domingo, 27 de abril de 2014

O petróleo que já foi nosso


Quanta falta lhe fazia um pouco mais de estudo, pensava o velho enquanto folheava os jornais. Há dias assistia aos noticiários e lia cada periódico em busca de informações. Mesmo tendo estudado apenas até o quarto livro, sempre orgulhara-se de se manter bem informado, lendo diariamente todos os jornais e revistas aos quais tivesse acesso. Mas poucas vezes, em todas essas décadas de vida, sentira que o estudo lhe fazia tamanha falta quanto nessas últimas semanas. Por mais que tentasse, e tentava, não conseguia entender o rumoroso caso da compra da tal refinaria texana de Pasadena pela nossa Petrobras. Nada fazia sentido, a esse velho incrédulo. Nenhum sentido de ética, aritmética ou lógica de mercado. Pagar pela metade de uma refinaria quase sucateada, oito vezes o que ela valia já era por si só ultrajante. Ser obrigada, por cláusulas contratuais - que a esse idoso senil tinham cheiro de armação de quadrilheiros - a comprar a outra metade por mais do que o dobro do valor já pago pela primeira parte, parecia conto da carochinha. Ou crime de lesa-pátria. Não conseguia acreditar que algo assim tivesse realmente ocorrido na maior empresa pública de seu país. Por isso lia e relia as notícias em busca de que alguém, algum diretor, conselheiro da estatal ou a própria Presidente da República viessem a público dizer que nada disso era verdade. Que era só piada de péssimo gosto. Melhor começar a acreditar em contos da carochinha, constata o velho tristonho.
O que se ouvia na mídia, daqueles que deveriam defender os interesses da empresa e do povo? “Que não sabiam de todos os detalhes do contrato”. “Que “talvez” não tenha sido realmente um negócio muito lucrativo para a empresa brasileira”. Ou que, “a oposição está querendo tirar proveito da situação com fins eleitoreiros”. Ora! Indigna-se o octogenário. Agem todos, sem distinção, como vermes dissimulados. Gente sem cerne ou coluna vertebral. Tivessem eles o mínimo de vergonha, sairiam hoje pela porta dos fundos, como deveriam ter saído há anos quando toda essa negociata absurda foi firmada. É o o que aconteceria em qualquer botequim que prezasse seu nome e sua clientela. Ou em qualquer país digno de respeito. No entanto, continuaram por anos acobertando-se e se locupletando com as verbas da estatal, certos de que nada dessa imundície viria a público. Sugaram, eles, e todos os outros incontáveis parasitas e energúmenos de indicação política, cada gota de recurso da Petrobras. Transformaram durante a última década, nossa velha e adorada Petrobras, em uma empresa submergente, em franca decadência, que vale hoje menos da metade do que valia há poucos anos. Saqueada pela incompetência e pelo aparelhamento político daqueles que só visam o poder e os interesses pessoais. O que era de se esperar de nossa presidente democraticamente eleita por seu povo, fosse ela uma estadista? Que pedisse desculpas a Nação. Desculpas por ter sido inconsequente e omissa quando conselheira da empresa, e ter se posto como coautora de um negócio no mínimo desastroso. Mas mais do que isso, como atual presidente, deveria pedir desculpas a todo povo brasileiro por ter colocado durante todo seu mandato, sempre os interesses políticos de seus aliados a frente dos interesses do país. Desculpas por ter optado por um projeto de poder ao invés de um programa de governo que atendesse as necessidades de seu povo. Desculpas por ter vendido sua imagem de revolucionária que pegou em armas para defender a democracia e o Brasil, e ao assumir o poder ter se prestado apenas ao indigno papel de pegar em canetas para indicar companheiros e asseclas para se beneficiarem em conluio dos recursos públicos. Desculpas por ter nomeado os parasitas que têm dilapidado, nesses anos, todo o vasto patrimônio que nunca foi da Petrobras, mas sim de todos nós brasileiros. Deveria sentir vergonha! Vergonha de usar, como usou e abusou seu antecessor, de nossa estatal com fins meramente pessoais e eleitoreiros. Mas vergonha, constata o velho desiludido, é característica dos que tem cerne. Infelizmente, nesse meio de sanguessugas do poder, todos eles, sem distinção de cor, partido ou facção, valem menos do que vermes. Pois um verme, nasce verme. Esses que aí estão, tiveram direito de escolha e, ainda assim, escolheram rastejar. Conclui o velho, abandonando de vez os jornais.

sexta-feira, 18 de abril de 2014

O reino amigo dos buracos


Enquanto nossa viajada rainha perambulava pela Germânia em mais uma de suas expedições internacionais inúteis para os súditos, mas devidamente financiadas com dinheiro público, seu reino fora novamente alvo de notícias em rede nacional. Nenhum escândalo dessa vez, apenas um assunto cansativo e corriqueiro por essas bandas. Os bem distribuídos e conhecidos buracos no asfalto, marca registrada de Poliana e sua corte. O reino, ao que parecia, já figurava no ranking dos maiores índices de buracos no asfalto per capita do mundo. Perdia apenas para o Afeganistão e Iraque. Ao menos, é o que diziam as línguas maledicentes de Oposição e do povão ignorante em trafegabilidade e gestão pública.
E como não poderia deixar de ser em um reinado socialista, os buracos não eram privilégio de poucos, estavam espraiados de forma igualitária entre todos os moradores, do centro à periferia. Todo cidadão tinha assegurado o direito legítimo a seu próprio buraco solidário, inclusivo e cidadão. Sabe-se lá o que essas três palavras juntas queriam dizer, mas na doutrina socialista elas estavam presentes até mesmo na desgraça coletiva. O fato era, que os tais buracos cresciam e se perpetuavam há tanto tempo durante o reinado de nossa monarca, que já haviam se incorporado a paisagem do reino. Em alguns, era possível perceber o crescimento de árvores nativas, já bastante enraizadas. Tantos outros foram encampados pelos moradores no inovador programa de Poliana, “Adote um buraco” e foram transformado em locais de lazer e diversão. Nos subúrbios eram usados como piscininhas e piscinões no verão. Já na área central formavam dezenas de banheiras de ofurô. Verdadeiro deleite da plebe, carente de diversão. Até os companheiros do MSTT (Movimento Só Tramoia e Trago) ameaçavam invadir algumas dessas crateras que consideravam verdadeiros latifúndios improdutivos. Os súditos mais gaudérios, substituíram o churrasco na vala e, atualmente, assavam costelões e bois inteirinhos nos buracos, em finais de semana. Poliana já preparava os impressos para o lançamento da primeira Festa Nacional do Churrasco no Asfalto. Sucesso de público, tinha certeza. Os pesque e pague faziam a economia girar no reino, a medida que os buracos se encontravam em total e harmônica simbiose para formarem verdadeiros açudes na zona urbana. O bobo da agricultura até mandara distribuir alevinos nesses lugares tão pitorescos a fim de garantir o abastecimento de peixes para a Semana Santa. Pretendia, a ilustre corte real, transformar o reino em um inusitado centro de entretenimento e esportes aquáticos, com competições urbanas de jet skis e instalação de tobogãs. Para tanto, só precisavam contar com sua conhecida incompetência em tapar buracos. O problema, que afligia o bobo das obras, era que em algumas áreas os buracos já estavam brigando entre si em busca de espaço. Tinha buraco engolindo buraco e boeiro se sentindo humilhado por sua pouca profundidade. Se continuasse nesse ritmo, preocupava-se Santo Jorge, teria de marcar uma dúzia de reuniões para evitar que os tais buracos acabassem se revoltando e invadindo as calçadas ou as assembleias fantasiosas e pirotécnicas da OP.
Tanto o bobo das obras como todos os membros da seleta e numerosa corte de sua alteza sabiam que a intenção da rainha era perpetuar os buracos no asfalto por muitos meses ainda. Essa era a estratégia preferida de Poliana. Criar e propagar o caos até que os súditos se vissem a beira da loucura. Como fora feito com o fechamento das rótulas do reino. Criou-se um problema que não existia, para depois apresentar a solução óbvia, que não seria necessária se Poliana e sua trupe não tivessem enfiado o dedo e azedado o mingau. Mas a mesma tática continuava valendo para a companheirada. Quando a situação da buraqueira estiver próxima do colapso, Poliana e sua corte entrarão em cena e colocarão mãos a obra. Farão em poucos meses – meses próximos ao término de seu reinado, é claro – tudo o que não fizeram em tantos e longos anos. E venderão aos fieis súditos, com muito marketing, mídia e ilusão de ótica, que apenas a benevolente Vontade Política - a varinha de condão de Poliana - seria capaz de solucionar rapidamente um problema tão grave e urgente para seu povo. Os desesperados contribuintes se sentirão tão aliviados por poder, finalmente, trafegar nas ruas do reino com um mínimo de conforto e sem os desgastantes solavancos e veículos avariados, que até se esquecerão de que todo o prejuízo fora causado pela incompetência e inércia de sua majestade em investir o suado dinheiro dos impostos pagos pelos súditos na repavimentação das vias. E Poliana será, novamente, carregada nos braços como a rainha mãe dos tapa buracos. Quem não é capaz de seguir a lógica apurada da rainha, jamais terá condições de compreender o complexo ideal socialista de Poliana e sua turma.
Este buraco que vês, com metro medido. É a conta menor que pagaste em vida. É de bom tamanho, nem largo, nem fundo. É a parte que te cabe de todo imposto imundo. E ao asfalto “dado”, não se abre a boca. São as vias que querias ver corrigidas. É a utopia que querias distribuída.”- cantam em uníssono os engajados e socialistas companheiros da rainha.

sábado, 5 de abril de 2014

As manobras radicais de Poliana e sua corte


A turma de Poliana tivera uma semana repleta de reuniões. Primeiro foram as dezenas de reuniõezinhas marcadas por Santo Jorge, motivo de piadinhas na corte. Até os companheiros mais fieis ao sindicalismo útil, já estavam fartos de tantas reuniões agendadas pelo bobo das obras. O homem estava sendo chamado pelo povo de Exu Tranca Rua. Nada mais andava na pasta. Tudo empacava em alguma encruzilhada. E absolutamente tudo tinha de ser decidido, é claro, em alguma reunião. Era uma reunião para cada buraco no asfalto a ser coberto de pó de brita. Outra reunião só para as bocas de lobo entupidas. Cada balanço avariado nas praças do reino demandava horas de discussões, e folhas e mais folhas de atas. O bobo das obras, sempre disposto a mostrar trabalho, agendava uma reunião a fim de marcar outra reunião, para definir a pauta da próxima reunião. Resumo da ópera: nada saia do seu gabinete a não ser papeis inúteis e conversas improdutivas. E os contribuintes queixavam-se da morosidade na execução de pequenos consertos corriqueiros. Pois até a cor das tão propaladas ciclovias fora motivo de polêmica nas tais reuniões participativas. No mundo todo as ciclofaixas eram vermelhas. Pois, apenas para polemizar, e em nome do debate democrático, participativo e inútil, Santo Jorge - o Exu Tranca Rua e distinto bobo das obras - teimava em pintar as faixas de verde. Foram necessárias mais de uma dúzia de reuniões, encontros com técnicos da área e ciclistas profissionais, para convencer sua entidade de que era conveniente obedecer o padrão internacional de cores das ciclovias. Santo Jorge - o daltônico - emburrou, reclamou, criticou, esperneou, mas vencidamente aceitou. Não sem antes marcar uma pequena reunião com Imprensa Livre para explicar sua decisão. Que maravilha um reinado assim tão democrático, onde se leva meses de debates inúteis para no fim se decidir o óbvio.
Já no novo ciclo de reuniões da Orquestra Partidária - OP - as coisas iam de vento em popa. Recorde histórico de público em uma das assembleias na região central do reino! Para desilusão da companheirada. Desilusão? Não é o sonho dos companheiros que o povo participe e se manifeste?! Claro que sim! - grita Poliana e sua corte nos outdoors e na mídia. Ocorre que mais de quatrocentas pessoas, das quinhentas que frequentaram esse espetáculo participativo, não tinham vínculo com seu clã e não almejavam as demandas pré-fabricadas da corte da rainha. Uma gentinha alienada, que não tem a menor compreensão do processo democrático de participação previamente estabelecido pela corte, se achou no direito de manifestar suas reivindicações. Gente ignorante que ousou votar por melhorias nas escolas públicas, mais vagas em creches e calçamento de ruas, quando a luta legítima da companheirada, que mama comodamente nas tetas públicas, era por pistas para os skatistas. Os alienados, ignorantes e elitistas, ganharam no voto demandas ridículas e estúpidas, como melhores escolas. Os companheiros engajados com as causas sociais, os skatistas, socialistas das tetas públicas, se lamuriavam nas redes sociais pela falta de compreensão dos alienados – provavelmente elitistas e burgueses reacionários, ou jovens tolos e manipulados - do verdadeiro papel desses espaços democráticos. Afinal, um povo sem skate é um povo sem futuro! Escola é adereço supérfluo da elite golpista! - gritam os companheiros socialistas, com as camisetas do Guevara meio rubras de vergonha.
E para terminar a maratona semanal de reuniões, uma reunião extraordinária convocada pela rainha. O objetivo era claro e límpido. Os novos e tão esperados posicionamentos de Justiça garantiam a rainha muitos meses de enrolação. Com isso, era fato: a companheirada não sairia mais do poder. Todos os fios estavam alinhavados e as propinas asseguradas. Agora era urgente restabelecer o Polianoduto, quase hibernante no último ano. Poliana dera a largada. Seus bobos podiam, novamente, se jogar como porcos no dinheiro público, sem medo de Oposição. Era preciso reativar antigas alianças. Refazer as falsas e lucrativas impressões. Qualquer cobrança ilícita de licença ou alvará estava autorizada, desde que a transação não fosse feita por conversas telefônicas, alertava a ressabiada rainha. Sua alteza, muito mais experiente e cautelosa, aconselhava seus companheiros: peguem apenas o que caiba nos bolsos, meias ou cuecas. Por favor! Nada de pedras, rochas ou o mastro da bandeira. O chafariz, então, nem pensar! Justiça, por hora, está do nosso lado, mas não é conveniente cutucar demais a velhota. De resto, aproveitem companheirada! A temporada da fartura está reaberta, anuncia Poliana, especialista em socializar com seus pares o dinheiro dos contribuintes.