
Poliana era pura indignação. Pessoas malévolas e mal intencionadas estavam pretendendo usar contra ela armas inventadas e idealizadas por seu clã!!! Um revoltante e descarado caso de plagio. Poliana não entendia como as autoridades competentes podiam ser tão omissas, permitindo tamanho desaforo. Se a impunidade no reino continuasse nesse ritmo em breve todo humilde servo iria se achar no direito de se manifestar como se estivesse em uma democracia qualquer! Que disparate.
Poliana tinha obscuras recordações de sua época de guerrilheira da seriedade. Nesses tempos longínquos, todos de seu clã empunhavam de forma majestosa a impiedosa lança da Moralidade e alvejavam os adversários com projéteis de ética disparados por suas inigualáveis pistolas automáticas apelidadas de Transparência. Era um verdadeiro massacre. Seu exército era mesmo implacável. Mas hoje os tempos são outros. Ética, Moralidade e Transparência são armas obsoletas e sem utilidade. Poliana tinha a disposição tecnologia muito mais avançada e de maior poder ofensivo: Mensalão e Propina. Instrumentos muito mais úteis de destruição das massas. Só Povo Honesto, Imprensa Livre e Bruxa Má é que não conseguem entender e aceitar a evolução da humanidade. Poliana já andava cansada de lidar com essa gente ignorante que não aceita o progresso. Precisava arrumar, e logo, uma forma de tirá-los de seu caminho. Essas pessoas ingênuas, quase cretinas, não conseguiam separar Horário Eleitoral de Mundo Real. Confundem fantasia com realidade. Não sabem diferenciar circo de democracia, nem percebem que a democracia muitas vezes pode ser apenas um grande circo. Por isso esperneiam desajeitados em inútil e convulsivo alvoroço.
Já Oposição, trôpega de sono, espreguiça-se e boceja, sem entender o que está acontecendo. Desconhecia Moralidade e nunca fora hábil no manejo da Ética e Transparência. Há muito deixara de lado artefatos tão primitivos. Foram seus habilidosos engenheiros os idealizadores de Mensalão e Propina. Sua obra já estava patenteada. Poderia viver tranqüila e confortavelmente apenas dos royalties. Melhor mesmo era voltar a dormir. Cooptada pelas novas e revolucionárias Forças Armadas, pretendia hibernar por muitos e muitos anos. Pronta a desfrutar o sono dos justos, aconchega-se suavemente nos macios e convidativos lençóis de sua alcova. Em uma funda e escura vala repousa o pouco de vergonha que ainda tinha. O cheiro nauseante exalado pela matéria em putrefação começa a infestar todo o reino. Precisava mandar alguém colocar um pouco mais de lama sobre a carniça, pensa Oposição, mas, acostumada que estava com o próprio cheiro, prefere dormir mais um pouco.