sábado, 29 de setembro de 2012

A caçada a Poliana


Recostada nas almofadas, exaurida de todas as forças, Poliana acompanhava entorpecida o diálogo travado entre seus fieis parceiros de locupletações.
- Não sei não, companheirada. A coisa pode ficar feia desta vez.
- Bobagem. Nós já passamos por estradas mais esburacadas e pedregosas antes. Sempre tem alguém para tirar as maiores pedras do nosso caminho.
-Você quer dizer roubar as pedras, né companheiro – ironiza a cansada Poliana. – Se vocês não se atirassem que nem porco em lavagem em qualquer oportunidade de chafurdar na coisa pública, eu não estava nessa situação.
- Nós sabemos rainha. Agora aprendemos a lição. Nos próximos anos seremos mais cuidadosos. – afirma um dos asseclas, não parecendo muito arrependido.
- Não adianta ficarmos chorando sobre o lixo derramado. Temos de arrumar uma forma de continuar empurrando a sujeira para baixo do tapete por mais algum tempo.  O importante é que nosso clã é sempre muito unido. Uma mão lava a outra e as duas juntas lavam muito mais dinheiro sujo. Esse é o nosso lema. Essa é a nossa marca!
- E esse é meu jeito de governar! – Poliana, sonolenta, repete o jargão que era obrigada a dizer centenas de vezes na sua atribulada maratona em Horário Eleitoral.
- É só uma questão de interpretação e de que lado da sujeira você está. Se a imundice está do nosso lado é sempre perseguição, ou modernamente denuncismo. Nós não roubamos, apenas cometemos erros. – acrescenta um assessor folhando a cartilha do grande clã.
 - Mas nós já falhamos em tentar tirar Justiça da nossa cola. A coisa tá ficando preta até pra nossos mestres mensaleiros. Eu tô começando a ficar preocupado com o rumo que isso está tomando. Vocês já pensaram se o povo das bandas de cá resolve aderir a essa onda de moralidade? Vai ser nosso fim.
- Não tem problema, Justiça não está com essa bola toda por aqui. Ela se acha muito engraçadinha, mas não é páreo para nós.
- Nem Oposição é páreo para Poliana. Vocês viram a enorme popularidade da rainha?! É inacreditável!
- É inadmissível, isso sim! Eu devia ter tido índices muito maiores naquela pesquisa seus molóides! - indigna-se Poliana, que já estava quase adormecida – Vocês esqueceram que a tal pesquisa foi feita entre nossa militância? Tem gente do nosso time jogando contra mim, e quando eu descobrir quem são aí sim a coisa vai ficar preta. - ameaça sua alteza, entre um bocejo e outro.
- Nenhum de nós seria capaz de trair nossa rainha! – apressa-se em afirmar um representante da Irmandade do Fogo. – Nós seguiremos nossa majestade até o fim! Não vamos abandonar o barco. – acrescenta sem muita convicção.
- Assim eu espero. – continua Poliana, recostando-se ainda mais nas almofadas, pronta para um cochilo.
- Como eu dizia, nós só precisamos enrolar os súditos por mais poucos dias. Justiça nós vamos conseguir enrolar por anos a fio. Vai dar tempo de Poliana se aposentar.
- Acho que nossa estratégia de marketing está excelente. Precisamos continuar nos fazendo de vítimas perseguidas por uma Oposição sem princípios. O povão quase vai as lágrimas quando Poliana assume o papel de Joana d’Arc populista.
- E essa história de terrenos e desapropriações? Como vamos justificar?
- Reforma agrária, é claro. E se não funcionar vamos dizer que até nisso somos melhores que Oposição. A simplória recalcada não sabe nem superfaturar direito! Quando se trata de superfaturamento nós somos imbatíveis.
- Vocês não acham que devíamos ter um plano B, para a remota possibilidade de Poliana tropeçar e cair nas mãos da intolerante Justiça? – questiona um dos bobos, abaixando o tom de voz para não ser ouvido por sua adormecida rainha.
- Já estamos trabalhando nisso, companheiro. - cochicha uma das velhas raposas da Irmandade do Fogo – Se todo o lixo dos impressos soterrarem nossa adorada rainha, nós riscamos o fósforo e vamos adiante!  Tenho certeza - acrescenta em tom de troça- que Poliana nem vai reclamar em se tornar a Joana d’Arc de nossa boa causa.

Alheia a sorrateira conspiração que lhe cercava, Poliana dormia a sono solto em seu adorado castelo de ilusões. Dormia e sonhava. Em seu sonho corria desembestada por ruas cheias de buracos, pedras e pardais. Perdida em tantas rótulas e desvios, não conseguia encontrar seu castelo para alcançar seu adorado trono. Estava sendo caçada! Uma Justiça irônica e deformada estava em seu encalço. Preocupada em fugir da perseguição ferrenha de Justiça, nem percebia o que as sombras de seu reino escondiam. Camuflados, atrás dos arbustos, estavam alguns de seus aliados e parceiros. Munidos de traições, esperavam a hora certa de abater sua, até então conveniente e lucrativa, rainha. Aterrorizada, Poliana acorda. “Ainda bem que foi só um pesadelo.” Nenhum de seus confiáveis amigos ousaria trair a popular e crédula Poliana. – pensa sua majestade, voltando a seu mundo de sonhos e fantasias.

domingo, 23 de setembro de 2012

Poliana segue seu rumo


Poliana tentava manter um andar altivo enquanto atravessava a multidão de admiradores que se aglomerava a sua frente. Sorria, orientava sua assessoria. Continue acenando e mandando beijinhos, estimulava um dos bobos reais. São só mais meia dúzias de criancinhas para carregar, rainha. - incentivava o marqueteiro. Para seus asseclas parecia tudo muito simples, pensa Poliana lutando para não gemer de dor a cada passo. Maldita seja essa tal semana Farroupilha! Precisava se lembrar no futuro de abolir de vez essa época de seu calendário de eventos. Para mostrar a seu povo o quanto seu reinado compartilhava do espírito aguerrido dos gaúchos, sua majestade fora obrigada a passar por intermináveis sessões de fotos e filmagens travestida de prenda farrapa. Em farrapos ficara seu entre pernas, isso sim! – lastima-se Poliana. Se pelo menos tivessem lhe dado um pangaré menos pançudo para montar! - resmunga, procurando manter o sorriso sofrido nos lábios. Seus quartos estavam em frangalhos. Mas o pior ainda estava por vir, suspira a monarca. Mais um belicoso confronto com Oposição lhe aguardava em seguida. Quisera conseguisse se esquivar das chicotadas da rançosa Oposição com a mesma desenvoltura com que desviara de toda bosta de vaca que estivera em seu caminho nesses últimos dias.
- Vamos recapitular suas respostas rainha? - sugere o marqueteiro, aproveitando cada parada para preparar sua alteza. - É preciso que você demonstre naturalidade e segurança na hora de enfrentar Oposição.
- Eu não preciso ensaiar nada. Eu sei muito bem o que tenho de dizer. Eu sempre falo e faço tudo de improviso. Esse é o meu jeito de governar. – afirma Poliana, convicta, continuando a caminhar.
- Já começou errado Poliana! Você não pode admitir que nós decidimos o futuro do reino só nos seus achismos, sem estudos ou embasamento. Assim Oposição vai deitar e rolar! – alerta um membro do clã.
- Não tem nada de achismos! Eu sou muito séria nas minhas resoluções. Não faço nadinha sem consultar o horóscopo do dia. E para decisões importantes, como as modificações no trânsito, por exemplo, eu tenho uma cartomante que é show de bola! Esse é o meu jeito de governar. E vamos adiante! – segue Poliana, entre beijos e abraços de seus sempre fiéis militantes.
- Você precisa ter algumas frases de efeito para usar quando Oposição enveredar para o esburacado caminho da imoralidade, rainha. – aconselha um dos pajens reais.
- Isso é fácil. Olha só: “o povo não quer saber disso, Oposição!” – repete Poliana, torcendo a boca em escárnio, para deleite de sua assessoria. – O povo gosta é de novela e futebol. Você e essa sua onda de denuncismos tolos! – acrescenta em tom de pirraça - Isso é só uma marolinha, Oposição. Tem um tsuname ainda por vir, mas nós vamos adiante! – exulta a rainha, batendo com o punho no peito.
- Excelente Poliana! Que tirada! – aplaude um dos bobos.
- E quanto a todos aqueles processos judiciais envolvendo seus amigos e companheiros, rainha? – continua o marqueteiro imitando Oposição.
- Isso é apelação! - ironiza a monarca – Nós vamos apelar até a última instância, Oposição! Vamos enrolar essa sujeira por anos. Esse é o meu jeito de governar! E, ao contrário do que andam dizendo, nós vamos adiante! Nem Justiça vai nos impedir. Se os mensaleiros engambelaram Justiça por anos, imagina o que eu e meu alinhamento fisiológico faremos nesse reininho interiorano. Justiça vai ter que me engolir! – acrescenta Poliana, com pose de Zé Dirceu.
- Maravilha! É assim que se fala rainha. E que palavras você tem para falar de honestidade?
- Eu não tenho palavra nenhuma. Nem sei do que você esta falando Oposição. A única palavra que eu lembro é desespero. – interrompe-se a rainha para corrigir em seguida – O seu desespero, é claro. Você só sabe dar chute nas canelas e bolada nas costas. Eu não sei ser assim. Eu só gosto de bolada nos bolsos. É assim que eu sou, e esse é o meu jeito de governar!
- E quanto ao bom uso dos recursos públicos? – instiga um pouco mais o marqueteiro.
- Nós usamos muito bem os recursos públicos! Você tem que ver o piso lá de casa. E a banheira, então? Uma belezura! E tem mais, deixar que alguns amigos metam a mão no dinheiro do contribuinte, não tem nada a ver com má gestão. O povo não se importa com isso. Só Justiça que dá bola para essas miudezas e ninharias. – esclarece Poliana afetadinha. - E tem mais, olha o nível, Oposição! - continua sua alteza, no seu tão bem ensaiado papel - Não me meça por sua régua, viu. - acrescenta com olhar enviesado - O meu reinado é medido por taquaras. Taquaras! E você conhece bem o tamanho das minhas taquaras. - conclui a rainha para uma assessoria deslumbrada.
- É isso aí, rainha! Oposição já está quase morta! - anima um companheiro, já na ante-sala da arena de debates.
- Muito bem, alteza. Oposição está quase desistindo! - berra um militante para o séquito que avançava.
- Falta pouco, rainha! Oposição já esta quase se afundando! - grita outro admirador.
- Obrigada meus bobos! - agradece a rainha, olhando afobada para os lados e sussurrando para o assessor mais próximo - Onde é que fica o banheiro? Eu já estou quase me cagando! Rápido! Vamos adiante! - ordena a sudorética rainha, andando desengonçada para o reservado.

sábado, 15 de setembro de 2012

Plantam-se bandeiras, colhem-se propinas


Sentados em torno da mesa, o estrelado grupo de bajuladores reais faziam uma avaliação crítica dos rumos da turnê a Horário Eleitoral. Poliana descansava em seu trono, enquanto um de seus pajens massageava-lhe os pezinhos calejados pelas intermináveis andanças na esburacada periferia do reino. Talvez devesse ter gasto mais em calçamento e asfalto, e menos em propaganda enganosa e ilusão de ótica. - pensa a rainha exausta, enquanto ouvia a discussão de seus bobos.
- Eu disse pra vocês companheirada, não é bom cutucar Oposição com vara curta. - alerta um dos membros do MSTT (Movimento Só Tramóia e Trago), puxando a camiseta vermelha para cobrir melhor a barriga. – Não podemos dar motivos para réplicas de Oposição.
- Que vara curta o quê?! Vocês já viram o tamanho das nossas taquaras? – pergunta um líder do SindiPelego, impressionado.
- É mesmo, eu nunca vi nada assim tão grande. Onde é que nosso clã consegue aquelas coisas enormes? Parece negócio de outro mundo. – concorda uma velha matriarca do grande clã.
- São importadas de Cuba, nossa ilha de fantasias, é claro. Nós temos uma plantação de taquaras geneticamente modificadas por lá - esclarece o camarada Boina Verde.
- Eu acho isso o fim! – intromete-se Poliana, como sempre injuriada. - Com toda a propaganda enganosa que andamos espraiando pelo reino, Oposição foi ficar impressionada com uma coisinha tão sem brilho ou esplendor como as nossas taquaras. De que adianta investir tanto dinheiro em marketing e photoshop, afinal?!
- Nem dá bola, rainha. Oposição é uma despeitada, isso sim. Ela morre de inveja do tamanho das suas taquaras, Poliana.
- E de quem foi a idéia de colocar aquelas pessoas na TV, dizendo que seguram as taquaras de Poliana por amor a nossa carismática rainha? – pergunta um membro da Irmandade do Fogo - Sei lá, mas elas não pareciam muito entusiasmadas com nossa causa.
- Os tempos são outros, meus amigos. – suspira o camarada Boina Verde, nostálgico. Antigamente tínhamos militantes cegos, mas gratuitos. Hoje precisamos pagar para cada bandeira erguida. E ainda temos de fornecer as taquaras! Pelas barbas de Fidel, o que o capitalismo selvagem e o neoliberalismo fizeram com nosso povo?! – exalta-se a velha estrela.
- Não foi o capitalismo, camarada. Foi o mensalão e nosso oportunismo sem limites, seu bobão. – elucida Poliana, a socialite socialista.
- Eu gostei daquele programa onde mostramos como nosso reino está florido e perfumado.- interrompe um dos bobos da corte - Eu nem sabia que tinha sido você, rainha, que havia inventado a primavera! Como você é ardilosa Poliana.
- Modéstia a parte companheiro, mas até os Ipês me idolatram! E por falar em perfume, ainda bem que a esclerosada Oposição esqueceu os tempos em que nós nos afundamos em lixo e chorume. – agradece sua alteza, erguendo as mãos para o céu.
- Oposição também esqueceu as enormes e desumanas filas do desrespeito nas casas de saúde, da falta de remédios e curandeiros, e da agonia dos doentes que esperam por...
- Nem eu sei do que você está falando, seu estúpido! – irrita-se Poliana. - Quem convidou esta toupeira para a reunião! - grita a destemperada rainha.
- Ele é um dos membros da OP (Orquestra Partidária), rainha. - cochicha um dos asseclas reais.-  Veio aqui para dar sua opinião e expor algumas demandas de sua comunidade.
- Se quer expor alguma coisa, vai expor uma dúzia de nossas bandeiras na sua casa, viu?! Agora não é hora dessas bobagens de confronto de idéias e opiniões. Agora, é hora de balançar a cabeçinha pra baixo e pra cima, viu? Assim! - demonstra Poliana, intimidadora.- Diga: sim! Assim! E vamos adiante! - ordena a sempre popular e democrática monarca.
- Eu achei muito boa a imagem da Poliana gaudéria. - interrompe, conciliador, um dos presentes - Você parece a reencarnação da Anita Garibaldi, alteza!
- Nossa equipe de marqueteiros está trabalhando na idéia de que foi nosso clã que inventou o orgulho gaúcho também. Aguardem! – esclarece Poliana, fazendo mistério.
- O que me preocupa, é que Oposição não esquece como nós chafurdamos em escândalos. - lamenta um companheiro, apreensivo.
- Isso aí é bobagem! Nosso povo não liga para essas tolices. – afirma Poliana -  Nós ergueremos cinqüenta taquaras para cada propininha que recebemos nesses anos. Para cada alvará ilegal: vinte taquaras! Para cada pedra afanada: duas taquaras! Para cada semáforo e lombada eletrônica que deixamos de lucrar: cinco taquaras! Para cada vaga de estacionamento: uma taquara! Para cada outdoor e panfletinho superfaturado: duas taquaras!
- Meu Deus! Aonde vamos arrumar tanta taquara, Poliana? – questiona um companheiro, pálido de preocupação.
- Não sei. Virem-se, seus molóides!  Compra e venda de popularidade é serviço de vocês. – sentencia sua majestade, anunciando em seguida: Agora eu vou gravar um dos nossos programetes em frente ao novo MacDonald’s. Nós vamos anunciar ao nosso povo que essa foi mais uma obra de meu empreendedor reinado. Uma demanda reprimida da OP, nossa fantástica ferramenta de participação popular! Isso é oportunismo e esse é o meu jeito de governar! - conclui, satisfeita, nossa astuta monarca. 

sábado, 8 de setembro de 2012

Poliana - a donzela ofendida


A compenetrada Poliana ensaiava em frente ao espelho o novo papel que desempenharia logo mais em Horário Eleitoral. Era preciso fazer cara de indignada, aconselharam seus marqueteiros. Uma indignação contida e com pitadas de benevolência. Precisava passar a seus súditos um ar angelical, quase virginal, assim todos se revoltariam com Oposição por ousar deflorar a imagem de uma rainha tão doce e contida. Até seus bons e velhos bobos da corte, acostumados a presenciar as incontáveis crises de histeria e descontrole de sua alteza, comoviam-se com essa nova Poliana que se apresentava em frente as câmeras.
- Eu hoje acordei um pouco revoltada. - começa a rainha, pousando candidamente as mãos sobre o colo – Não posso mais agüentar as calúnias e difamações que a rancorosa Oposição joga sobre mim. – comove-se Poliana já com os olhinhos de biscuit lacrimejantes. – Eu não consigo entender por que ela age assim! - soluça - Eu sempre a tratei com tanto tato e educação. Eu não tenho culpa de ser tão carismática e adorada por meu povo. Jamais imaginei que causaria tanta inveja a pobrezinha.
- É realmente lamentável tal comportamento, rainha. - interrompe o marqueteiro, com ar de desgosto, seguindo atentamente o script - O que mais magoa sua alteza com essa atitude mesquinha de Oposição?
- Esse negócio que ela anda falando sobre honestidade, é claro!É uma afronta!- continua Poliana, empertigada e com o queixo trêmulo de desgosto.
- É verdade, majestade, a senhora deve sentir-se muito ofendida com esses insultos. – lamenta pesaroso o marqueteiro aproveitando a deixa.
- Ofendida, não.Ultrajada! Oposição se acha grande coisa só por que descobriu meia dúzia de pequenos delitos cometidos em meu reinado de oportunistas. Nós já fizemos cada picaretagem maior e mais inteligente que essas tolices que ela fica jogando na minha cara. Ela certamente subestima minha astúcia e de meus bobos. Mas isso não vai ficar assim, viu Oposição! – acrescenta a monarca com o dedo em riste, olhando ameaçadoramente para as câmeras.
- É importante, rainha, que a senhora esclareça que nunca houve prejuízo para seus súditos nesses roubinhos sem importância.
- É isso mesmo. Quando nos pegaram em flagrante surripiando o que não era nosso, nós prontamente devolvemos. Por tanto não foi crime. Tentar roubar não tem nada a ver com honestidade, não é mesmo? Isso é oportunismo! Esse é o meu jeito de governar. -  completa a monarca, cruzando os braços sorridente. - O que é realmente lamentável é ser pego! Isso sim é o fim. – suspira Poliana continuando seu desabafo. – Outra coisa que me revolta é essa distorção que Oposição faz dos fatos. Burlar a lei para favorecer um companheiro é amizade. Pura lealdade, isso sim. Eu não consigo ver o que Oposição acha de errado nessas pequenas coisinhas. São apenas desvios éticos, como costumamos chamar no nosso clã de sanguessugas.
- E não houve qualquer dano aos cofres públicos?
- Dano nenhum. Meus adoráveis contribuintes nem se deram conta da falta de algumas moedinhas reais. O que são algumas centenas delas para um reino tão rico como o meu. Esse meu povo é muito solidário e compreensivo e tenho certeza que não pretende aderir a esse modismo tolo de ética e austeridade que anda rondando por aí.
- É bom salientar que a senhora afastou prontamente todos os envolvidos nesses errinhos básicos, não é mesmo?
- Claro que sim! Expulsei todos do castelo, imediatamente, logo após ter recebido as ordens da impiedosa Justiça. Eu não sou boba de desobedecer Justiça, né? Afinal, eu já tenho enroscos suficientes com esta aí também. – acrescenta Poliana dando uma piscadela marota para as câmeras. - Por falar em Justiça, essa foi outra decepção na minha vida. Parece ter sido contagiada com esses discursinhos populistas de ética e integridade. Nos últimos tempos deu de recriminar, com pose de doutora da retidão, até mesmo meus padrinhos mensaleiros! Um total disparate! – prossegue a altiva rainha mantendo a pose de monarca ofendida.
- E, com toda sua benevolência Poliana, existe algo que você gostaria de dizer para Oposição, sua infame e desleal perseguidora?
- Eu quero pedir a Oposição que me deixe em paz. É melhor parar de me provocar. Você não sabe do que sou capaz, viu Oposição? – ameaça a rainha com os olhinhos de biscuit faiscantes - Eu posso resolver atacar também, hein? – acrescenta olhando firmemente para a câmera. - Se você achou que meter a mão em uma pilha de pedras, favorecer a companheirada e superfaturar uns panfletinhos era imoral, você ainda não viu nadinha! Você não perde pra ver o que eu consigo fazer com algumas continhas no banco e duas dúzias de laranjas. Ninguém é páreo para a poderosa Poliana! – conclui a rainha lançando um último olhar mafioso para as câmeras e fazendo até o marqueteiro suar frio.

sábado, 1 de setembro de 2012

Poliana Paz e Amor


O ambiente das gravações estava enfumaçado pelos incensos, tornando o ar quase irrespirável.  No chão, sobre coloridas almofadas, vestindo longas saias ciganas e lenço na cabeça, estava Poliana – a monarca paz e amor.
- Polianinha, querida, seus ouvintes gostariam de saber como é a Poliana pessoa?
- Eu sou muito amável com meus súditos. Gosto muito das pessoas. Sempre procurei trabalhar cercada de muita gente. Por isso tenho tantos bobos e pajens a minha volta, sempre a me bajular. E eu amo as criançinhas também! Principalmente aqui, em Horário Eleitoral, onde todas são tão comportadas e limpinhas. Não sou de dar chutes na canela, como uns e outros por aí. – lastima Poliana, cruzando os braços com pose de virgem ultrajada.
- Então é por isso que você, amadinha, tem se empenhado tanto para transformar seu reino num bom lugar para seus súditos!Que adorável de sua parte! – adula o marqueteiro meloso - E quais foram as ações que você, alteza, mais se empenhou com essa sua generosa mente de rainha?
- A minha primeira ação como monarca foi a criação de empregos. Isso sempre foi uma prioridade para mim. Por isso, criei o PROUCA – Programa Um Carguinho por Apadrinhado. Com esse inovador programa de inclusão de velhos amigos em confortáveis troninhos públicos, conseguimos a geração de dezenas de empregos. E o melhor de tudo: tudo pago por nossos fieis contribuintes! – vangloria-se Poliana, cruzando os braços com cara de soberana séria.
- E como se deu a seleção para a harmoniosa distribuição desses carguinhos em seu império, rainha?
- Foi um complexo processo de seleção elaborado por experientes raposas de nossa aliança integrada e integradora. Critérios muito rígidos foram seguidos para que se fizesse o melhor uso dos empregos públicos. Atribuímos uma escala criteriosa de valores para o currículo dos candidatos e apenas os melhores colocados foram contemplados com esse benefício.
- Deve ter sido muito penoso para a sensível rainha, deixar tanta gente de fora dos desejados empreguinhos públicos. – acrescenta pesaroso o apresentador.
- Na verdade foi muito fácil, fofinho. Não ficou nenhum aliado de fora. Todo candidato a uma teta pública que abanou uma bandeirinha já conseguia nota oito. Mesmo que fosse em GreNal. Sabe como é, nós adoramos um bom circo para agradar o povão. Se tivesse freqüentado alguma churrascada ou pão com lingüiça na periferia, era mais um ponto no currículo. E você sabe como são mortos de fome a companheirada, né? E para finalizar a seleção, cada candidato preenchia um termo de compromisso de que participaria assiduamente de todas as tediosas reuniões da OP (Orquestra Partidária). Assim, conseguimos acomodar todos nossos amigos nos carguinhos públicos. E nossos adoráveis contribuintes nem reclamaram! Esse é o nosso jeito de governar! – conclui a benevolente Poliana, cruzando os braços e piscando maliciosa para as câmeras.
- Nossa, eu estou realmente impressionado alteza. Mas, mudando de assunto, como seu reinado tem enfrentado a confusão do trânsito de nosso reino?
- Confusão esta fazendo você, seu ignorante! - irrita-se a rainha, esquecendo o papel de riponga sequelada  - O tráfego em meu reinado é rápido e fluído, como meu trânsito intestinal antes dos debates na TV! Só você, Oposição, e os transeuntes é que não conseguem perceber isso! – indigna-se Poliana, mostrando os já conhecidos sinais de destempero e cruzando os braços emburrada.
- Mil desculpas, alteza! Eu certamente não me expressei bem. Eu prometo seguir o script daqui para frente. – acrescenta rapidamente o sudorético entrevistador - Aqui diz que ao invés de confusão no trânsito eu devo usar as palavras: maravilhoso projeto de mobilidade urbana. Vou reformular a pergunta: do que se trata esse maravilhoso projeto de mobilidade urbana - salienta bem o marqueteiro oficial - implantado de forma tão competente e tecnicamente sustentada por seu grandioso reinado de oportunidades, Poliana? Como foi realizado o estudo técnico para implantação de todas essas melhorias no trânsito?
- Foi tudo muito simples. Eu juntei os primeiros quatro bobos da corte que cruzaram o meu caminho e juntos definimos quais ações deveriam ser executadas. Nós fechamos uma rua aqui, outra lá... bloqueamos um cruzamento acolá, jogamos uns vasos no meio da rua para enfeitar a balburdia... Foi tudo muito divertido. Depois de tudo pronto nós contratamos uma empresa especializada para concordar com nosso projeto. Como os tais especialistas discordaram da minha idéia de trânsito seguro, eu engavetei o projeto! Tudo com o patrocínio de nosso paciente contribuinte, é claro. Essa sou eu! Magnânima! Esse é o meu jeito de governar. – acrescenta a rainha, altiva e sorridente, cruzando os braços pra câmera.
- E quais são as novas ousadas ações que a senhora pretende colocar em prática para a trafegabilidade do reino?
- Nós já estamos tomando medidas extremas, inovadoras  e originais, nos cruzamentos mais perigosos do reino. – continua Poliana, cruzando os braços com ar de séria e preocupada monarca.
- Vão tirar, finalmente, aqueles vasos do meio da rua? – pergunta entusiasmado o marqueteiro.
- Claro que não, seu bestalhão! Aqueles vasos são adorados pelos motoristas. Tornaram nosso trânsito mais ecológico e bucólico. Nossas novas medidas são muito mais drásticas. Estamos colocando semáforos! – exulta a rainha, cruzando os braços com cara de espertalhona - Sim! Semáforos!
- Que bom rainha! Com novos semáforos em locais de maior fluxo evitaremos acidentes! Brilhante idéia, Poliana!
- Não é bem isso. Nós estamos colocando semáforos onde já existiam semáforos. Ia ser muito complexo colocá-los em locais novos e problemáticos. Colocamos sinaleiras mais luminosas e brilhantes. Assim, a colonada de nosso reino fica tão fascinada com aquelas luzinhas piscando, que nem presta atenção em todos aqueles buracos no asfalto. Esse é o meu jeito de governar! – salienta Poliana,  cruzando os braços e sorrindo deslumbrada para as câmeras.