Acho bonito os
grafites, pelo menos parte deles. As pichações são um lixo, todas elas. Mas
está coberto de razão o prefeito de São Paulo, João Doria Júnior, grafite tem de ter o
seu lugar. Como tudo aliás, de carnaval a sexo. Triste de uma sociedade que não
sabe o lugar das coisas. Grafites espalhados pela cidade dão um ar de abandono
e descaso do poder público. E é exatamente disso que se trata: abandono,
descaso e a falta que o poder público faz quando não é capaz de colocar as
coisas no seu devido lugar – de pichadores a assassinos.
Assistir nos
últimos dias a comoção histérica de artistas globais e da mídia (e como andam
histéricos alguns intelectuais e a mídia ultimamente, deve ser algum novo
vírus) com a campanha de Doria de limpeza da cidade chega a ser divertido. Falam
da importância do grafite na nossa cultura como se Cabral quando aqui aportou
tivesse encontrado índios pelados grafitando as árvores com a seiva de Pau-Brasil.
Argumentam que é a arte popular ocupando legitimamente os espaços públicos. Não
é! Espaços públicos são públicos, são
de todos não de alguns, mesmo que sejam Michelangelos e Picassos. Está mais que
na hora de acabarmos com essa palhaçada (bem assim, palhaçada, é preciso colocarmos
os adjetivos no seu lugar também) de repetir para a população que “temos de
ocupar o que é nosso”, que qualquer porcaria é arte e que todo lixo que algum
grupo inventar é representação da cultura brasileira. Propalar essas baboseiras
é querer enfiar na cabeça do povo uma cultura de desrespeito às leis e a ordem
pública e desvalorizar tudo aquilo que de fato é arte, tradição e cultura para
nós. E quem repete isso insistentemente? Os mesmos que em relação as
carnificinas nos presídios gritam que o problema é que prendemos muito, punimos
demasiadamente, que traficantes são vítimas da sociedade (vítimas de nós, bem
entendido) e que a solução é a liberação das drogas e a libertação de todos os
condenados por tráfico. Que romântico! Aquelas pessoas que nas favelas alvejam
os helicópteros da polícia, assassinam turistas desavisados, e nos presídios
degolam, decapitam e esquartejam, quando livres, nesse colorido país das drogas
liberadas e sem tráfico, vão fazer o quê? Se tornarão empreendedores, decerto.
Vão abrir açougues e franquias do McDonald’s talvez. Venderão milho verde e
bijuterias em Copacabana. Os jovens “aviãozinhos” voltarão aos bancos escolares
ávidos para ingressarem em uma universidade, cursar filosofia e estudar Foucault.
Vai ser exatamente assim, entendem os atores globais, os intelectualoides de
botequim e a grande mídia progressista. E ainda tem gente que acredita que
maconha não sequela.
Gosto do
colorido dos grafites, desde que estejam no espaço reservado a eles. Aprecio a
ideia colorida de um país de droga livre e violência zero, na categoria romances
e ficções. A realidade é cinza, como as
paredes de Doria. Se pretendemos ser um país onde bandidos sejam punidos com
restrição de liberdade em presídios dignos e não esquartejados sob o olhar
aparvalhado do Estado, onde nós brasileiros não sejamos assaltados, violentados
ou assassinados como vermes nas ruas, também sob as barbas do Estado, o poder
público tem de ocupar os espaços públicos. O Estado precisa retomar o seu
espaço, pois foi aí que tudo se perdeu. Precisamos conviver com o cinza para
saber apreciar e valorizar as cores, mesmo as mais sutis, e aprender que cor em
excesso cega, Estado ausente mata e a maconha sequela. Se não for assim, em
breve, decapitar e esquartejar pessoas será considerado um importante traço de
nossa cultura.