A rainha
rodopiava como criança no centro do salão real. Sua corte de companheiros
gargalhava e brindava com o mesmo entusiasmo da época da ascensão de sua
majestade ao trono. O contentamento contagiava o seleto grupo tanto quanto a inebriante
e surreal propaganda oficial da corte de Poliana.
- Eu sabia!
Sempre soube que ele não viria. – afirma eufórico um dos assessores da rainha
- Não tem
pra mais ninguém! Dessa boca ninguém mais nos tira. – acrescenta, já um pouco bêbado,
um dos membros do Companheiros Unidos no Trambique (CUT).
- Eu
confesso que achei que ia ser mais difícil. Que essa turminha da elite ia dar
algum trabalho. – admite uma desocupada figura do MAQ (Movimento dos Atingidos
por Quati).
- Parece
que tu não conhece esses reaça, cara.
Eles só sabem explorar os trabalhador,
e morrem de medo da classe operária organizada. E nós somos o proletariado no
poder! – exulta um dos assessores da Câmara de Vendilhões, pós-graduado em dialética
trotskista.
- É isso aí
companheiro! Os cara se borraram todinhos. Um empurra pro outro. Todos mortos
de medo de nos enfrentar. Tu viu a cara do entojado o Marimbondo quando o Zangão
jogou a bomba no colo dele? Chegou a murchar o ego de pavor – vangloria-se um
líder do SindiPelego.
- Verdade.
Nossos planos estão correndo melhores do que contávamos. Nesse ritmo teremos só
Poliana na disputa. Vai ser mais um
sonho realizado. Uma utopia! Teremos finalmente uma democracia sólida, absoluta,
e incontestável. Como a cubana! – discursa, inflamado, o camarada Boina Verde.
- Bravo
companheiro! – aplaude emocionada uma matriarca do clã, enxugando as lágrimas
com a bandeira vermelha - Imaginem só: um reino onde todo mundo pensa igual.
Onde não há críticas ou divergências, e todos acreditam em nossos cartazzes e
outdoors. Um mundo ideal. Sem Oposição.
- Um brinde
ao fim de Oposição! – propõem entusiasticamente a turma do MSTT (Movimento Só
Tramóia e Trago).
- Chega
dessa palhaçada! Eu cansei de ouvir vocês falarem tanta besteira. Vocês
conseguiram azedar o meu humor com esse falatório ridículo. Eu tenho que dar
graças aos céus por Zangão ter pendurado as chuteiras e Oposição ter se acovardado,
por que se eu dependesse de vocês, seus molóides, eu estava frita! –
exaspera-se sua majestade, pondo fim a euforia do grupo.
- Credo
Poliana. Isso é jeito de falar? Tu sabe bem, que tu só tem a coroa graças a
nossa boa estrela! – indigna-se um membro do clã.
- Estrela
sou eu! Vocês todos gravitam em torno de mim como figurantes. É o meu carisma! O meu discernimento! A minha
astúcia que mantém esse reinado! Vocês são um bando de inúteis sustentados pelo
contribuinte, isso sim. Não servem pra nada. Tanto, que faz uma semana que
vocês estão bebendo e comemorando a debandada de Oposição e ninguém no reino percebeu
a ausência de vocês. – exclama a rainha com a presunção própria dos donos da
bola e da arbitragem. – E eu tendo que escutar essa conversinha de “nós somos o
proletariado no poder”- desdenha Poliana. - Nós quem? Vocês nunca trabalharam
na vida. Se entraram alguma vez numa
fábrica foi pra chegar no sindicato e se acomodar por lá. E esse negócio de que
vocês sabiam que Zangão ia dar o fora? Até ontem vocês andavam que nem umas
baratas tontas, loucos de medo dele e seu enxame moribundo. – continua a
monarca inclemente. – Se eles tem medo de alguém, é de mim! Soberana cada vez
mais absoluta. Eu! Uma unanimidade até entre quem deveria opor-se a mim. –
afirma Poliana altiva, fazendo pose em frente ao espelho.
- Nossa! Se
ela antes, mesmo atolada em escândalos, já era insuportável, agora com ego super
inflado ninguém mais segura. – cochicha um dos bobos da Irmandade do Fogo.
- E vocês,
seus tolos... – continua a egocêntrica rainha – são tão burros que nem se deram
conta da dança das cadeiras das minorias.
- Dança das
cadeiras das minorias?! O que é isso alteza? Um novo programa de inclusão
social e cidadã?
- Quase
isso, bobo. Vocês ficaram aí festejando com Champanhe e Cuba Libre e nem
pararam para pensar que se Oposição está morta, e eu sou uma unanimidade, todo mundo está comigo. E todo mundo vai querer um carguinho. Como
é que vocês acham que eu vou arrumar tantos carguinhos assim?
- Como magnânima?
– pergunta um dos pajens reais, engolindo em seco de apreensão.
-
Remanejando os robustos e improdutivos glúteos de vocês, é óbvio!
- Isso
significa...? – pergunta um companheiro sem muita prática em jogos de
raciocínio e lógica.
- Significa
que várias das cabeças e bundas de vocês vão dançar meus companheiros. O trono e
a coroa já tem dona. Vocês que se digladiem feito abutres para ficar com meus
restos. – debocha a temida Poliana agarrando-se ao trono para não levantar vôo.