E em Gigante Adormecido o fim do
poço parece nunca chegar. Gravações e grampos telefônicos expõem ao povo o mar
de lama - e de dinheiro sujo – onde afundam-se quaisquer esperanças de que algo
limpo venha a emergir. É a política apresentada como acordes da mais
melancólica música sertaneja, escrita e interpretada por Joesley e Wesley, os
reis da picanha. A dupla de larápios bregas saboreia um exílio dourado no
exterior, com direito a faturar alguns milhões em especulações por conta da
divulgação do enredo de seus lucrativos sucessos. São os royalties de seus
direitos autorais pagos pelo povo, por decisão de Justiça. Se a conta não
parece muito justa, é por que ainda não conhecemos o final da história, garante
Justiça. Ao fim e ao cabo, pagaremos duas vezes, desconfia o povo, cada vez
mais cabreiro. Ao povão resta roer os ossos e amargar
desesperança.
E Mesóclise, o rei tampão, corre
o risco de vir a ser apenas o primeiro tampão dessa trágica dinastia. Ao se ver
com a corda no pescoço, balançando desengonçadamente em um tripé de
impopularidade, escândalos de corrupção e aliados em debandada, incorpora sua
antecessora e acusa a existência de um complô contra si. Brada confiar na
integridade moral de seus amigos – aqueles que correm com malas de dinheiro
sujo – e entoa a velha marchinha: “Daqui não saio, daqui ninguém me tira!” Mesóclise
é apenas a outra face da rainha deposta, para quem tinha dúvidas que a escassez
de cerne e a abundância de imoralidade eram o cordão umbilical que unia essa
outra dupla - menos sertaneja, muito mais Bossa Nova para intelectual delirar.
E quando o grito de “fora!”
parecia enfim unir uma nação há anos separada por ideologias, uma onda de
terror vermelho colocaria fogo na frágil e emergente aliança por um país
decente. Não há solução longe da democracia, e não há democracia sem respeito às
leis e a ordem. O incêndio e a depredação de prédios públicos e a violência dos
que dão de ombros a ordem pública, fez calar, novamente, a voz da maioria do
povo ordeiro e cada vez mais exausto. O “fora!” que deveria ser berrado em
uníssono, foi sufocado pela força irracional dos intransigentes e autoritários
que desprezam democracia. Uma minoria de baderneiros e terroristas calou a
maioria de um povo decente e que anseia por ética e moralidade.
Olhando para baixo, até onde a
vista alcança, não é possível calcular o quanto ainda nos resta desse trajeto
em queda livre até atingirmos o final desse poço, onde, esperamos, o solo seja
suficientemente firme para permitir o impulso que nos fará começar a emergir
desse lodaçal absurdo e indigno. Talvez precisemos cair muito para sabermos
valorizar o solo firme. Talvez tenhamos muito ainda a afundar. Que saibamos
afundar e mergulhar nesse poço imenso de dejetos sem nunca perder democracia de
vista. Quando as coisas nos parecerem insuportavelmente difíceis, e serão, que
olhemos para cima, e que a luz das leis, da ordem e da democracia sejam sempre nossa
meta a alcançar. Todo resto é cantiga de roda para embalar intelectualóide
saudoso da ditadura.