segunda-feira, 21 de maio de 2012

Os Altos Saltos da Rainha



- Deus do Céu! O que é essa tralheira toda esparramada pela sala! Que confusão. Não dá nem pra andar sem tropeçar nessas coisas! – reclama um dos pajens reais desviando dos entulhos no chão.
- Coisa de Poliana. Ela tá há horas escolhendo os modelitos. Mexe e remexe naqueles armários, tirando centenas de sapatos.
- Mas pra que ela quer todos esses sapatos? Vai doar pra campanha do agasalho?
- Que doar que nada. Ela esta escolhendo os melhores modelos para disputar o troféu popularidade deste ano.
- Ela pretende entrar na disputa pelo troféu com esses saltos tão altos. Não seria mais adequado algo mais confortável e prático?
- Agora não há mais necessidade de maiores cuidados e frescuras. O velho já decidiu: vai ficar com as pantufas.
- Mas será que já é definitivo? Olha lá, não podemos ser afoitos.
- Acho que desta vez é sério mesmo. Ele não vem. Dá até pra ver as caras de desolação das viúvas do Zangão. Tadinhas, vão ter de ficar tricotando por mais uns anos.
- É mesmo, os jogos de bingo da velharada vão bombar por mais um tempão.
- Não sei não. Já vimos esse filme outras vezes. Ele diz que não vai e no final era só enrolação pra conseguir patrocínio.
- Dessa vez é sério. O velho ficou com medo da popularidade de nossa rainha. Achou melhor ficar em casa olhando velhas fotos e lembrando-se dos seus tempos.
- E quem vai vir então?
- Se lá. Agora, tá todo mundo reunido escolhendo um personagem para perder pra Poliana.
- E já tem algum nome circulando no meio?
- Eles vão lançar qualquer um, só pra figuração. O Macaco Tião ou o Louro José, talvez. Nossa rainha está eufórica. Nem ela acreditava que ia ser assim tão fácil.
- É, mas nós temos que nos cuidar. Afinal, mesmo sem adversário a Poliana sozinha já dá o que falar.
- Eu concordo. Não acho boa idéia Poliana escolher saltos tão altos. Muita coisa pode acontecer na viagem a Horário Eleitoral.
- Vocês são paranóicos! Horário Eleitoral é nossa praia. Lá ninguém nos assusta. Ninguém faz photoshop como nós.
- É isso aí! E nossos jingles fazem intelectual chorar como a falácia da revolução cubana. E os súditos adoram ver a rainha beijando criança ranheta e piolhenta. Nós arrasamos nessa modalidade.
- Não é essa minha preocupação. Eu me preocupo com nossas cabeças e nossos carguinhos. O que me deixa arrepiado é o que a rainha vai descobrir em Horário Eleitoral!
- O que você quer dizer?
- Vocês já pararam para pensar na quantidade de mentiras que nós temos dito pra rainha durante todos esses anos? Já contaram quanta história da Carochinha nós inventamos para fazer a rainha dormir e acreditar que seu reino é uma colorida Ilha de Fantasia e realizações? Será que vocês não percebem que mais dia menos dia todas essas mentiras vão cair como uma avalanche nas nossas cabeças.
- É mesmo! Tinha esquecido desses detalhes. Pior ainda! Sem um adversário decente para enfrentar Poliana, nossas trapalhadas vão ficar ainda mais expostas! Não vamos ter ninguém em quem jogar a culpa dessa vez.
- Meu Deus! Seremos nós, nossas promessas vazias e mais ninguém. Como é que vamos resolver isso companheirada! – grita um dos bobos quase em histeria.
- Se lá, sei lá. – choraminga um sindicalista correndo estabanado pela sala. – Nunca nos deparamos com uma coisa assim, antes. As filas na saúde, os curandeiros caindo de pára-quedas, os remédios jorrando em fontes, todas aquelas obras fantásticas... meu Deus! Quando ela descobrir!
- Não quero nem pensar numa desgraça dessas! Ela vai nos matar! Temos de pensar em algo. E rápido!
- Já sei! Vamos logo seus molóides. Vamos atrás de Zangão. Se nós fizermos uma vaquinha e implorarmos um pouco pode ser que ele mude de idéia e salve nossos pescoços.
- Bem pensado. Temos que negociar. Vamos oferecer umas ceroulas novas, e essas pantufas do Pateta. E tem aquela caixa preta abarrotada de cartazz e dossiês. Poliana nem vai desconfiar. Vamos logo, sem barulho. Nossos carguinhos dependem dessa negociação.

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