domingo, 9 de fevereiro de 2014

As inconsequências ambientais do clã de Poliana


Poliana estava irritadíssima. Há meses seus bobos não presenciavam suas conhecidas crises de histeria e pirraça. Andava de um lado a outro do salão real gesticulando e derrubando o que via pela frente. Seus gritos esganiçados podiam ser ouvidos do lado de fora do palácio. Até Imprensa Livre já tivera a oportunidade de escutar seus ataques. O motivo do destempero da monarca? Mais uma interrupção histórica nas obras de acesso a Escola de Ensino Superior. Escola essa, que a rainha parecia acreditar fazer parte do quintal de seu castelo. Estranhamente, agia e falava como se pertencesse a Poliana. E por assim pensar, como de costume no seu reinado, tinha mais bobo sem formação palpitando no local do que operário trabalhando. O resultado, como quase sempre, era mais uma trapalhada, dessa vez ambiental, financiada com recursos públicos.
- Eu não posso acreditar! Quem essa fulana pensa que é para impedir o avanço das obras no meu trevo?! Tudo por causa de um banhadinho lamacento e três ou quatro nascentezinhas de rio sem qualquer serventia? Será que ela não consegue enxergar a importância histórica da minha obra? Só quer aparecer, com Imprensa Livre a sua volta, bruaca invejosa!
- Acalme-se alteza? Tome aqui um chá de cidreira. Tanta irritação não fará bem para seu delicado estômago de majestade. - intervém Espelho Mágico, tentando apaziguar os ânimos reais.
- Não é possível um disparate desses. - continua Poliana, tomando alguns goles da bebida calmante. - Nós já tínhamos conseguido enrolar até Justiça. Era questão de poucos dias e teríamos conseguido aterrar todo aquele banhado inútil. Mandei até nosso bobo das obras para acompanhar de perto o projeto. Ele me garantiu que estava tudo dentro dos conformes.
- Com todo respeito, alteza, mas o bobo das obras não sabe a diferença entre um rio e um esgoto a céu aberto. - constata o Espelho Mágico.
- É verdade. Mas essazinha sabe o que do assunto? Uma metida, isso sim!
- Na verdade Poliana, ela tem formação e é especialista na área ambiental. E a tal região é área de preservação permanente.
- Ah tá! Até você Espelho?! Agora todo mundo vem com esse papinho enjoado e politicamente correto de preservação ambiental! Se a gente causar algum dano, depois consertamos. É só plantarmos meia dúzia de eucaliptos e ciprestes em volta da rótula e está resolvido, ora bolas.
- O problema, pelo que entendi, tem a ver com a questão da água. As obras vão prejudicar a alimentação de um dos rios que abastece o reino, rainha. Em caso de estiagem poderemos ficar sem água.
- Estiagem, estiagem! Quase nem temos isso por aqui. Não sei o porquê de se preocupar com isso logo agora. Eu já decretei que não faltará mais água no meu reino. Estamos transpondo milhares de recursos públicos e publicidade para isso.
- Mas se secarmos o rio transposto, vamos transpor é lama para os contribuintes. Não parece um bom negócio. - pondera o outro.
- Bom negócio eu vou fazer depois de concluída a rótula. - acrescenta a rainha, pensando alto, já mais calma pelo efeito da cidreira - E esse pessoal do meio ambiente chegou a sugerir que mudássemos a rótula de local. Que absurdo! Não são engenheiros de trânsito! Quem são eles para dar pitacos no local da obra. Nós nos preocupamos com a segurança dos estudantes e motoristas quando escolhemos criteriosamente o local.
- Nós quem, alteza? Quem participou do estudo para tomar essa decisão? - questiona o Espelho Mágico, preocupado.
- Eu e alguns companheiros, é claro. - reponde a rainha.
- Quantos eram engenheiros ou conheciam o assunto? - continua o Espelho, já antevendo a resposta.
- Nenhum, é obvio! Você sabe como conseguem ser chatos e criteriosos esse pessoal da engenharia. Se fossemos perguntar a eles ficaríamos semanas estudando as possibilidades e provavelmente não colocariam a rótula onde é preciso. É um caso especial de interesse coletivo. Por isso eu e a companheirada tomamos a frente no processo. - esclarece a monarca, já um tanto sonolenta.
- Sei... Tudo apenas pelo interesse coletivo, não é mesmo alteza? - continua o outro com ironia.
- Você sabe bem como são essas coisinhas Espelho Mágico. Interesses coletivos regados a recursos públicos, sempre podem ser nascentes que alimentam um caudaloso rio de interesses privados. Não podemos deixar essa fonte secar, não é mesmo? Seria um desastre para nosso Polianoduto. - conclui Poliana, recostando-se nas almofadas para um cochilo, com a consciência ambiental sempre tranquila.

Um comentário:

  1. Site da Prefeitura.
    INCRÍVEL. Sendo assim, eu que gastei R$ 200,00 no conserto do meu carro, economizei 22.000,00, pois o meu carro, se comprar novo, custa R$ 22.200,00. ESTOU MUITO FELIZ.

    "A prefeitura de Erechim economizou mais de meio milhão com a reforma de sua motoniveladora, que foi entregue nesta semana pela empresa responsável pelo conserto e já está no parque de máquinas.
    A reforma foi realizada com o custo de R$ 237 mil. De acordo com o prefeito de Erechim, Paulo Polis, caso fosse comprar uma máquina nova, a prefeitura teria que gastar R$ 780 mil. O maquinário vai servir às secretarias de Obras, Agricultura e Desenvolvimento Econômico."

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