienta o
marqueteiro real.
- Cachorro
e gato não! – discorda a rainha – Eu tenho alergia a essas coisas peludas! –
acrescenta coçando o nariz com ultraje.
- Tá certo
magnânima, mas precisamos colocar algum animalzinho nas tomadas. Até Oposição
tem cachorro! Você precisa fazer um esforçinho Poliana.
- Já não
basta ter de agüentar a zoeira infernal desse criaredo mal educado! Vou ter de
aturar essa cachorrada na minha volta também?! – revolta-se a monarca.
- Quem sabe
colocamos um porco no lugar do cachorro? – sugere um representante da
agricultura familiar. – Vai reforçar nossa preocupação com o pessoal do campo.
- Boa idéia
companheiro! Tragam logo um leitão e um bezerro mamão!
- Ai que
nojo! – reclama Poliana, torcendo o delicado nariz.
- Agüenta
firme alteza! São só algumas tomadas. – consola um membro da equipe. – Rainha,
você deve ficar sentada no banquinho segurando um pano de prato. Vamos dar a
idéia da mulher do interior que teve de deixar sua terra e migrar para esse
grande reino em busca de oportunidades. Você pode escorregar um pouco nos erres
para comover o povão.
- Isso é
fácil. Eu saí quase corrida do interior quando meu oportunismo se tornou
complexo de mais para aquele vilarejo. Bem dita seja minha visão de longo
alcance. Se não fosse por isso, vocês hoje, companheirada, estariam no lugar de
Oposição, erguendo a velha e gasta bandeira da moralidade – vangloria-se sua
majestade. – Graças a minha ambição, nós vendemos a moralidade por dinheiro
fácil. Algo muitíssimo mais lucrativo que enrolar os colonos, todos hão de
convir.
- Agora rainha,
você deve falar do valor da família na sua vida. Tá tudo aí no script. É
importante que você lacrimeje bastante e enxugue as lágrimas no avental.
Enquanto isso uma das crianças que arrumamos vai limpar o nariz na sua saia enquanto...
- Eu vou
vomitar! – exclama Poliana, nauseando. Meus sais! Tragam os meus sais!
- Só mais
um pouquinho alteza. Seja forte! Mais tarde você pode ficar horas relaxando na
banheira de ofurô. Não esqueça que Oposição também tem família.
- Mas não
deve ter criança ranhenta! – reclama a pálida monarca.
- Se não
tem, vai arrumar. O povo adora a criançada na TV. Esse clichê é velho, mas
sempre pega bem.
- Aposto
com vocês como Oposição vai desfilar com o Zangão vestido naqueles coletinhos
fora de moda que o velho usa desde a década de setenta. – brinca um dos bobos
fazendo Poliana gargalhar.
- É mesmo! –
exclama a rainha já recuperada de seu desconforto – Aqueles coletinhos
horrendos do Zangão conseguem ser piores que essa roupa de virgem campesina que
vocês me arrumaram.
- É isso
aí! Filmem bem esse ar descontraído dela. Vai ficar ótimo no programa. – ordena
o marqueteiro, satisfeito com a tomada.
- Nesse
momento, você vai falar para nossos ouvintes de como você se emociona com o
sonho da casa própria acalentado por seu amado povo. E de como a abnegada
rainha construiu sozinha centenas de moradias para seus súditos em tão pouco
tempo.
- Essa é
fácil também. Só nos últimos quinze dias eu já ergui 30 casas! Meu reino é um
verdadeiro canteiro de obras! – acrescenta Poliana olhando sorridente para as
câmeras.
- É mesmo?
Eu não sabia desse novo loteamento popular. – surpreende-se o assessor,
consultando o script.
- Não é
loteamento popular, seu estúpido. São aquelas casinhas erguidas no acampamento
gaudério! Tomamos a liberdade de acrescentar essas também na nossa contagem de
moradias oferecida por nosso empreendedor reinado de oportunidades. Tá escrito
na cartilha de nosso clã, página 580. Para cada pá de brita jogada por nós em
algum empreendimento privado, contamos como uma grandiosa e desprovida de
segundas intenções, obra nossa! Como
é que você acha que nos vangloriamos de ter construído tantas casas pro povão. Todo
mundo sabe que nós só conseguimos construir churrasqueiras e canchas de bochas,
seu molóide. – esclarece a já entediada Poliana.
- Ah, agora
entendi. – continua o marqueteiro, um tanto decepcionado. – Quem sabe, nessa
próxima tomada, você rainha, fala ao seu povo sobre como a honestidade é uma
marca importante na sua história.
- Agora sim
eu vou vomitar! – grita Poliana sudorética.
- É
rapidinho alteza. Basta ler o que diz o roteiro.
- Que nojeira!
Isso é inaceitável! – continua a desesperada rainha vomitando na pia.
- Tudo bem
Poliana. Não precisa ficar assim tão melindrada. – desespera-se o assessor
tentando contornar a desagradável situação. – Eu sei que essa questão da
moralidade é um tanto delicada, mas...
- Porco! –
berra a rainha descomposta.
- Também
não precisa xingar! – ofende-se o marqueteiro, encolhendo a barriga e estufando
o peito.
- O porco,
seu cretino! Tá cagando no meu tapete Persa! Alguém faça alguma coisa! – brada a
magnânima rainha após mais uma golfada na pia, enquanto seus apalermados bobos
e pajens corriam desembestados para resolver mais esse constrangedor episódio.
- Vamos encerrar
as gravações! - anuncia o chefe da equipe. Melhor usarmos só tomadas externas
daqui para frente. O cheiro por aqui tá ficando insuportável.
Pior que este programa,é o candidato da oposição que fica que nem um mudo ao lado de ex prefeito que não teve a coragem de ser candidato,e de deputado federal que apareçe agora na nossa cidade.Além do mais destacar o programa de TV e rádio do mesmo que está horrivel,aquele editorial o apresentador mostra com sua cara fechada como vai ser a prefeitura para o povo "fechada"como sempre foi com o Zanella,afinal ele é um dos coordenadores da campanha.
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