sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Os maleáveis pelegos da rainha


- Eu disse Poliana, que isso não podia dar certo! Participação popular é coisa de Horário Eleitoral, não deve ser levada ao pé da letra. Agora veja o imbróglio em que nos metemos?! - lastima-se um companheiro dos movimentos sociais.
- É isso mesmo! Olha esses súditos da rainha, se achando grande coisa. Pensando que tem o direito de questionar as decisões da alteza, salários melhores e outros absurdos. Quem foi que deu liberdade pra essa gente se manifestar como se isso aqui fosse uma democraciazinha qualquer? – exalta-se um democrático representante da FarsaSindical.
- Daqui a pouco vão acreditar que podem lutar por melhores condições de vida e pela moralidade no reinado! É o fim dos tempos, Poliana! Precisamos tomar providências urgentes! Temos que por fim nessa marolinha antes que vire um Tsunami! – exige um honorário membro do CUT (Companheiros Unidos no Trambique).
- Tudo era tão harmonioso e produtivo quando as discussões só ocorriam entre nossos adestrados militantes. - choraminga, saudosa, uma ilustre fundadora do grande clã - Confronto de idéias só funciona quando todos concordam com a nossa doutrina, Poliana. Os debates são sempre grandiosos quando a platéia é submissa e alienada. Não podíamos ter dado espaço para essa gente com opinião própria falar. Agora nosso reinado democrático virou um circo!
- Olha o absurdo da situação! Uns serviçais ingratos exigindo igualdade! Igualdade! Querem se igualar a quem? A nós? – questiona injuriado um dos bobos da rainha.
- Essa gente sem noção, tem a cara de pau de reivindicar melhorias salariais e um tal plano de carreira. Falam em progressão e mérito para todos. Todos! Como se isso tivesse cabimento. Estão contaminados por ideais capitalistas e reacionários. – indigna-se outro ortodoxo sindicalista.
- Eles deviam erguer as mãos pro céu por terem a graça de ter sua alteza como soberana. E por terem a nós do SindiPelego para aturar suas lamúrias. Ao invés de nos agradecer, têm a coragem de nos contestar e exigir explicações de nossos atos obscuros. Tiveram a audácia de nos convidar para participar de uma assembléia com representantes dos serviçais da rainha. Uma reunião aberta, onde qualquer um podia chegar, falar e questionar.
- E como foi a tal reunião? – pergunta Poliana apreensiva.
- Nós não fomos, é claro. Não somos trouxas rainha. Todos aqui sabem bem que não devemos jamais freqüentar lugares onde indivíduos sem cabresto ideológico ou o rabo preso com nosso reinado, possam se manifestar. Diálogo franco e olho no olho só ocorre em Horário Eleitoral, onde tudo pode ser manipulado e editado.
- E o que vocês fizeram para remediar a situação, meus adoráveis bobos da corte?
- Nós nos esforçamos ao máximo, alteza! – salta eufórica a presidente do SindiPelego, ansiosa para agradar sua majestade. - Ameaçamos, coagimos, boicotamos, mentimos, atraiçoamos, difamamos, caluniamos... Usamos todas as armas disponíveis para evitar que essa tropa covarde se reunisse.
- E... – aguarda Poliana em expectativa.
Cabisbaixa e constrangida, a bajuladora do SindiPelego responde:
- Falhamos, rainha. A tropa desembestou de vez. Quanto mais nos empenhávamos em cabresteá-los, mais eles se rebelavam. Uniram-se, os covardes, em asquerosa matilha, prontos a lutar pelo que acreditam. Não colocaram os rabinhos entre as pernas como acreditávamos. São mesmo uns mercenários! Só pensam nessa utopia ridícula de igualdade e justiça. Parecem crer de fato que unidos vencerão.
- Como é que vocês permitiram que esse povo todo se encontrasse! O papel do SindiPelego é justamente enrolar a patuléia e fazê-los acreditar que estão representando os interesses deles, quando na verdade vocês estão defendendo as nossas conveniências. – irrita-se Poliana.
- Isso tem o dedo sujo de Oposição, Poliana! Só pode ser. – defende-se prontamente um dos presentes. – Quem colocaria essas tolices nas cabeças vazias dos serviçais? Igualdade, justiça, cidadania, democracia, salários dignos... Quem mais poderia ter dado essas idéias sem cabimento a essa turminha de baderneiros desocupados?
- Nós! – grita Poliana exasperada.- Fomos nós, seus estúpidos! Nós que pregamos por anos a idéia de que quem detinha o poder explorava os subalternos! Nós que vendíamos o ideal de justiça social e incitávamos a luta de classes! Nós que propagávamos a participação popular! Nós que incentivávamos a união coletiva e a luta por cidadania! Nós que orquestrávamos a organização dos trabalhadores! Só que hoje, seus molóides, nós somos os donos do poder e das riquezas. Nós temos a chave do cofre! Nós detemos o mando do campo! Nós é que estamos sentados confortavelmente no trono, e da coisa pública nos locupletamos! Nós podemos decidir e não podemos mais jogar a culpa em Oposição! Vontade política está em nossas mãos, cabe apenas a nós fazê-la funcionar. Nós criamos o monstro e não sabemos como amordaçá-lo!
Uma Poliana desiludida observa a constelação servil a sua frente. Em momentos como este se questionava se não fora longe de mais nas pregações de Horário Eleitoral. Agora teria de beber de seu próprio veneno, e não conseguia achar ninguém para por a culpa dessa vez.
- Mas, Poliana, o que vamos fazer? Tem que haver uma solução. – choraminga a desesperada presidente do SindiPelego.
- Vamos fazer o que sempre fizemos companheira. Enrolar os otários. Eu, como magnânima e democrática rainha, receberei receptiva cada uma das tolas exigências dos serviçais. Ouvirei pacientemente suas mazelas. Enquanto isso, vocês farão o que sabem fazer melhor: semear discórdia e desconfiança. Jogar uns contra os outros. Desmobilizar e desarticular o grupo. Fazer com que eles se enredem de tal forma em intrigas que percam o rumo de seus sonhos e convicções. Esse é o nosso jogo! Aqui não há espaço para amadores. – sentencia Poliana, a articuladora.

Cegos por anos de alienação, não percebem os bobos reais, que a servidão covarde e desleal de sua corte de pelegos, despertou temerários espíritos de luta e indignação. Agora, a inquisição de Poliana precisará calar as inconvenientes vozes que se erguem em coro.

sábado, 22 de outubro de 2011

Atendendo a pedidos: As aventuras de Poliana no Motel


Poliana, ainda tímida, tentava conter todo seu arrebatamento e fulgor. Eram tantos os parceiros disponíveis que era difícil para a jovem e recatada rainha resistir as tentações. Em cada parceria havia uma promessa de paraíso terreno. Poliana procurava esquecer os valores morais e falsos pudores que por tanto tempo defendera ao longo da vida. Luxúria e libertinagem aqueciam sua alma de rainha. Depois de beber dessa fonte inesgotável de prazer era impossível reprimir a sede voraz que a consumia por dentro. A febre que lhe corroia as entranhas exigia plena satisfação. Não adiantava mais pensar na donzela cândida que um dia fora. Seu manto de integridade agora jazia na lama do poder e das propinas. Poliana há muito fora deflorada em seus ideais. O que dava ainda certo conforto a consciência angustiada de sua alteza, era ver ao seu lado nessa orgia seus primeiros parceiros da libertina alcova. Se seus companheiros, antes tão sérios e moralistas, demonstravam tal contentamento e deleite com a situação, não seria Poliana a padecer de crises existenciais.
- Acorda Poliana! Tá sonhando acordada? – questiona um de seus bobos representantes da Irmandade do Fogo.
- Estou exausta! Vocês exigiram muito de mim. Não sou habituada com tanto ímpeto. E também não estou acostumada com essa cadeira esquisita! Que coisa mais desconfortável. Prefiro mil vezes o meu adorado trono real.
- A idéia de fazer nossa reunião aqui foi sua rainha. Nós bem que estranhamos, mas sua vontade para nós é lei majestade. – responde Líquen, assessor para interlúdios reais e massagista de ego oficial da rainha.
- O castelo está um caos com todas aquelas reformas. Eu já estava intoxicada com toda tinta cor de rosa que vocês escolheram para pintar meu palácio. O barulho que estão fazendo para reforçar a blindagem da minha redoma de vidro fumê estava me deixando louca! E vocês não querem que eu tenha uma enxaqueca, não é? – murmura Poliana, maliciosa.
- Claro que não alteza! Nós adoramos vê-la tão disposta e disponível. – Acrescenta prontamente um de seus fieis companheiros, lembrando-se dos problemas causados pelos humores frágeis da rainha.
- Mas fazer uma reunião num motel! Eu acho isso um disparate! – contesta, ultrajada, uma velha matriarca do clã. – O que vai dizer Imprensa Livre se souber desse absurdo? Nunca, em todo esse tempo de militância cega, eu presenciei uma coisa assim. Eu tenho uma reputação a zelar! Alguém aqui precisa honrar essa estrela que carregamos no peito!
- Motel? Como assim? Não entendi. - uma Poliana apalermada questiona aos seus bobos.
- Ora Poliana, esse motel onde estamos, é claro! - responde Líquen controlando a impaciência. -Foi idéia sua fazer nossa reunião de articulação de alianças aqui. Tivemos um trabalhão para reservar a maior suíte para acomodar tanta gente. - continua Líquen já começando a duvidar da sanidade mental da rainha. - Você sabe que fazemos tudo para garantir seu conforto e satisfazer suas vontades.
- Isso aqui é um motel?! – grita Poliana, incrédula, examinando o ambiente com atenção – Motel?! - continua escandalizada – Essa cadeira não é um modelo executivo de design moderno?! – pergunta, erguendo-se rapidamente, cada vez mais alarmada. – E esse negócio que eu estou segurando há horas, não é um microfone?! – berra a rainha ruborizada, largando no chão o peculiar objeto. – Ai, meu pai! Onde é que vocês me meteram seus molóides!
Os estarrecidos companheiros acompanhavam a cena cada vez mais confusos. Dessa vez ela enlouqueceu de vez, pensavam todos em consonância.
Líquen, agora mais amorfo que vaselina, tenta retomar um pouco de nexo ao ambiente, sem provocar os sensíveis ânimos reais: - Alteza, você não está lembrada de ter escolhido esse lugar?
- Claro! Mas eu não sabia que era um motel, seus estúpidos! Eu vi todos aqueles outdoors e folders coloridos e bonitos espalhados pela avenida. Tudo tão arrumado e perfeitinho. Tanta propaganda enganosa, prometendo todo o tipo de prazer ilusório e fantasioso. Era tudo tão parecido com aqueles cartazzes ridículos que nós disseminamos pelo reino, que eu achei que era mais uma das nossas propagandas enganosas! Pensei que era obra da OP (Orquestra Partidária)! – desabafa a rainha a beira da histeria.
- Haahhh não! – resmunga a platéia nervosa, já pensando nas conseqüências do deslize real.
- Ora bolas! Tenha paciência Poliana! Você não desconfiou do erro logo que chegou aqui? É só olhar para essa estrutura toda. A maior e mais importante obra feita por nós até agora foi um mictório coletivo que é menor que uma dessas banheiras! É sabido que não temos capacidade para um feito desse tamanho. Só nos discursos, é lógico. – manifesta-se Santo Jorge, mestre sala dos espetáculos pirotécnicos da OP, perdendo momentaneamente o rebolado e a ginga que o tornaram um showman.
- E agora?! O que vamos fazer?! – pergunta um membro do MSTT (Movimento Só Tramóia e Trago) em angustiado alvoroço.
- Vamos sair correndo daqui seus inúteis! Rápido, antes que Oposição desperte com nossa suruba! – ordena Poliana quase histérica. – Eu devia saber que não podia confiar em vocês! Vistam-se seus incompetentes! Saiam já dessa banheira! E façam silêncio! Vamos sair na surdina para não chamar atenção! – ordena a soberana.
- Mas e a conta, Poliana? Quem vai pagar?
- Ora, ora, seu bobo! A conta por nossos deslizes, quem paga é o fiel contribuinte. Esse é sempre o último a saber de nossas traições e falsidades. Além do mais, no final das contas, todo lucro vai parar nos profundos bolsos reais. Pois saibam vocês, seus bobocas, que essa é uma grandiosa obra da minha OP: Organizações Poliana! É um dos inúmeros projetos da Laranja Empreendimentos, empresa da qual sou sócia anônima e majoritária. Dessa fruta saborosa eu como até o bagaço.– responde a sedutora e travessa rainha antes de fechar a porta e apagar as luzes.

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

A TPM da Rainha


No amplo salão do palácio a balburdia era total. Bobos e pajens reais corriam desatinados para todos os lados. O barulho de objetos colidindo com as paredes só era encoberto pelo som agudo, estridente e assustador dos berros escandalosos de sua alteza. Uma Poliana desfigurada encontrava-se no centro do tumulto. Ao seu redor alguns de seus fiéis companheiros tentavam acalmar a ensandecida rainha.
- Calma Poliana, respira fundo. Quem sabe um suquinho de maracujá?
- Eu não quero suco, eu quero sangue! – grita Poliana atirando o copo em seus bobos.
- Por favor alteza, tente não gritar tanto para não acordar Oposição. Nós já lhe preparamos um banhinho morno e relaxante, com os seus sais aromáticos preferidos. – acrescenta ansioso o atarracado membro do CUT (Companheiros Unidos no Trambique).
- Que se afoguem todos vocês, seus molóides, naquela banheira! Eu estou cheia de vocês! Cheia! - continua a irascível rainha quebrando mais um vaso do castelo. – A culpa é de vocês! Vocês me fizeram passar por todos aqueles exames e constrangimentos!
- Mas Poliana, fizemos isso pelo seu bem. Só pensamos em sua saúde, alteza. – com muito tato, o assessor para momentos de crise de destempero real, Líquen - o amorfo - aproxima-se da rainha. Que tal essa deliciosa caixa de bombons minha rainha?
De canto de olho Poliana fita a enfeitada caixa, enquanto todos no recinto suspendem a respiração esperando mais um ataque de histeria real.
- Bombons? São de amarula? – pergunta tentando se mostrar indiferente.
- Claro minha alteza. Os seus preferidos. – responde Líquen persuasivo.
- Então acho que vou aceitar. – diz a rainha gulosa, já arrancando a caixa das mãos de seu fiel assessor. Sentando-se em seu trono passa a devorar freneticamente as guloseimas.
Suspiros de alívio ressoam no salão. Por vários minutos ninguém ousava se mover. O único barulho ouvido era o som metálico do desembrulhar dos bombons. Quase uma hora depois, uma calma e satisfeita Poliana cochilava nas almofadas.
- O que foi que desencadeou mais essa crise? - pergunta um dos bobos
- Ela ficou estressada com a consulta ao ginecologista. – responde Líquen.
- Não devíamos ter insistido para que ela consultasse. – continua o ressabiado bobo.
- Era preciso. As coisas estão ficando insustentáveis. Os pitis dela agora já são de domínio público. Precisamos evitar que a rainha e nosso democrático reinado acabem virando chacota.
- O reinado todo é uma piada, só vocês que não enxergam. – rosna Basco, o raivoso, chamando a atenção para sua presença.
- O que você faz aqui, Basco? Você não faz mais parte de nossa corte!
- Eu ainda tinha o cartão estrelado que dá livre acesso a área restrita do castelo. Por isso, pude novamente presenciar mais um grandioso espetáculo de fricotes de sua alteza. – responde Basco com escárnio. – Mas agora que já me diverti, vou andando. Aconselho vocês a fazerem uma boa reserva de bombons para o próximo ano. Talvez devessem deixar um pouco de lado o ramo das gráficas e impressões e investir de vez no mercado dos chocolates. – tripudia uma última vez, antes de deixar o recinto.
- Sujeitinho insuportável! Não sei como pudemos tolerá-lo por tanto tempo em nosso clã. – irrita-se o representante do SindiPelego.
- Deixa o Basco pra lá. Ele, assim como nossos ideais, faz parte do passado. Precisamos discutir a saúde da rainha. - reflete Líquen.
- O caso dela é grave? O que disse o ginecologista?
- Ela tem uma doença rara, nunca antes vista pela medicina. – continua Líquen, preocupado.
- Ela vai morrer? – pergunta um companheiro já a beira das lágrimas. – O que vai ser de nós se ela se for? Vamos viver do que? Eu não sei fazer nada! Pelo amor de Che Guevara! Isso não pode acontecer!
- Era só o que faltava, depois de tudo que tivemos de suportar! – completa um dos bobos, representante da Irmandade do Fogo. – Investimos muito nessa relação. Fala logo Líquen, deixa a enrolação para as emendas parlamentares.
- Não, ela não vai morrer. Mas, se o diagnóstico se confirmar, ela vai é nos matar. Vai afundar de vez nossa imagem na lama. Vai acabar com a paciência de nossos aliados. Vai ser a fonte de piadas preferida da maquiavélica Imprensa Livre. Vai conseguir a façanha de manter acordada e alerta a sempre apalermada Oposição!
- Mas afinal o que ela tem de tão grave?
Com o semblante constrangido e apreensivo, Líquen responde à seleta platéia:
- Nossa rainha sofre de TPM. Transtorno Por Megalomania.
- E isso tem tratamento?
- Apenas medidas paliativas. Todos os seus desejos, por mais insignificantes, devem ser prontamente atendidos. Ela não tolera frustrações. Pelo que entendi é uma patologia que se origina do excesso de poder e da falta de limites. Alguma coisa a ver com muito ego e pouco cérebro, se consegui entender direito.
- A mim, parece ter sido falta de laço! Nada que umas chineladas, na época certa, não tivessem prevenido. Coisa de menina mimada! – Indigna-se o membro da Irmandade do Fogo.
- Se o tratamento é esse, não vejo qual o problema. Pois não é o que temos feito nesses anos? Bajular a rainha, massagear seu ego, satisfazer seus caprichos... Nenhuma novidade.
- Acontece que a doença é progressiva. Ela vai ficar cada vez pior.
- Mais histérica, arrogante e insuportável? Duvido! É humanamente impossível, até mesmo pra ela!
- Para evitar a piora teremos de nos organizar companheirada. Precisamos reforçar a blindagem da redoma de vidro fumê, não permitir o acesso da rainha aos meios de comunicação externa, pintar o castelo de cor de rosa e, seguindo o conselho de Basco, o raivoso, comprar muito, muito chocolate!
- Nossa, que mão de obra! Isso vai dar um trabalho danado, não sei se conseguiremos dar conta!
- Essa é a parte boa. Teremos de contratar mais dúzias de bobos e pajens para paparicar a rainha!
- Oba! Vamos poder distribuir mais carguinhos! Poliana vai adorar essa notícia!
Enquanto isso, uma Poliana entorpecida de amarula, dormia e sonhava com um reino encantado onde não havia Imprensa Livre e Oposição e onde todos os seus subordinados eram débeis mentais, sem opinião própria ou vergonha na cara. Onde todos só falavam o que Poliana queria ouvir, e ninguém questionava a saúde mental da rainha. Um reino perfeito e fantasioso, como em Horário Eleitoral, onde todos diziam SIM as futilidades de sua alteza.

sábado, 8 de outubro de 2011

Poliana e o Espelho Mágico


Poliana admirava-se satisfeita no espelho. Por vezes, até ela, sempre tão centrada e senhora de si, surpreendia-se com a própria astúcia e brilhantismo. Não era a toa que tinha hoje o mundo a seus pés. E como era saboroso o gosto do poder. Poder pisar em seus desafetos era como ópio, prazeroso e viciante. Com um sorriso, misto de escárnio e autocontemplação, mira-se no espelho e questiona:
- Espelho, espelho meu, existe no reino alguém mais poderosa que eu? – do espelho uma voz monótona prontamente responde: - Em todo castelo, és tu magnânima, a mais poderosa das criaturas.
- E não sou eu também a mais ardilosa das celebridades?
- Sua alteza, é sem dúvida, merecedora desse reconhecimento, ó divina e esplendorosa criatura!
- E não sou eu a mais invejada e idolatrada das rainhas?
- Vós sois digna de todas as reverências, ó jovem e destemida rainha!
- Chega desse palavrório ridículo espelho entojado! De puxa-sacos eu já estou superfaturada. Tenho até que dar um jeito de me livrar de 131 deles. Se tu continuar com esse excesso de reverências vou te descartar no lixo orgânico como fiz com o insuportável Chorume!
- Se esta é sua vontade alteza devo usar de certa franqueza. Acho que tu Poliana, deveria ter sido mais comedida na hora de descartar seu Bobo Chorume. Em se tratando de lixo, as coisas sempre podem feder.
- Chorume é um tolo que ousou desafiar a rainha! A pena para quem questionar minhas certezas e propinas é a decapitação. E com que prazer assisto essas cabeças asquerosas rolarem. – exulta Poliana, esfregando as mãos de contentamento.
- Mas Poliana, ainda não é hora de semear rancor e ódio. Chorume poderia lhe ser útil nas jogatinas do próximo ano.
- Chorume é descartável, assim como seu mestre, o velho Alquimista. Não preciso mais deles, já os usei a vontade. Agora não servem mais nem pra reciclagem! Sou hoje a mais poderosa das figuras. E como sou corajosa! Ninguém antes, na história desse reino, teve a coragem de colocar o todo poderoso Alquimista e seus discípulos em seu devido lugar: o lixo!
- Pense bem rainha. O Alquimista é uma força a ser respeitada nas jogatinas quadrienais e ...
- Eu não preciso de ninguém! Ninguém! Eu me basto e me garanto! Sou soberana absoluta desse reino! – interrompe Poliana já começando a esganiçar o tom de voz – Vou me livrar de todos os tolos descartáveis. O próximo passo é jogar na sarjeta toda a insuportável constelação de estrelas que por tanto tempo tive que engolir.
- Os seus companheiros de clã?! - alarma-se o espelho. – Mas, minha idolatrada rainha, eu acredito não ser ainda o momento de abandonar esse grupo, mesmo sabendo de sua bem camuflada antipatia pela maioria deles.
- Já agüentei demais dessa turminha. Eles me foram úteis durante um tempo, mas ninguém agüenta tantos anos daqueles discursinhos bolorentos e o eterno ar de donos da verdade. A verdade agora é que quem dá as regras sou eu!
O espelho, conhecedor das famosas crises de destempero da rainha, tenta ponderar em tom ameno para não desagradar aos sensíveis humores reais:
- Tu és Poliana, a dona da bola e do campo, mas precisará de um bom time para o campeonato. E os membros mais bitolados e alienados do seu clã são inigualáveis na arte de arrebanhar inocentes úteis para torcida. Isso faz diferença na hora da disputa. E mesmo aqueles que hoje lhe criticam ficam cegos com o brilho mítico da estrela.
- Isso é verdade. É só eu fazer um discursinho choroso e abanar na frente deles uma bandeirinha estrelada e os ingênuos se ajoelharão aos meus pés em reverência. – Profetiza a rainha sardônicamente. – Acho que nesse caso, você, seu espelho estúpido, pode ter razão. Vai ser divertido ver novamente aquela companheirada arrogante correndo atrás de mim como cachorrinhos adestrados. Principalmente aquela velharada ortodoxa que sempre criticou minha falta de traquejo nos movimentos sociais e minha pouca vontade em defender os cansativos ideais socialistas. Posso pisar a vontade em todas as crenças dos otários e no final eles me carregarão nos braços como a uma Deusa. – gargalha Poliana, cada vez mais egocêntrica.
- É isso mesmo majestade. Sua alteza, como sempre, consegue enxergar o futuro com a clareza dos visionários. – Adula o espelho, aliviado por conseguir contornar mais um ato insano da rainha.
- Eu, modestamente, sou mesmo espetaculosa! – vangloria-se a super inflada Poliana. – Agora falando de assuntos mais importantes: que tal a cor do meu esmalte, espelho mágico?
- É bonito Poliana, mas não combina com seu traje. Ficou um tanto pálido e ... – ao ver a ira começar a surgir no rosto da rainha, o espelho, tarde de mais, deu-se conta de que falara muito.
- Quem você pensa que é, seu enfeite sem serventia, para ousar criticar uma escolha da rainha! - grita Poliana, rubra de indignação. – Não foi a combinação de cores que não deu certo, é você eu não consegue enxergar direito seu espelho míope e sem noção! – Berra com seu corriqueiro tom amarrecado e estridente, enquanto atira objetos em direção ao ressabiado e constrangido espelho.
- Perdoe-me, ó bela e fashion rainha! És tu, com certeza, a mais reluzente e bem vestida das soberanas do universo!
- Não quero ouvir mais nada seu espelho ordinário! Vou colocá-lo no seu devido lugar!
- Por favor majestade, não me jogue no lixo como fez com Chorume. Eu imploro!
- Como sou piedosa, vou colocá-lo no meu baú de coisas inúteis, junto com as bandeirinhas do meu clã, a camiseta do Che e os discos do Chico e do Vandré, fazendo companhia as traças e baratas! – determina Poliana, a imperatriz da destemperança.

sábado, 1 de outubro de 2011

A Doce Vingança de Poliana




Quem observasse o rosto sereno e compenetrado da rainha, não imaginava o que lhe ia no íntimo. Poliana regozijava-se furtivamente com a situação. É claro que para o grande público exibia o discurso conciliador e parcimonioso que lhe fizera majestade. Para os membros de sua corte que saíram um tanto chamuscados da fogueira das vaidades, mostrava a placidez própria da realeza. Mas como era agradável assistir de camarote a tragicômica derrocada do todo poderoso Alquimista. Só Poliana sabia o esforço que precisava dispensar para conter as risadas que lhe faziam cócegas na garganta. Justo ele, que se achava acima de tudo e de todos, fora cair de forma tão constrangedora e hilariante,derrubado pelas próprias tentativas grosseiras de se manter em pé. Sua majestade recordava o sacrifício de ter de tolerar as infindáveis lições de articulação e oportunismo ofertadas por esse mestre da retórica. Pior ainda, era esta sombria e sorrateira figura perenemente a levitar sobre seu reinado. Apesar dos pesares, Poliana admirava a habilidade impressionante com que o Alquimista manobrava a tudo e a todos e a servidão com que seus pares atendiam ao menor estalar de dedos do ilustre mago. Deixando o divertimento de lado, Poliana não se iludia. Mesmo caído, e de imagem desarranjada, o Alquimista era ainda uma força a respeitar e admirar, pensa Poliana reflexiva.
Diz a lenda, que o sonho secreto de Poliana era pertencer ao seleto grupo de seguidores do Alquimista: a Irmandade do Fogo. Um grupo muito antigo e poderoso, anterior a quase tudo que se conhecia. Agraciados por Deus com o dom do poder eterno. Detentores de um diferenciado talismã, denominado Raízes Históricas. Esse estranho adorno dava a seus membros a capacidade de penetrar e se firmar em qualquer terreno, da aridez do solo agreste a frouxidão da lama e do lodo. No dia em que a primeira fagulha de poder surgiu na face da Terra, a Irmandade do Fogo já estava lá para se aquecer e se deleitar. Assim foi, e assim continuará sendo até o fim dos tempos, diz a profecia. E Poliana sempre almejara ser aceita nesse covil. Corre a boca pequena e maledicente, que a então plebéia Poliana, fora esnobada e desdenhada por esse grupo e teria jurado vingança. Rejeitada, se unira a um bando de plebeus barbudos e barulhentos que mais tarde formariam o inigualável e absoluto Grande Clã de Poliana. Mas a sofredora Poliana parecia fadada a rejeição e ao bullying. Mesmo com toda devoção ao clã, não era vista com bons olhos por muitos de seus companheiros. Revoltada com tantas humilhações, jurara novamente vingança. E, ao longo de todos esses anos, Poliana costurava lenta e pacientemente sua desforra. Hoje, a arrogante irmandade andava submissa e domesticada, sempre a sombra de Poliana. E quanto as super estrelas de seu clã? Para esses Poliana guardava a melhor parte. Trabalhava incansavelmente para tornar seu adorável clã cada dia mais parecido com a Irmandade do Fogo. Em muito pouco tempo, a hoje imponente rainha, conseguiria atingir seus objetivos. Tornaria os membros desses dois grupos tão semelhantes que seria impossível separá-los. Nesse dia, estará enfim realizando seu acalentado sonho de pertencer a Irmandade do Fogo e terá conseguido com um único golpe vingar-se de todos os que fizeram pouco caso da ardilosa e vingativa Poliana. Enquanto espera, aquece lentamente, seu merecido banquete na fogueira das vaidades.