sábado, 27 de novembro de 2010

Pavão ornamental


Enfim, uma teta! - comemora Pavão, aliviado. Já estava vendo-se em cólicas com a possibilidade de acabar de mãos abanando. Durante décadas suas delicadas mãos permitiram-se apenas o esforço de abanar bandeirinhas e massagear egos sensíveis. Não estavam acostumadas com trabalho mais elaborado e degradante. Este deve ficar, é claro, a cargo dos tolos que sustentam suas mordomias.
E que boa teta lhe arrumaram. Adequada para muitas viagens e abundantes diárias (espécie de ração utilizada para alimentar essa rara espécie de ave mamífera só encontrada por essas bandas). Pavão iria se fartar de diárias. Poderia desfilar pelos pagos altivo e garboso, exibindo sua melhor plumagem. Em ocasiões apropriadas vestiria sua velha fantasia de colono sofrido, com um grande chapéu de palha de boa grife e o eterno discurso de homem da terra que tão bem decorara ao longo de tantos anos representando o mesmo papel. Era só caprichar no sotaque, na entonação chorosa e no português sofrível. Sua atuação era sempre invejável. Mesmo um agricultor legítimo, de mãos calejadas pelo trabalho diário, chega quase a acreditar que Pavão realmente entende alguma coisa do tema.
E quantos eventos poderia realizar! Como todos os membros de seu clã, Pavão adorava eventos. E com que facilidade conseguia criá-los. A parte mais difícil da elaboração era encontrar um bom título para esses espetáculos. Tinham que ser longos e conter palavras chaves como inclusão, inclusiva, cidadã, participativa, popular e solidária. Se o título conseguisse conter todos esses chavões juntos atingiria a perfeição. Não importa se ao final o objetivo e a natureza do evento não fizessem qualquer sentido, coerência e nexo não são necessários nesse ramo de atividades. Decidido o título o resto era barbada. Bastava jogar em uma grande sala algumas dezenas de companheiros de inutilidade, eternos representantes de coisa alguma, hábeis em vender ideologias vazias e defender com desenvoltura os interesses do grande clã. Entre essas ilustres figuras os mais conhecidos são as chamadas representações populares como o SindiPelego (agregação de todos o pseudo-sindicatos, que na atualidade erguem a bandeira dos trabalhadores, mas defendem interesses próprios e dos atuais donos do poder e dos recursos públicos), CUT (Companheiros Unidos no Trambique) e o poderoso MSTT (Movimento só Tramóia e Trago). Essas românticas entidades contém as estrelas mais brilhantes e respeitadas na arte da economia sustentável através da vadiagem coletiva e todas elas reunidas asseguram um grande público para qualquer medíocre espetáculo. Como boa e adestrada platéia nunca irá faltar, só resta mesmo a publicidade, outra aptidão inata a todos os membros do clã. Era preciso muita, mas muita propaganda: folders, banners, outdoors e fotos em jornais. E por fim, muitos discursos vazios que conseguissem convencer o grande público de que a inutilidade do evento traria, através de ações afirmativas, inegáveis benefícios na geração sustentável de renda para nossa nova sociedade participativa, cidadã e inclusiva e promoveria a criação de uma consciência coletiva e solidária e o resgate histórico da cidadania das minorias oprimidas por séculos de políticas neoliberais excludentes que acarretaram na imensa dívida social com a massa de excluídos.
Pavão, encantado e satisfeito, faz seus planos para o futuro e aguarda ansioso a passagem rápida dos poucos dias que o separam do momento de abocanhar sua nova e merecida teta. Quase tão feliz quanto Pavão estava Poliana, que se livrou do peso de ter que arcar com mais um decorativo bobo em seu castelo.

2 comentários:

  1. Trabalhar é somente para os otários, eles sempre arrumam uma boquinha para não trabalhar, não aceitam o resultado das urnas que ao não os elegerem querem dizer que essas pessoas (não eleitas) não devem ser sustentadas pelo poder publico, mas os eleitos sempre acomodam os rejeitados, ainda bem que vai para bem longe daqui, pra fazer nada, afinal o sabe fazer o pavão?

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  2. Muito bonito ver que apesar de tu teres razão em parte de tua crítica, também manifesta profunda ignorância e má vontade ao referir entidades com notável trabalho em prol da politização das demandas da classe trabalhadora brasileira que absolutamente como você, nosso rei desconheçe.
    Kátia, eu gosto do teu trabalho, no entanto algumas generalizações que tu professa soam mais como antipartidarismo do que análise bem humorada de uma gestão.

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